Alguns poucos mantêm uma disputa acirrada para constar da lista das pessoas mais ricas do mundo. Nessa corrida, os dois primeiros lugares são de Jeff Bezos, da Amazon, e Elon Musk, da Tesla. A revista Forbes traz que atualmente Musk está liderando com um total de 200,8 bilhões de dólares, enquanto Bezos vem atrás com 189,9 bilhões de dólares.
No lado oposto estão 9,2% da população global que vive em extrema pobreza, contando com menos do que 1,90 dólares por dia para sobreviver, segundo dados do Banco Mundial. Fazendo uma conta simples, para alimentar essa população de 689 milhões de pessoas, seria necessário algo como 1,3 bilhão de dólares por dia. Assim, somente a fortuna dos dois daria para alimentar todas os famintos do mundo por quase um ano. É uma constatação vergonhosa.
Isso nos faz pensar por que alguns buscam tanta riqueza, num mundo de tanta pobreza. Obviamente, a resposta é mais complexa. Embora não seja intenção fazer aqui uma tese completa sobre o tema, vale refletirmos sobre algumas motivações dessas pessoas. Logicamente, ter toda essa riqueza só para viver bem não é resposta. Obviamente, para viver bem, com alto grau de bem-estar, não é necessário tanto dinheiro como os mais ricos acumulam. Estudos recentes trazem que o salário médio anual necessário para viver bem nos Estados Unidos é de 67.690 dólares. Algo muito acima do que seria necessário para viver com alto grau de bem-estar aqui no Brasil.
Entre as várias causas que motivam as pessoas a buscarem tanta riqueza, uma pode ser reconhecida facilmente: a busca por status. Termo que vem do latim, statum, conceito que diz sobre a posição social do indivíduo na sociedade. Recorrendo a Alain de Botton, em sentido estrito se refere ao estado civil ou à situação profissional de uma pessoa. Mas, em sentido mais amplo, refere-se ao valor e à importância de uma pessoa aos olhos do mundo. Nesse sentido, quanto maior a ascensão social da pessoa, maior é seu “status social”; assim, mais poder, posição e prestígio possui.
Botton traça uma tese interessante. Diz que “o desejo de status tem uma capacidade excepcional de inspirar sofrimento”. Para ele, a fome de status, como todos os apetites, tem utilidades, como incentivar a excelência. Mas, como todos os apetites, em excesso pode matar. Cita, entre as suposições sobre os motivos que levam a procurar status elevado, a ânsia por dinheiro, fama e influência. Mas, como alternativa e como resumo das motivações está algo raramente utilizado em teoria política: o amor. Ser objeto de amor é sentir-se objeto de preocupação. Assim, ser notado, ter o nome registrado, nossas opiniões serem ouvidas, fracassos serem tratados com indulgência e as nossas necessidades serem atendidas.
Admitindo-se essa tese de que a motivação por busca de status é o amor, devemos recorrer a Agostinho, que nos diz que existem dois e apenas dois tipos de pessoas no mundo: aqueles que pertencem à “Cidade de Deus” e os que pertencem à “Cidade dos Homens”. Esses dois tipos se distinguem por seus amores. Os cidadãos da Cidade de Deus amam a Deus acima de todas as coisas. Os cidadãos da Cidade dos Homens se amam acima de tudo. Ele diferencia os dois amores: “o primeiro é sagrado, o segundo é imundo; o primeiro é social, o segundo, egoísta; o primeiro consulta o bem comum para o bem de uma sociedade celestial; o segundo se agarra a um controle egoísta dos assuntos para o bem da dominação arrogante. O fracasso em se orientar para Deus resulta em um senso inflado de autoimportância e autossuficiência que, no fim, nega a realidade de nossa existência dependente”.
Fabio Gallo é professor da Fundação Getulio Vargas (FGV-SP); foi professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).