Recordando a Conferência de Aparecida

Iniciamos a preparação da Conferência Eclesial da Igreja na América Latina e no Caribe, a ser realizada de 21 a 28 de novembro deste ano na Cidade do México. Em vez de convocar uma nova Conferência Geral, só de bispos, representando a Igreja em nosso continente, o Papa Francisco decidiu convocar uma Conferência Eclesial, com representantes de todas as categorias do povo de Deus: bispos, sacerdotes e diáconos, consagrados e leigos.

A preparação da Conferência Eclesial deverá ser um exercício de sinodalidade, mediante a escuta e uma ampla participação dos membros das comunidades eclesiais. Todos poderão propor as suas reflexões e oferecer as suas contribuições, para desenvolver e aprofundar o tema da Assembleia: “Somos todos discípulos missionários em saída”. Deseja o Papa que o processo de preparação e realização da Conferência Eclesial retome as propostas e orientações do Documento de Aparecida, resultante da 5ª Conferência Geral do Episcopado de nosso continente, em 2007, para ver que passos foram dados depois da Conferência de Aparecida e quais são as questões que não foram ainda bastante trabalhadas. Esta é também uma boa ocasião para nos darmos conta dos novos desafios postos à vida e à missão da Igreja, depois de 2007.

Vale a pena revisitar o Documento de Aparecida, que ofereceu diretrizes muito ricas para a vida eclesial. O tema daquela Conferência foi: “Discípulos e missionários de Jesus Cristo, para que, nele, nossos povos tenham vida”. Os cristãos são discípulos de Jesus Cristo e isso significa que a sua pessoa, com todo o seu significado para nós, deve estar sempre no centro da vida da Igreja e dos cristãos. Isso torna indispensável aprofundar constantemente a relação pessoal de cada cristão com Cristo, mediante uma genuína experiência de fé e de pertença a Ele e à comunidade da Igreja. O Cristianismo não é uma ideologia, mas o fruto de um chamado e de um encontro pessoal com Jesus Cristo, que chama ao seu seguimento e a viver uma relação pessoal com Ele e, através Dele, com Deus.

Cada discípulo é também um missionário de Jesus Cristo. A dimensão missionária é essencial para a Igreja e para cada cristão. Cada um, conforme o dom recebido, é testemunha de Jesus Cristo e do seu Evangelho. E a missão não é apenas de alguns membros da comunidade eclesial, mas de todos. A Igreja ne cessita muito da ação missionária de todos. Mas, é preciso lembrar: só será missionário quem for verdadeiro discípulo, atraído e apaixonado pelo Mestre, alegre e feliz por ser cristão e crer no Evangelho. A preparação da Conferência Eclesial deste ano pode levar a refletir: até que ponto os católicos e as comunidades católicas conseguiram aprofundar o discipulado missionário durante esse tempo posterior a Aparecida? A formação cristã foi uma das grandes preocupações levantadas em Aparecida. É impensável que os cristãos sejam testemunhas e missionários de Jesus Cristo, sem um verdadeiro aprofundamento da fé e da vida cristã. Até que ponto a formação cristã e a consciência missionária avançaram durante esse período?

Outra preocupação importante da Conferência de Aparecida foi a vida das pessoas e dos povos do continente. A presença dos cristãos no meio desses povos deveria contribuir para superar velhas situações de injustiça social, corrupção e agressões à dignidade humana. A fé em Cristo e no Evangelho não pode estar desvinculada da promoção humana integral, em todos os sentidos. Faz pensar o fato de que o nosso continente é o mais cristão e católico de todos, mas é também o que apresenta as maiores desigualdades sociais, os mais altos índices de violência e desrespeito à dignidade humana. Como explicar que, apesar de a maioria dos políticos e lideranças sociais também serem cristãos e católicos, não se consiga reunir esforços para superar as chagas que ainda marcam a vida dos povos latino-americanos e caribenhos. É preciso avaliar isso na preparação da Conferência Eclesial.

A Conferência de Aparecida consagrou os conceitos de “conversão pastoral” e “conversão missionária”, que se referem à necessária mudança da cultura pastoral na nossa Igreja. Não devemos estar preocupados apenas em fazer uma “pastoral de conservação”, mas passar a uma nova atitude, que integre a cultura missionária. Essa mudança é necessária e consequente com a constatação das grandes mudanças sociais, culturais e religiosas em meio aos nossos povos. A fé já não se transmite, simplesmente, pelo ambiente, que deixou de ser católico e cristão em grande parte. Por isso, é preciso passar de uma pastoral de conservação para uma pastoral genuinamente missionária, como pede também a própria identidade da Igreja: ela é missionária por sua essência, e sua missão nunca está terminada.

Temos, pois, muito a fazer para avaliar o caminho feito depois da Conferência de Aparecida e para tratar das questões novas que a Igreja enfrenta em nossos dias.

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