Como devemos viver?

Esta pergunta, que intitula o artigo do teólogo anglicano Ian Packer, de 2010, nunca desaparece. A questão permanece em nossas mentes a despeito dos avanços da nossa sociedade, da Medicina, da Engenharia, das transformações econômicas, do conhecimento científico. Não importa quão complexa tenha se tornado a nossa sociedade, quanto avançamos em todos os campos: acabamos nos voltando para questões básicas de nossas vidas e que permeiam o pensamento humano ao longo de toda a sua história. Ganha cores variadas dependendo da cultura local, dos progressos da ciência e da tecnologia, da velocidade da informação, das transformações climáticas e ecológicas e de outros avanços da sociedade. Neste momento de nossas vidas, o que está acontecendo fere firmemente a soberba humana: um vírus infinitamente pequeno desafia o nosso conhecimento científico, altera a nossa vida, provocando mudanças enormes até no nosso direito de ir e vir. Como devemos viver? Pergunta que nos provoca, quando assistimos a tantos exemplos positivos de solidariedade, mas também tantas posturas e modos de agir negativos. Vemos pessoas negando a ciência, expondo os outros ao vírus, comportando-se de forma egoísta, sem a preocupação com o outro, levando à tragédia que vivemos, com um número inusitado de vidas perdidas em nossa história. Por mais argumentos e fatos objetivos, há uma parcela de nossa sociedade que se nega a ver o que está à vista de todos. Vemos, porém, a preocupação com o outro, a solidariedade se manifestando com força em grande parte de nossa sociedade, com bilhões de reais doados por pessoas físicas e jurídicas, criando uma rede de assistência social que muitas vezes a estrutura pública do País não consegue atender. O isolamento social mostrou como estamos longe dos nossos parentes mais próximos e como isso nos faz muito mal. Essa distância provoca um vazio, sentimos falta de coesão. Essa deve ser a marca mais forte que ficará deste período: a importância da família. No entanto, ao mesmo tempo, isso nos coloca frente ao mistério central e mais bonito de nossa fé: a Santíssima Trindade. A nossa crença em um Deus uno que é trino: Pai, Filho e Espírito Santo, “uma única essência das três Pessoas e três pessoas de uma única essência” (São Tomás de Aquino, Suma Teológica, questão 39). Como mistério divino, é difícil o seu entendimento pleno, mas nos permite uma compreensão maravilhosa da essência do Amor. “Deus é amor” (1Jo 4,8): novamente São Tomás diz que “o amor se chama força de coesão: porque aquele que ama integra o outro por si próprio, comportando-se com ele como consigo mesmo” (Suma Teológica, questão 20). Da mesma forma o amor se manifesta na família, permitindo a sua coesão, como manifestado na encíclica Amoris laetitia, do Papa Francisco: “Com efeito, o próprio mistério da família cristã só se pode compreender plenamente à luz do amor infinito do Pai, que se manifestou em Cristo entregue até o fim e vivo entre nós. Por isso, quero contemplar Cristo vivo que está presente em tantas histórias de amor e invocar o fogo do Espírito sobre todas as famílias do mundo” (AL, 59). Podemos encontrar, no mesmo texto: “Com efeito, ‘o amor entre o homem e a mulher no Matrimônio e, de forma derivada e ampla, o amor entre os membros da mesma família – entre pais e filhos, entre irmãos e irmãs, entre parentes e familiares – é animado e impelido por um dinamismo interior e incessante, que leva a família a uma comunhão sempre mais profunda e intensa, fundamento e alma da comunidade conjugal e familiar’ [João Paulo II]. Aí se integram também os amigos e as famílias amigas, e mesmo as comunidades de famílias que se apoiam mutuamente nas suas dificuldades, no seu compromisso social e na fé” (AL, 196).

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