A celebração do Ano Jubilar é um daqueles ritos de nossa Igreja nos quais não pensamos muito; afinal, acontece algumas poucas vezes no decorrer de nossas vidas.
Ela carrega em si uma lembrança do tempo de Levítico. O “ano da graça” era celebrado no ano seguinte depois de passados 49 (7×7) anos. Nesse ano especial, escravos eram libertos, dívidas perdoadas e terras devolvidas.
“Santificareis o quinquagésimo ano e publicareis a liberdade na terra para todos os seus habitantes. Será o vosso jubileu. Voltareis cada um para as suas terras e para a sua família.” (Levítico 25,10).
Com este ano de 2025, completo meu quinto Ano Jubilar. Claro que não tenho mais de 100 anos, mas tive a felicidade de presenciar dois anos jubilares extraordinários, aqueles que são acrescentados além do calendário ordinário.
Foram os de 1983, proclamado por São João Paulo II pelos 1950 anos da redenção de Cristo, e o ano especial de 2015 proclamado pelo Papa Francisco.
De todos, este foi o que me chamou particular atenção. Talvez porque, desta vez, acompanhei a passagem pela “Porta Jubilar” em conjunto com as pessoas da minha paróquia, o que é bem diferente do que fazer o ato solitário.
A cena é muito particular. O padre à frente entoando uma canção, enquanto o povo o segue cantando. Nessa longa fila, vinda da rua, todos passavam pela “porta jubilar”. Ao passar por ela, muitos faziam o sinal da cruz. O espírito era de contrição e de esperança.
Ao ver aquilo, meu coração viajou no tempo e me lembrei do povo de Deus no deserto. Ano após ano, seguindo em frente na esperança da terra prometida, guiados por Deus.
Pensei na história da Igreja que caminha pelo mundo como os antigos judeus, andando vagarosamente em grupo; unidos pela fé, mas também usando dessa união para se protegerem dos maus do caminho.
Em seguida, pensei na Igreja dos nossos tempos, que também vagarosamente vai caminhando na história do mundo, ano após ano nesse deserto. Nesse vale de lágrimas, como em uma procissão sem fim, o povo de Deus vai seguindo aquele que carrega o cajado da cruz, o Santo Padre, o Papa.
No Ano Santo, se a promessa para nós é de renovação de nossa fé, perdão de nossas dívidas, também o é para a nossa Igreja. Então, imaginei a Igreja como aquela fila de fiéis diante dos meus olhos, que pareciam mais felizes depois da travessia. Além da porta, pareciam fortalecidos, mais eretos, com suas esperanças renovadas. E rezei pela Igreja: pela Santa e Pecadora, esse barco místico de Cristo agitado como nunca nos mares deste mundo modernista e intoxicada pela fumaça de Satanás que entrou por suas frestas e que tanto enturvecem nossa visão.
E, então, notei um fato peculiar, que não havia percebido antes, e me emocionei, algo que não havia acontecido em nenhuma das outras vezes em que vivenciei o “Ano Jubilar”. Essa Igreja que, cansada e aflita, como cada um de nós, também necessitava de renovação e esperança; conosco ela também passou pela porta jubilar.
E sua renovação não poderia estar mais clara. A Igreja entrou em procissão pela Porta Santa e à sua frente estava Pedro. Ao sair do outro lado, vemos um Pedro fortalecido e renovado. Entramos com um Papa e saímos com outro.
Se, para nós, não há dúvidas de que entramos um e saímos outro, para a Santa Igreja Deus nos fez notar uma renovação extraordinária. O cansaço e apreensão foram trocados por um frescor e uma nova esperança.
A mim, pareceu ser um grande sinal, não apenas pela renovação da esperança, mas da atuação direta das mãos de Deus. Ele age no mundo, por meio da sua Igreja, e esperou o momento do Levítico para novamente nos libertar, perdoar nossas dívidas e restituir os terrenos férteis de sua Igreja, fortalecida para mais uma jornada jubilar.