Estamos no aquário, mas não somos do aquário

A oração sacramental de Jesus é uma das passagens mais lindas do Novo Testamento. Quando Jesus nos lembra que “estamos no mundo, mas não somos do mundo”, nos dá também a melhor pista de como o cristão deve viver neste mundo. 

Afinal, não foi dada a nenhum de nós a opção de sair do mundo ou, dentro do mundo, não viver nele. Parece óbvio, mas há entre nós muitos que parecem não ter entendido isso ainda, de que estamos no mundo para mudar o mundo. 

Podemos começar com o exemplo de nossos filhos. É possível mantê-los fora do mundo, em uma bolha protegida dentro de nossas casas e ambientes selecionados, evitando o contato com o mundo corroído pelo pecado. E isso deve ser feito, mas é importante ter claro que é impossível manter tal condição para sempre. 

Em algum momento, já teremos construído dentro deles uma base minimamente sólida do que é a fé e o plano de Deus. Seu entendimento será, então, capaz de pequenas ponderações, com alguma ajuda, é verdade, por meio da comparação entre o certo e o errado. 

E se queremos que eles saibam comparar o que é bom e belo, contra o que é mal e corrompido, em algum momento haverá de ocorrer o contato com esse mundo decaído para possibilitar uma comparação. E é importante que isso aconteça durante o tempo da nossa tutela, e não depois. 

Isso permitirá que logo entendam de “qual matéria são feitos”. Mesmo sem se lembrar das palavras de Jesus, sentirão em seus corações que estão aqui, mas que não são daqui. 

Mas e nós, sabemos do que somos feitos e onde estamos? 

É muito perigoso achar que estamos prontos, e que já sabemos separar bem o que é do mundo e o que não é, pois não o sabemos. 

Para explicar melhor, apelo para a antiga analogia do aquário. Os peixes que vivem no aquário estão ali, imersos dentro de uma realidade que os envolve, a água, mas que eles próprios não conseguem perceber. Estão cercados por todos os lados, envolvidos por completo e não é possível evitar. A qualidade da água influencia as suas vidas: se a água não estiver pura o suficiente, morrem. 

O mesmo acontece conosco. Estamos no mundo, imersos dentro das realidades do mundo e não há como evitar. Muitas dessas realidades, mal conseguimos perceber, mas cujos impactos são diretos e profundos em nossas vidas. 

Não importa se estivemos dentro de uma bolha como os nossos filhos ou quando saímos dela. Desde pequenos, fomos bombardeados com mensagens seculares, ideológicas e políticas. 

Muitos dos valores e ideias hoje considerados como “verdades absolutas” ou mesmo como uma “evolução orgânica da mentalidade da sociedade” foram cuidadosamente inseridos, nos fazendo pensar que são naturais, mas não o são. 

O conjunto dessa “visão de mundo” é, em sua maioria, anticristão, contra a família e os valores judaico-cristãos. E não é surpresa. Independentemente da idade, todos nós nascemos em um mundo já muito distante de Cristo. 

Como quem está imerso na água, não é possível para nós já não ter sido tocado, movido ou influenciado pelas correntezas desses valores, que constantemente nos empurram dali para cá. 

A TV, os filmes, a grande mídia, a educação, tudo está, de certa forma, contaminado, muito ou pouco, por estas visões de mundo. E em nossa jornada, foi com essa influência que moldamos nossa forma de pensar. 

Apenas como ressalva, usei a palavra “influência” intencionalmente, pois a nossa formação fundamental recebemos de nossas famílias, mas invariavelmente fomos influenciados por estas águas que nos cercam. 

Então, a pergunta fundamental a ser feita por nós e em nome de nossos filhos é: onde está a verdade pura e descontaminada dos valores deste mundo? A resposta é óbvia, mas não simples. 

A Verdade Absoluta é uma só, Cristo. Contudo, ao tocarmos essa verdade apenas pelos nossos esforços e capacidades, carregaremos em nossas mãos a umidade das águas do mundo, contaminada de suas impurezas. 

Assim, a nossa percepção da verdade e nossa interpretação da catequese, muitas vezes, acabam deturpadas e decaídas, se a influência do mundo ainda estiver patente dentro de nós. 

Tenho comigo que, em nossa era, a salvação se tornou não apenas um processo de conversão, mas também de desintoxicação. 

Então, não bastará apenas o nosso entendimento, precisaremos de ajuda para drenar de nós a água do mundo que nos invadiu, e nos permitir uma maior pureza na busca da verdade. E não há nada melhor para secar o que está molhado do que o sol do Espírito Santo. Sem Ele, não seremos capazes de viver dentro deste mundo, sem beber os venenos das águas turvas deste aquário, pois ainda que vivamos aqui, não queremos ser daqui. 

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