O mês de agosto, aqui no Brasil, é dedicado às diversas vocações na Igreja, e nos deveria ajudar na tomada de consciência de que a Igreja é um povo de vocacionados. Chamados à fé pela palavra de Deus, recebemos o Batismo, grande dom mediante o qual somos filhos e filhas de Deus, discípulos e missionários de Jesus Cristo e membros da sua Igreja. E não somos apenas agraciados com os dons da vida sobrenatural, que provêm do Espírito Santo, mas também somos chamados a participar da vida e missão da Igreja.
Como os membros e órgãos de um corpo contribuem, cada um com a capacidade que lhe é própria, para a vitalidade e o bem do corpo inteiro, ao mesmo tempo que se beneficiam dele, assim acontece na Igreja. São Paulo já usava a analogia do corpo humano para explicar como, na Igreja, cada membro é chamado a desempenhar bem a sua parte. Para isso, o Espírito Santo concede dons e carismas diferentes a cada um. Não fazem todos a mesma coisa, mas cada um colabora com seu dom para o bem de toda a Igreja.
O Papa Francisco refere-se com frequência ao clericalismo, como grande problema a ser superado na Igreja. O clericalismo é uma compreensão errada da Igreja, como se ela fosse formada apenas pelo clero e dependesse unicamente dele. Nessa maneira de pensar, a Igreja seria “coisa dos clérigos” (bispos, padres e diáconos), e o povo seria formado por meros assistidos e beneficiados por eles. Essa ideia distorcida foi entrando por diversos motivos: talvez porque os clérigos a foram imprimindo na cultura eclesial e comum, deixando os demais membros da Igreja na passividade e apenas na condição de assistidos e beneficiados. Talvez porque se aplicam à Igreja, mesmo a partir de fora dela, modelos de outras instituições e organizações sociais, não adequadas à realidade da Igreja. Talvez porque a mentalidade empresarial, mercadológica e consumista foi sendo aplicada à Igreja e até mesmo assimilada dentro dela.
O clericalismo é uma tentação que os clérigos e todo o povo de Deus precisam evitar e superar. Por aí podem ser interpretadas as diversas iniciativas do Papa Francisco em relação à reforma da Igreja e de suas instituições. Isso requer a tomada de consciência de todos sobre a situação em que a Igreja vive e um atento processo de “conversão”. Toda a Igreja precisa se converter mais ao Evangelho e àquilo que ela é chamada a ser. Contrariamente, ela perde vitalidade e deixa de cumprir sua missão.
O Concílio Vaticano II, no belo e importante documento sobre a Igreja (constituição dogmática Lumen gentium), apresenta a Igreja, antes de tudo, como uma realidade querida e amada por Deus Trindade. Ela é obra do Pai, do Filho e do Espírito Santo e não mero projeto humano, por mais que ela também seja humana. Ela é um povo de discípulos missionários de Jesus Cristo e de seu Evangelho; povo de testemunhas atraídas por Cristo, cheias de ardor e alegria, que anunciam o Evangelho e, com a ajuda do Espírito Santo, tentam transformar a vida pessoal e comunitária a partir do que aprenderam do Evangelho. Por aí, vemos que a primeira vocação de todos os batizados e membros da Igreja é esta: ser testemunhas de Cristo e do seu Evangelho, vivendo a fé, a esperança e a caridade. Essa é a vocação e missão de todos os membros da Igreja. E os leigos são essas testemunhas de Cristo, missionários do Evangelho nas estruturas da cultura e da vida social.
Para animar e conduzir o povo de Deus nos caminhos do Evangelho, Deus concede à sua Igreja as vocações específicas. Os sacerdotes são chamados a servir os irmãos com a autoridade de Jesus Cristo, sacerdote, pastor e palavra de Deus para a vida do mundo. Eles também são membros do povo de Deus e não estão acima dos demais irmãos batizados, mas a serviço deles “nas coisas de Deus”. Os diáconos são os “ministros da caridade” e animadores da comunidade no serviço aos irmãos mais necessitados. Os consagrados nos diversos carismas da vida religiosa são chamados a serem páginas vivas do Evangelho no mundo e no meio dos irmãos, ajudando todos a reconhecerem o Cristo Salvador em suas pessoas e na sua maneira de viver. Cada vocação é importante na Igreja e cada um contribui com seu dom para a vida e a missão da Igreja.