Durante este tempo de pandemia, muitas restrições aos encontros e aglomerações de pessoas se tornaram necessárias para evitar o contágio do novo coronavírus e a difusão da doença dele resultante. Também na Igreja, aderimos aos apelos das autoridades sanitárias e governamentais para evitar aquilo que pudesse favorecer o contágio e colocar em risco a saúde e a vida do povo.
Dessa forma, restringimos a participação física nas celebrações e eventos pastorais a umas poucas pessoas, apenas àquelas estritamente necessárias para ajudar nas celebrações e em suas transmissões pelos meios de comunicação e mídias sociais. Embora haja uma adesão bastante satisfatória do povo às celebrações transmitidas e à participação virtual nelas, tínhamos a consciência, desde o início, de que a restrição à participação presencial era excepcional e não deveria se tornar permanente nem definitiva. A participação na vida da Igreja nunca poderá ser apenas midiática e virtual.
Muitas pessoas estão ansiosas por voltar às igrejas para fazer suas orações e participar das celebrações comunitárias da liturgia, e isso é bem compreensível. Uma senhora me escreveu, dizendo que a igreja lhe faz falta, como lhe faria falta o ambiente da própria casa, porque o templo lhe oferece um clima familiar de encontro com Deus. Um padre me relatou que, ao abrir as portas da igreja para que algumas pessoas pudessem entrar e fazer suas orações pessoais, elas adentravam o templo aos prantos, de alegria por poderem rezar novamente na casa de Deus.
É a mesma emoção expressa na oração do salmista: “Alegrei-me, quando me disseram: ‘Vamos à casa do Senhor!’” (Sl 122,1).
A participação comunitária na vida da Igreja e a frequentação da “casa de Deus” nos fazem falta. Por isso, rezamos para que passe o quanto antes essa pandemia e as pessoas possam voltar a expressar a sua fé publicamente, mediante a participação presencial da santa missa e dos outros momentos comunitários da celebração da fé. Neste tempo de pandemia, no entanto, muitas pessoas e famílias estão redescobrindo que suas casas também são “casa de Deus”, conforme a promessa de Jesus: “Onde dois ou mais se reunirem para pedir alguma coisa ao Pai, eu estarei lá, no meio deles” (Mt 18,20). A família e outros grupos, reunidos pelo vínculo da fé cristã, são uma manifestação da Igreja, que é comunidade reunida em nome de Jesus e em torno Dele. São células vitais do grande corpo eclesial.
Se as portas das igrejas precisaram ficar fechadas durante este período de exceção, as portas de muitas casas se abriram para que Deus entrasse e tivesse um lugar no convívio familiar. Durante a quarentena, por causa da pandemia de COVID-19, muitas famílias e grupos estão tomando consciência de que são verdadeiras “Igrejas domésticas”. Voltaram a rezar juntos, a acompanhar as celebrações da Igreja em casa, a ouvir a Palavra de Deus e a fazer grupos de leitura orante da Sagrada Escritura. Muitas mães e avós estão falando das coisas de Deus e da Igreja a seus filhos e netos, realizando, assim, um trabalho precioso de evangelização e transmissão da fé.
As atuais Diretrizes Gerais para a Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil (2019-2023) trazem como proposta principal, justamente, a “Igreja nas casas”, a evangelização e a vivência cristã nessa base importantíssima da vida da Igreja. Antes de ser a grande comunidade, reunida nos templos, a Igreja está viva e presente nas casas, nos ambientes mais elementares da vida humana. E ali a fé precisa ser cultivada, testemunhada e transmitida, pois, do contrário, a grande comunidade se esvazia e perde a vitalidade. Na Igreja doméstica reside um potencial importantíssimo de fé e missão. E, quando a vida cristã é forte nessa base doméstica e familiar, a vida da grande comunidade eclesial possui base sólida. A crise sanitária provocada pelo coronavírus, cedo ou tarde, vai passar. E, queira Deus, isso não demore, para não serem demasiadas as vítimas. A experiência da Igreja doméstica, porém, não deveria ser deixada de lado, assim que a crise sanitária passar. Pelo contrário: essa experiência de vida eclesial “na base”, nas células vitais da Igreja, precisa ser fortalecida e cultivada, pois ela promete ser rica de frutos. Que o Espírito Santo conduza e dinamize a Igreja nas casas, em conformidade com a tradição milenar, que vem dos tempos apostólicos.