A Última Geração

Sergio Ricciuto Conte

Há pouco tempo, foi publicada em um jornal de grande circulação uma tirinha com dois quadros. No primeiro, pergunta-se a uma jovem: “Por que você não quer ter filhos?” Com aspecto assertivo, a jovem expõe com facilidade razões positivas e negativas: “Liberdade de ir e vir; vaginoplastia; falta de paciência e estrutura emocional; dinheiro”. Em seguida, pergunta-se a outra jovem: “Por que você quer ter filhos?” Ela mostra um pouco de insegurança na resposta: “Ora, porque sim; hummm, na verdade, não sei!”

Esse contraste entre as duas posturas revela um paradoxo de nossa época: nunca tivemos tanto conhecimento e informação; no entanto, desaprendemos as razões pelas quais temos filhos, e os acabamos tendo por causa de um vago “ora, porque sim”. Criamos uma geração narcisista, que olha para a própria carreira e afirmação e se passa a considerar o pináculo do processo geracional, não restando mais nada a ser passado adiante. Há até filósofos (como David Benatar) e psicanalistas prontos a oferecer razões para não se ter filhos!

É evidente que há hoje razões objetivas que conspiram contra o ter filhos, a começar por aquelas de ordem financeira: o mercado de trabalho é refratário a filhos; estes atrapalham a carreira; custam muito, tanto em termos de saúde quanto de educação. E, por fim, os lançamentos mais acessíveis no mercado imobiliário são pensados para pessoas sem filhos. Há também razões de ordem subjetiva, como a instabilidade dos casais, seja por arranjos familiares alternativos, seja pelo número cada vez maior de divórcios. Por sua vez, o discurso abortista pró-escolha, na prática, coloca muitos obstáculos para os casais decidirem ter filhos. Só sob condições muito favoráveis as pessoas terminam por aceitar ter filhos.

Não se trata aqui de julgar moralmente as pessoas que assumem tal mentalidade “progressista”, e sim notar o que está envolvido no fato de sermos a única geração na história que não sabe por que deve preparar a próxima geração, que deixa a tarefa ao simples arbítrio e capricho dos casais. Primeiro temos, é claro, o problema demográfico, o fato de não estarmos atingindo a taxa de reposição social. Podemos também lembrar uma razão algo interesseira: o fato de nossos filhos poderem cuidar de nós quando já não tivermos condições para tanto. No entanto, pode-se criar nesse contexto uma relação de amor abnegado que tem um valor em si próprio. Não havendo filhos, quem prestará o cuidado?

O mais importante, todavia, não é quantificável: a própria gratuidade da vida. Aquilo que recebemos de nossos pais e de outros é para ser transmitido, acrescido de nossa experiência. Esse é o sentido da vida: dar mais vida. Isso não quer dizer que as pessoas são obrigadas a ter filhos – elas podem transmitir vida de modo alternativo, como no caso das pessoas consagradas –, mas apenas que a transmissão biológica é a mais básica e democrática. Estamos tão próximos dos ritmos da natureza que até a resposta “porque sim” é válida… contanto que entendamos a vida como dom e não como merecimento.

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