A segunda sessão da assembleia sinodal arquidiocesana se propôs a olhar a realidade da cidade de São Paulo. A primeira coisa a perceber é a necessidade de dar graças a Deus por toda a beleza, toda a grandeza e o trabalho de homens e mulheres de boa vontade que constroem esta cidade em que Deus habita!
Também é preciso dar graças a Deus pela Igreja paulistana que aqui testemunha sua fé de tantas maneiras. Durante o tempo de isolamento provocado pela pandemia, por exemplo, vivenciamos muitos trabalhos e ações em nossas comunidades, como o serviço de caridade e partilha, lembrando da fome presente entre nós; o serviço de consolação no contato com familiares de falecidos vítimas da COVID-19; o serviço de acompanhamento de doentes, mesmo a distância; o serviço de comunicação para transmissão de celebrações, palestras, cultos e cursos; a criatividade em ações que uniram a comunidade (reuniões on-line, grupos de WhatsApp etc.), mostrando que a Igreja não são as pedras, são as pessoas. E, se os templos fecharam, a Igreja continuou viva em seu testemunho de solidariedade!
Como Igreja, agora nossa questão é pensar a ação pastoral, que é a concretização do cuidado do rebanho. Como ensina o Papa Francisco, “evangelizar é tornar o Reino de Deus presente no mundo” (Evangelii gaudium, 176). Por isso, nos perguntamos, como Igreja, sobre maneiras de ajudar a cidade em que Deus habita a ser mais humana.
A Doutrina Social da Igreja traz elementos que ajudam a perceber como a cidade pode ser espaço de respeito e vivência da dignidade humana. E, na fidelidade ao Evangelho do Senhor, reconhecemos que Deus habita esta cidade sobretudo em suas fraturas, pois é preciso ter consciência do lugar em que nos situamos para olhar para a cidade. Não falamos simplesmente de problemas, mas de realidades em que Deus habita, nossos presépios contemporâneos!
A realidade da falta de moradia, com pessoas e famílias vivendo em habitações subumanas na rua, em favelas, em ocupações, em áreas de risco! A pandemia mostrou, de maneira clara, a desigualdade no trato da saúde, com filas para atendimento nos postos de saúde na cidade que tem medicina de ponta; algumas escolas com toda a estrutura de comunicação enquanto na periferia as crianças não têm nem internet. O transporte público maltratado porque não se privilegia o bem comum. A periferia abandonada, tanto as geográficas quanto as existenciais. Quase não há verde na cidade cinza, com rios apodrecidos e descaso com o meio ambiente. Existe violência nas ruas, a população carcerária é esquecida, há violência na internet e nas famílias, uma cultura de violência e ódio que se espalha rapidamente e contamina todo o tecido social.
A realidade sofrida da cidade nos interroga: Por que na terra da fartura há tantos necessitados? Por que interesses particulares ainda se sobrepõem ao bem comum? Onde estão os espaços democráticos de participação?
Uma Igreja sinodal precisa ouvir os clamores que brotam das fraturas desta cidade, porque são clamores dos filhos de Deus que sofrem! Misericórdia é o que eu quero, e não o sacrifício (cf. Mt 12,7).
Como ser Igreja em saída e ajudar São Paulo a ser mais humana? Há que se reconhecer que Deus habita as fraturas desta cidade!
“Juntos podemos e devemos estabelecer gestos de cuidado pela vida humana, pela proteção da criação, pela dignidade do trabalho, pelos problemas das famílias, pela situação dos idosos e dos abandonados, rejeitados e desprezados. Ser uma Igreja que promova uma cultura de cuidado, compaixão pelos fracos e luta contra todas as formas de degradação, inclusive a de nossas cidades e dos lugares que frequentamos” (Papa Francisco, em 29/06/22).