Da aparição às margens do Rio Paraíba até a consagração como padroeira do Brasil, a devoção a Nossa Senhora Aparecida percorreu um longo caminho histórico. Nessa grande caminhada de consolidação de devoção à Virgem de cor morena, a Igreja particular de São Paulo também auferiu sua própria contribuição. Ela consagrou todos os seus habitantes à Senhora de Aparecida.
No ano de 1945, o Cardeal Carlos Carmelo de Vasconcelos Motta, à época Arcebispo de São Paulo, que mais tarde se tornaria o primeiro Arcebispo da Arquidiocese de Aparecida, quis consagrar a cidade de São Paulo e localidades circunvizinhas à Virgem que apareceu no Rio Paraíba. Decidiu, por isso, fazer com que a imagem de Nossa Senhora Aparecida peregrinasse, desde o atual Santuário Nacional até a capital paulista. Tratava-se da segunda vez que a imagem original saía do Santuário – a primeira foi à capital federal de então, Rio de Janeiro.
O evento foi previamente preparado em todas as paróquias da Arquidiocese. Paradas e cantatas marianas foram promovidas. Bispos de diocese sufragâneas tomaram parte de tão insigne momento. Na noite do dia 14 de julho, uma verdadeira onda de fiéis peregrinando de diversos pontos da cidade marchou em direção à Catedral da Sé, que ficou aberta a noite inteira para vigília e visitação da imagem. Esse ato adentrou a história com o título de “A noite de Nossa Senhora”.
No dia seguinte, domingo, foram realizadas missas. O Cardeal, logo nas primeiras horas do dia, pontificou solene liturgia eucarística para os fiéis, grande parte membros de organizações de operários, como Marcha Operária do Belém, Federação dos Círculos Operários e Federação das Ligas Católicas. Ao final, fez uma solene consagração de todos os habitantes da capital paulista e redondezas a Nossa Senhora Aparecida, bem como fez com que todos fizessem um juramento de fidelidade à Virgem Maria, no qual prometiam constância à Igreja e oposição aos inimigos da fé, aos males do mundo.
Passados mais de 75 anos dessa consagração, ela ainda é emblemática. Esse fato porque, se naquele contexto o ideal da consagração era se opor aos males que afligiam o povo, hoje numa sociedade ainda marcada por grandes tragédias convém pedir à Virgem Maria, fiel discípula de Jesus, que interceda pela humanidade para que se empenhe num legítimo combate às misérias que saltam aos nossos olhos.
Uma metrópole como São Paulo, atendendo ao seu chamado de consagrada à Virgem Maria, aquela mesma que surgiu em tons negros nas águas do Paraíba, não pode compactuar, desse modo, com uma cidade frígida, indiferente e racista. Igualmente, uma capital em que a população foi confiada à intercessão da Virgem Maria, que abençoou a população com fartura de alimentos naquela pesca milagrosa em Aparecida, não pode dormir tranquilamente sabendo que muitos dos seus ainda passam fome e frio. Enfim, consagrados à Virgem Maria, empenhemo-nos lealmente na construção de um mundo novo, uma São Paulo nova.
Padre Reuberson Ferreira, MSC, é Pároco da Paróquia Nossa Senhora do Sagrado Coração e mestre e doutorando em Teologia pela PUC-SP.