O patriotismo cristão

No ensejo das comemorações da Independência de nossa Terra de Vera Cruz, convém relembrar o ensinamento da Igreja acerca do verdadeiro e sadio patriotismo.

O Catecismo da Igreja Católica ensina, em primeiro lugar, que a unidade do gênero humano foi prejudicada pelo pecado, tendo Deus, então, agrupado os homens “segundo seus países, cada um segundo sua língua e segundo seus clãs” (cf. Gn 10,5). Esta “pluralidade de nações” foi ordenada para “limitar o orgulho de uma humanidade decaída”, sempre tentada a construir, numa nova Torre de Babel, um governo global divorciado do Criador. A organização em nações, no entanto, é transitória e não vigorará na eternidade – e, devido ao nosso pecado, cria o risco permanente de uma idolatria da pátria ou de um indevido relativismo religioso (cf. CIC, nos 56-57).

Para evitar tais perigos, a Igreja continua a ensinar mais detalhadamente os deveres que derivam do amor à pátria contidos no Quarto Mandamento (CIC, nos 2.238-2.240). Nós, cristãos, portanto, devemos ser cidadãos exemplares: respeitar e colaborar lealmente com a autoridade legitimamente constituída (cf. 1Pd 2,13.16); rezar pelos governantes (cf. 1Tm 2,2); estimar os concidadãos; contribuir com o pagamento de impostos, sempre que sejam justos e não abusivos; votar com consciência e responsabilidade, exercendo o direito ao voto; e defender o país, interessar-se e participar da vida pública, de modo a santificar a política.

Se acaso, porém, a autoridade pública se desviar de sua finalidade, pretendendo emitir preceitos e leis contrários à moral, aos direitos fundamentais ou ao Evangelho, o cristão tem não apenas o direito, mas também o dever, de recusar obediência por objeção de consciência (CIC, nº 2242). A qualquer lei, decreto ou ordem judicial que permita matar inocentes no ventre materno ou que restrinja os direitos divinos, por exemplo, o verdadeiro cristão responde, como São Pedro: “É preciso obedecer antes a Deus que aos homens” (At 5,29; cf. Mt 22,21).

Quanto ao acolhimento de imigrantes, trata-se de manifestação da virtude bem cristã da hospitalidade. A imigração deve ser admitida “na medida do possível” e “em vista do bem comum”. Ao imigrante acolhido, por sua vez, cabe respeitar com gratidão o patrimônio material e espiritual do país que o acolhe, obedecer às suas leis e dar sua contribuição financeira” (CIC, nº 2.241).

Enfim, ensina a Igreja que toda sociedade deve ser organizada conforme a visão de homem revelada por Deus, Criador e Redentor. E adverte que, historicamente falando, as sociedades que rejeitaram a Deus e buscaram seus referenciais em si mesmas ou em suas ideologias exerceram um poder totalitário e tirânico sobre o homem (CIC, nº 2.244).

Poderíamos concretizar essas lições sobre patriotismo com a vida de São Tomás More (1478-1535), retratada em “O homem que não vendeu sua alma”, vencedor de seis Óscares. Advogado e célebre humanista, após grandes sucessos diplomáticos em nome da Coroa, ele foi alçado ao cargo de chanceler da Inglaterra. A certo momento, no entanto, o Rei ordena- -lhe agir contra a lei de Deus, e diante da firme recusa, More, nosso exemplo de cidadão cristão, é condenado por lesa-pátria! Felizes de nós, no entanto, se pudermos morrer repetindo o que ele disse no cadafalso: “O Rei ordenou-me ser breve, e como sou o obediente servo do Rei, breve eu serei. Eu morro como bom servo de Sua Majestade – mas primeiro de Deus”.

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