Aniquilar-se em favor do Reino

A liturgia do 30º Domingo do Tempo Comum está centrada no tema da humildade. Deus é Pai e ama igualmente a todos os filhos. No entanto, se alguma vez manifestou preferência, foi pelos desprotegidos: as viúvas, os órfãos, os pobres, os que se dirigem a Ele com espírito contrito e humilde. Jesus opõe dois extremos: o fariseu, expressão excelsa da piedade e da moralidade; e o publicano que, por sua profissão, é a suprema expressão do pecador, apartado dos ideais religiosos. Os dois rezam: por meio da oração, o ser humano demonstra como se relaciona com os outros e com Deus. 

O fariseu é apresentado qual modelo de pessoa que se sente segura de si mesma, pois cumpre metodicamente a observância religiosa. Ele apenas informa a Deus o quanto é bom e dá graças por sua conduta exemplar. Estabelece um confronto de igual para igual: nada suplica a Deus. Se ilude em ter linha direta com o Criador, eliminando as distâncias com um palavreado enganador, que acaba por engambelar a si mesmo. 

No publicano, Deus salva quem julga nada ter a apresentar, quem sente necessidade de se converter. Conhecedor da própria fragilidade, o publicano entrega-se a Deus sem reservas e espera em Sua misericórdia: nossa fragilidade põe em movimento a força de Deus. 

O publicano sabe que é pecador e não se arvora merecedor da misericórdia de Deus. Essa postura nos recorda do Salmo 50: aguardar que Deus acolha um coração contrito; obter a salvação, uma vez que é um dom de Deus. O fariseu não a conquista, pois se julga merecedor dela. Nas estradas da vida, encontramos pessoas que se julgam merecedoras das graças de Deus, mas, se puxarmos “a capivara”,… sai de baixo! Eu sei que seria mais elegante dizer: “se olharmos o curriculum vitae mais a fundo”, mas eu quis mesmo acenar com a possibilidade do riso. 

Quero dizer uma palavra sobre o Dia Mundial das Missões e da Obra Pontifícia da Infância Missionária, celebrados no domingo, 23. Na Carta a Timóteo, São Paulo mostra o cerne do espírito missionário: em suas tribulações, aprendeu a se gloriar em Jesus – que lhe deu forças e, então, espera confiante que o Justo Juiz lhe conceda a coroa da justiça. Longe de se gloriar pelo bem que fez, afirma ter sido sustentado por Deus. E decidiu doar a vida! Certo cantor, desafiando nosso bom senso, berrou: “Meus heróis morreram de overdose”. Que ninguém tenha tal pessoa como modelo. Nossos heróis morreram de tanto doar a vida, de muito se ofertar a uma causa/ missão. Meu Herói deu a vida por mim, por nós! 

A verdadeira humildade reconhece e glorifica a Deus por todos os bens recebidos. Se a empáfia é a mãe de todo pecado, a humildade é a mãe de toda virtude. Dom Hélder Câmara escreveu: “Sejamos como as canas: mesmo colocadas na moenda, esmagadas, reduzidas a bagaço, só sabem dar doçura”. A exemplo de Nossa Senhora! A exemplo de um incontável número de missionários e missionárias! Doemos orações e recursos aos que doam a vida. 

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