Pertença e participação

“Vós sois de Cristo e Cristo é de Deus” (1Cor 3,23). Com essas palavras, o Apóstolo Paulo exorta os cristãos da comunidade de Corinto a tomarem consciência da sua condição de membros da Igreja. Havia entre eles grupos concorrentes, que diziam pertencerem a um ou outro pregador. Eram os “followers” (seguidores) daquele tempo, quando os blogueiros midiáticos dos nossos dias ainda estavam longe de aparecer… Um dizia: “Eu sou de Paulo; outro dizia: eu sou de Apolo”. E assim havia divisões entre os fiéis por causa dos pregadores.

Paulo pergunta: “Quem é Paulo? Quem é Apolo? Não passam de servos, por meio dos quais recebestes a fé” (1Cor 3,1-5). E conclui: “Que ninguém se glorie em homens, pois tudo é vosso: Paulo, Apolo, Cefas, o mundo, a vida, a morte, o presente, o futuro; tudo é vosso! Mas vós sois de Cristo e Cristo é de Deus” (1Cor 3,21-23). O Apóstolo indica uma das questões importantes para a compreensão da Igreja: ela é o povo que Cristo reuniu para a glória do Pai (cf. 1Pd 2,9). Não é formada por fã-clubes de algum pregador, mas pertence a Cristo e cada um, ungido na fronte mediante o “selo do Espírito Santo”, também pertence a Cristo.

A pesquisa do sínodo arquidiocesano mostrou que o senso do pertencimento à Igreja, geralmente, é bem fraco entre os católicos, que se sentem pouco ligados e identificados com ela. Isso aparece na baixa frequência e participação na vida da Igreja e na celebração da Eucaristia, nos momentos de anúncio e escuta da palavra de Deus. Cerca de 6% dos católicos são participantes assíduos das iniciativas da Igreja. Outros 24% participam esporadicamente. Cerca de 70% não frequentam a Igreja e não participam de suas iniciativas, identificando-se pouco ou nada com ela. Isso faz pensar seriamente nas consequências para o futuro da fé e da vida da Igreja.

O que pode ser feito para que esses irmãos, que deixam de participar da comunidade de fé e caminham sozinhos, ou se afastaram do convívio da comunidade de fé? É frequentando a Igreja que se recebe o alimento da fé, o estímulo para o amadurecimento e a perseverança e o discernimento comunitário sobre os desafios diários da vida. Na comunidade de fé, caminha-se com segurança, partilham-se “as alegrias e tristezas, angústias e sofrimentos” e se recebe o bálsamo da consolação e da esperança cristã. Quem se afasta do convívio da comunidade e se isola, fica fragilizado e exposto a numerosos perigos.

Não é sem razão que o Papa Francisco convocou um sínodo sobre a “Igreja sinodal”, para uma nova tomada de consciência sobre a dimensão comunitária e solidária da Igreja. Ela é um povo que caminha, todos juntos, no seguimento de Jesus, na mesma fé, uns ajudando aos outros, fraternalmente, na mesma esperança. Há um grande distanciamento de muitos católicos em relação à Igreja. Como amar o que não se conhece? Muitas vezes, o conhecimento da Igreja é apenas exterior e distante, mais dos defeitos humanos das pessoas da Igreja do que das maravilhas que a graça de Deus opera nos Santos e em tantas pessoas sinceras e dedicadas ao serviço de Deus e do próximo.

A participação da Igreja proporciona um conhecimento próximo e experiencial. A Igreja, como um todo e em cada uma de suas comunidades e expressões, é mais que uma simples organização humana; ela é mais que uma “ONG do bem”: é “casa de Deus” e “habitação do Espírito Santo” (cf. Ef 2,22). Somos membros do corpo de Cristo e pedras vivas do templo espiritual, que é a Igreja do Deus vivo (cf. 1Pd 2,5). Sem fixar nossa atenção apenas nos defeitos das pessoas eclesiásticas que conhecemos, precisamos conhecer mais e melhor a vida dos Mártires e dos Santos, que são os grandes cristãos e os membros mais qualificados da Igreja. Ela é o “povo santo de Deus”, ao qual pertencemos e nele estamos unidos por laços sobrenaturais; ela é nossa família espiritual, nossa mãe. Como precisamos crescer na fé e no amor à Igreja!

Somos também, infelizmente, uma comunidade de pecadores, que muitas vezes dão o mau exemplo e escandalizam. Na Igreja, todos estão a caminho e somos todos chamados à conversão pessoal e comunitária ao Evangelho e aos caminhos de Deus, todos os dias, durante a vida inteira. Confiamos naquele que é o Santo e que nos chamou a sermos santos (cf. 1Pd 1,15). Ele nos concede sua graça cada dia. Fiel ao Evangelho, a Igreja nos ensina a sermos sinceros, honestos, justos e misericordiosos para com todos, atentos e prontos para socorrer o próximo que sofre, sem discriminação de ninguém.

O chamado à santidade é a vocação de todos os cristãos e faz parte da identidade da Igreja. Quem deseja ver Deus precisa caminhar na santidade, vivendo a comunhão com Deus e o amor para com todos. São João Paulo II, no início do novo milênio, ensinou que a busca da santidade deveria ser o grande programa pastoral do 3º milênio cristão. Isso requer o crescimento na fé e na fidelidade a Deus, a superação da surdez e indiferença em relação a Deus. Requer a vivência das virtudes humanas e cristãs, sobretudo o amor ao próximo e o cumprimento dos nossos deveres sociais e religiosos.

Que iniciativas podem ser desenvolvidas nas comunidades e organizações da Igreja para que os católicos amem sua Igreja, malgrado suas limitações e falhas humanas? Que consequências práticas deve ter para cada fiel este artigo do nosso Credo: “Creio na Igreja una, santa, católica e apostólica”? Temos um grande desafio pela frente: que o povo católico conheça mais a própria Igreja e participe com alegria da sua comunidade de fé.

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