No domingo, 17 de novembro, celebramos o Dia Mundial dos Pobres – comemoração anual instituída pelo Papa Francisco há oito anos para nos ajudar a ter sempre diante dos olhos a verdade de que nossa fé em Jesus Cristo e em seu amor para conosco precisa ter como consequência um amor para com nosso próximo que se traduza em atos, especialmente em relação aos mais desamparados.
A Igreja Católica, de fato, se importa muito com esta caridade operosa: ela é, de longe, a maior instituição humanitária do mundo. Poderíamos elaborar longamente sobre este ponto, mas, por brevidade, fiquemos com dados simbólicos: no âmbito da saúde, a Igreja não apenas criou o primeiro hospital brasileiro, com a Santa Casa da Misericórdia de Olinda, mas continua ainda hoje, por meio das Santas Casas espalhadas Brasil afora, responsável por mais de 50% dos atendimentos ambulatoriais e das internações hospitalares do sistema público de saúde. Na esfera da educação, foram os religiosos a fundar os primeiros institutos educacionais do País – como, por exemplo, o Pateo do Collegio, onde nasceu nossa São Paulo. Quando, por intrigas políticas, a Coroa portuguesa decidiu expulsar os jesuítas das colônias, em 1750, o Brasil perdeu, do dia para a noite, virtualmente todo o seu corpo de professores.
E esse impacto social-civilizacional do Cristianismo não é coisa nova, pois esteve presente desde suas origens. Ainda na época romana, o Imperador Juliano, o Apóstata (361-363), um verdadeiro inimigo da fé que queria repaganizar o império, escrevia ao sumo sacerdote pagão da Galácia que os cristãos cresciam por causa de seu “caráter moral” e sua “benevolência aos desconhecidos e cuidado pelas sepulturas dos falecidos”. Dizia ele: “Penso que quando os pobres eram negligenciados e desprezados pelos sacerdotes [pagãos], os ímpios galileus [os cristãos] perceberam isso e decidiram se dedicar à benevolência. (…) Esses ímpios galileus cuidam não apenas de seus próprios pobres, mas também dos nossos, e todos percebem que nosso povo carece da ajuda de nós” (cf. Rodney Stark, The Rise of Christianity, p. 83-84).
E, no entanto, apesar de ser responsável pela maior parte da ação humanitária do mundo, a Igreja não é meramente uma instituição filantrópica: não somos uma ONG! Se amamos o próximo, fazemos isso por motivos sobrenaturais. Como percebe o sociólogo Rodney Stark, “aqui é preciso abordar assuntos de doutrina. Pois algo de novo realmente veio ao mundo com o desenvolvimento do pensamento judaico-cristão: a conexão de um código ético altamente social com a religião. (…) Era estranha ao paganismo a noção de que, como Deus ama a humanidade, os cristãos não podem agradar a Deus se não se amarem uns aos outros. De fato, assim como Deus demonstra seu amor pelo sacrifício, os humanos precisam demonstrar seu amor pelo sacrifício em favor do próximo. (…) Essas eram ideias revolucionárias” (Idem, p. 86).
Por isso é que, para um verdadeiro seguidor de Jesus Cristo, as obras de caridade nunca são um fim em si mesmo, e se apoiam necessariamente em uma vida interior de amor a Deus, cultivado pela oração íntima. Quando um jovem padre encontrou-se com Santa Teresa de Calcutá e quis contar-lhe suas iniciativas de caridade, ela quis saber apenas como andava sua vida de oração, e explicou: “Sem Deus, somos pobres demais para ajudar os pobres”. Como ela mesma disse na Assembleia Geral da ONU de 1985: “Sou apenas uma pobre freira que reza. Ao rezar, Jesus põe o seu amor no meu coração e eu vou dá-lo a todos os pobres que encontro no meu caminho. Rezai vós também! Rezai, e sereis capazes de ver os pobres que tendes ao vosso lado. Talvez no mesmo andar da vossa casa. Talvez até nas vossas próprias casas há quem espera pelo vosso amor. Rezai, e abrir-se-ão os vossos olhos e encher-se-á de amor o vosso coração.”
Amemos, então, a Jesus Cristo, vivendo seus mandamentos (cf. Jo 14,15) e fazendo-se seus amigos por meio da oração (cf. Mc 3,14) – e assim poderemos verdadeiramente amar os pobres.