A dinâmica ‘Cheio – Vazio’ e a Ressurreição de Cristo

Sergio Ricciuto Conte

A liturgia da chamada Oitava de Páscoa, que comemoramos há pouco, é excepcional! Quando nos dizem ser ajuda para adentrar no Mistério Pascal, tendemos a hesitar, adestrados que estamos à temporalidade moderna – Páscoa é apenas um dia, e um dia só tem 24 horas! Quando se trata de Cristo, porém, essa semana estendida condensa e maximiza a história da Salvação.

Duas passagens me marcam sobremaneira esse percurso da Oitava: a primeira delas é a corrida de João (o discípulo que Ele mais amava) e Pedro ao sepulcro. Haviam sido avisados “pelas mulheres”, a quem Cristo tinha se mostrado antecipadamente. Creram naquele testemunho – o que já nos deveria fazer pensar, mas isso deixo para outro momento – e correram. João, mais jovem, chega antes ao local “mas não entra”. Pedro, podemos imaginar, demora alguns minutos. Aqui temos a dinâmica do “Vazio”. Já vou explicar. Antes, porém, segue a segunda das passagens: havia passado alguns dias após a Paixão e Morte de Jesus. Corria a notícia de um ou dois encontros excepcionais com seu corpo ressuscitado – Emaús, Maria Madalena. Pedro, acostumado a pescar, quer retomar a rotina. É sua expertise, além de ser dono de um pequeno barco, um líder seguido por aqueles que sabem do seu conhecimento e habilidades. Estão de volta ao mar da Galileia, onde tudo começara três anos antes. Novamente não pescam nada durante toda a noite. Ao amanhecer, um “estranho” lhes pede de comer. “Não pescamos nada!”, devem ter respondido. Joguem então as redes à direita do barco! Surpresa… As redes enchem a ponto de quase não suportarem. “É o Senhor!” E aqui podemos ver a dinâmica do “Cheio”, da abundância.

“Vazio e Cheio”, ainda que opostos, podem significar uma mesma coisa: Cristo ressuscitou verdadeiramente! A dinâmica dos sinais que, para serem adequadamente interpretados, precisam de homens e mulheres inteligentes, com a razão aberta. Uma abertura que é compreendida melhor como tensão, quer dizer, como estado de alerta próprio de quem tem olhos vivos e deseja ser surpreendido pela realidade. A virtude teologal que melhor define tal abertura é a pobreza! A mesma pobreza de espírito que Cristo exaltou no sermão do Monte, fazendo confundir aos que só interpretam ao pé da letra.

O sepulcro vazio faz-nos pensar em ausência. Para os olhos do discípulo “muito amado”, porém, o vazio, a presença dos panos dobrados, não passou despercebido e, vendo com os olhos do coração, acreditou. A rede repleta de peixes, algo corriqueiro para o exímio pescador, é sinal de completitude, perfeição; e quem pode ofertar tais dons senão o próprio Deus? Então, Pedro creu. E como correspondência adequada, sem máscaras, jogou-se nas águas para chegar rápido Àquele que tem palavras “de vida eterna”.

“Vazio e Cheio”: o mundo está repleto deles, são sinais que Cristo oferta, ainda hoje, de sua presença. Já parou para acolhê-los com a simplicidade dos pequenos?

Dener Luiz da Silva é professor de História do Departamento de Psicologia da Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ)

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