Para celebração em 5 de outubro, foi inscrita no Calendário Romano Geral a memória facultativa de Santa Faustina Kowalska, virgem, pois, o que ela descreveu no Diário da sua alma, ouvindo o Senhor Jesus Misericordioso, tornou-se a inspiração para um movimento destinado a proclamar e implorar a misericórdia divina para todo o mundo, promovendo em todos os membros do povo de Deus a invocação da misericórdia divina e o seu testemunho credível na vida dos crentes (cf. decreto do Dicastério para o Culto Divino, 18/05/2020). Deste modo, ela pertence à linhagem profética cuja profetisa, por antonomásia, é Maria, Mãe de Misericórdia: “Maria torna-se profetisa da misericórdia do Pai e também seu ícone: ela conhece como ninguém o mistério da misericórdia que atinge o seu cume no calvário” (Comissão Teológico-Histórica do Grande Jubileu, “Deus, Pai de Misericórdia”, cap. VII).
Há nisso uma doutrina implícita já desenvolvida por Joseph Ratzinger, segundo a qual, no tempo da Igreja, não pode faltar a profecia como elemento de esperança e de apelo à Revelação bíblica. À esperança se liga a escatologia, como marcas da espiritualidade profética: “Eu veria o núcleo ou a raiz do elemento profético […] no ‘conversar com Ele como com um amigo’. Somente em virtude deste encontro direto com Deus, o profeta pode falar no tempo […] Os profetas são aqueles que colocam à luz a dimensão de esperança do Cristianismo. Eles são os instrumentos para chegar ao que deve ainda acontecer e, portanto, para ultrapassar o tempo com o objetivo de alcançar aquilo que é essencial e definitivo”.
Nesse sentido, Santa Faustina é profetisa da misericórdia: “Há uma antiga tradição patrística que chama Maria não de sacerdotisa, mas de profetisa. O título de profetisa na tradição patrística é o título de Maria por excelência. É em Maria que se define precisamente o que seja profecia, isto é, a capacidade íntima de ouvir, de perceber e de sentir, que consente na consolação do Espírito Santo, acolhendo-o em si, fecundando-o e tornando-o fértil ao mundo. Poder-se-ia dizer, num certo sentido […] que a linha mariana representa a dimensão profética da Igreja. Maria sempre foi vista pelos Padres da Igreja como o arquétipo do profeta cristão e dela parte a linha profética, que depois entra na história da Igreja […] A linha profética feminina teve uma grande importância na história da Igreja” (entrevista do Cardeal Ratzinger publicada originariamente em 30Giorni, no 1, 1999).
A perspectiva escatológica da Esperança e da Misericórdia torna Santa Faustina um exemplo eminente desta doutrina. Como escreveu Bento XVI, os cristãos devem responder a propósito do logos – o sentido e a razão – da sua esperança (Spe salvi, 2; 1Pd 3,15), e o anúncio do “Logos da Esperança” é o anúncio de que tem necessidade cada pessoa do nosso tempo, pois nisso consiste a essência missionária da Igreja (cf. Verbum Domini, 91). A unidade do pensamento de Ratzinger se revela numa entrevista como Papa emérito, na qual trata da centralidade da misericórdia na fé cristã a partir da Irmã Faustina, enfatizando que o homem de hoje está à espera do anúncio e do testemunho da misericórdia (cf. L’Osservatore Romano, 16/04/2016).
Assim, anunciar o Logos da Esperança, como anúncio profético da misericórdia, significa que a misericórdia é, ao mesmo tempo, um princípio de intelegibilidade (logos) e de esperança para o mundo atual, o verdadeiro “sentido” evangélico que o moverá em direção a Deus, na medida em que a profecia movimenta a História.
Muito bom este artigo sobre santa Faustina. Realmente a Misericórdia deve ser a centralidade da Igreja Católica, num mundo tão cruel. Não deixar que o ritualismo, as normas e outros “itens do cardápio religioso” supere a Misericórdia.