Até alguns anos atrás, nós brasileiros costumávamos dizer que “futebol, política e religião não se discute” – e o tema da vida pública do País era mais ou menos deixado de fora das rodas de amigos e festas de família. Desde as eleições de 2018, no entanto, tem acontecido um movimento oposto: discutimos cada vez mais os assuntos políticos, mas discutimos mal – criamos rixas e inimizades, rompemos antigas relações e até mesmo vínculos familiares.
No fundo, essas são duas posições extremas e equivocadas: por um lado, porque a política (e, também, a religião) não são assuntos puramente subjetivos e independentes de uma realidade que sirva de critério de verdade. Pode até ser que um dado time de futebol esteja passando por uma fase melhor do que o outro, mas não faz sentido dizer que ele é “essencialmente melhor” ou “intrinsecamente mais verdadeiro” – e, no entanto, o fato objetivo é que nem todas as posições políticas promovem na mesma medida o bem comum. Invocar a analogia dos times de futebol (ou do tipo de comida preferido, para citar outro exemplo) é, portanto, tomar como infra-racional uma questão que é racional.
Por outro lado, também é equivocado transformar as discussões políticas em motivo de brigas, em que todos gritam bordões raivosos, mas ninguém escuta e busca entender com benevolência a opinião do outro. Nos assuntos opináveis (como o são a maior parte das questões políticas), é perfeitamente possível que duas pessoas honestas e bem-informadas tenham visões opostas sobre uma dada questão, e, se trata de um ponto que diz respeito ao bem comum, é bom que elas busquem convencer-se reciprocamente por meio da argumentação racional – sabendo-se, no entanto, que é sempre possível que a divergência persista, mesmo entre pessoas honestas e de mente aberta.
“Mas a Igreja não deve se envolver com política!”: eis aí mais um dos chavões que sempre se ouve em época de eleições. Como todo clichê, ele até expressa uma parcela de verdade – no caso, o fato de que não cabe à Igreja fazer política partidária, usando sua autoridade religiosa para avalizar um determinado partido político ou candidato oficial.
No entanto, seria errado pretender calar a voz da Igreja sobre todo e qualquer assunto da vida pública – pois a doutrina de Jesus Cristo possui também uma série de verdades sobre o correto agir do homem, tanto como indíviduo quanto como membro de uma coletividade, e essas verdades implicam certos princípios básicos para a vida pública. É o que chamamos de “Doutrina Social da Igreja” – o conjunto de ensinamentos do Evangelho, aplicados à realidade social, versando por exemplo sobre a inadmissibilidade do aborto e da eutanásia, a instituição divina da família com pai, mãe e filhos, a necessidade de proteção aos mais vulneráveis, a honestidade e lisura dos agentes públicos etc. Nos dizeres do Catecismo: “Faz parte da missão da Igreja proferir um juízo moral, mesmo acerca das realidades que dizem respeito à ordem política, sempre que os direitos fundamentais da pessoa ou a salvação das almas o exigirem” (CIC 2246).
Hoje, por exemplo, existe toda uma agenda organizada no mundo inteiro para o avanço do aborto – e quando a Igreja adverte seus fiéis a cobrarem de seus candidatos uma firme postura pró-vida –, ela está simplesmente pedindo-lhes a coerência com a doutrina de Cristo.
Nas eleições que se aproximam, busquemos candidatos que promovam o verdadeiro bem comum da sociedade, de acordo com os direitos fundamentais do ser humano e os valores do Evangelho!