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O laicato e sua missão na Igreja e no mundo 

Continuando nossa sequência de meditações sobre as várias vocações existentes no seio da Igreja, queremos hoje refletir sobre o papel dos leigos na vida da Igreja – tema cuja importância toda especial nas “circunstâncias especiais do nosso tempo” foi reconhecida pelo Concílio Vaticano II (cf. Lumen gentium LG, n.30). Em uma época em que muitos questionam a presença da fé na vida pública, a Igreja recorda que os fiéis leigos não são cristãos de “segunda categoria”, mas membros vivos do povo de Deus, chamados a santificar o mundo a partir de dentro. 

Antes de tudo, é preciso desfazer um mal-entendido: leigo, no contexto da Igreja Católica, não significa “ignorante” ou “sem preparo especial”, como quem diz “sou leigo em medicina”. Leigo vem do grego láos, “povo”: o leigo é, portanto, membro do povo de Deus

O traço próprio dos leigos é o caráter secular: vivem no mundo (latim saeculum) e são chamados a buscar a Deus nas realidades comuns da vida, ordenando-as segundo os critérios do Evangelho. Mais do que pelos sermões, manifestam Cristo pelo testemunho de uma vida impregnada de fé, esperança e caridade (cf. LG 31). 

Esta missão não diminui a dignidade do leigo em relação ao clero. Pelo contrário, todos somos irmãos no mesmo Corpo de Cristo. O grande Santo Agostinho, ao recordar sua ordenação episcopal, dizia ao povo (em palavras citadas pelo Papa Leão XIV quando subiu pela primeira vez na sacada de São Pedro): “Aterra-me o ser para vós, mas consola-me o estar convosco. Sou para vós, como Bispo; estou convosco, como cristão. Nome de ofício, o primeiro; de graça, o segundo; aquele, de risco; este, de salvação” (LG 32). Na comunhão da Igreja, há diversidade de funções, mas igualdade de dignidade. 

Mais que isso: há ambientes nos quais só o leigo pode ser a presença viva do Evangelho: um escritório, uma indústria, uma universidade, um lar. Ali, aonde o sacerdote não chega, a voz cristã deve ressoar pela vida dos fiéis leigos (cf. LG 33). 

Mas como, concretamente, pode um leigo amar intensamente a Deus, em meio a seus afazeres cotidianos? Na verdade, todos os trabalhos, a vida conjugal e familiar, o labor profissional cotidiano e até as provações suportadas com paciência podem tornar-se “sacrifícios espirituais, agradáveis a Deus por Jesus Cristo” (LG 34). Essa verdade, tão bela, ajuda-nos a compreender o sentido do ofertório da missa: tudo o que somos e fazemos é oferecido junto com o sacrifício de Cristo. 

É nos sacramentos, sobretudo na Eucaristia, que o leigo encontra a força para sua missão: “Os sacramentos (…) alimentam a vida e o apostolado dos fiéis” (LG 35). De modo particular, a vida matrimonial e familiar constitui uma admirável escola de apostolado, quando é transformada pela fé. A família cristã, pela sua própria existência, proclama a beleza do Reino de Deus e testemunha a esperança na vida eterna. 

Ao mesmo tempo, os leigos são chamados a purificar as estruturas humanas, iluminando a cultura, a política, a economia e as artes com os valores evangélicos. É parte de sua missão rejeitar tudo o que obscurece a dignidade da pessoa e afirmar, com obras e palavras, que “nenhuma atividade humana, nem mesmo em assuntos temporais, se pode subtrair ao domínio de Deus” (LG 36). 

O laicato não é um “apêndice” da vida da Igreja, mas sua presença indispensável no coração do mundo. Sejamos, pois, conscientes da missão que nos cabe: testemunhar Cristo em todas as dimensões da vida humana e recordar, com esperança, que este mundo tem um Senhor! 

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