Senhor, que venha a paz ao vosso povo!

O mundo acompanha com angústia a situação da Terra Santa, que entrou na terceira semana de um conflito que já deixou mais de 6 mil mortos entre palestinos e israelenses.

Embora as tensões nessa região sejam conhecidas, o que é visto nos últimos dias é algo sem precedentes, como relatou o Patriarca Latino de Jerusalém, Cardeal Pierbattista Pizzaballa, na entrevista exclusiva concedida ao jornal O SÃO PAULO, publicada nesta edição.

Responsável pelo pastoreio dos fiéis católicos do território que abrange a Palestina, Israel, Jordânia e Chipre, o Purpurado franciscano contou que o ataque do grupo extremista islâmico Hamas no sul de Israel, no dia 7, pegou a todos de surpresa, rompendo o caminho de diálogo que, na sua avaliação, será muito difícil reconstruir, sobretudo após a contraofensiva israelense.

O Patriarca esclareceu que os que sofrem as consequências desta guerra não são apenas judeus e muçulmanos. No território de Israel, existem 7,5 milhões de judeus, 1,5 milhão de árabes muçulmanos e 130 mil árabes cristãos, além de 100 mil trabalhadores estrangeiros, a maioria católicos. Já na Palestina, entre a Cisjordânia e a Faixa de Gaza, há 5 milhões de palestinos muçulmanos e 50 mil cristãos de diversas denominações, sendo as duas maiores, a Igreja Ortodoxa Grega e a Igreja Católica.

O Cardeal Pizzaballa externou sua preocupação com os cerca de mil cristãos que vivem em Gaza, cuja maioria se abrigava na paróquia católica (cerca de 500) e na paróquia ortodoxa (400). Essa segunda igreja, contudo, foi danificada por um ataque israelense que vitimou 18 cristãos ortodoxos, na sexta-feira, 20.

Em meio à comunidade católica, há, por exemplo, um grupo das Missionárias da Caridade que não tem para onde levar as 60 pessoas com deficiência grave acolhidas em sua casa.

Esses fiéis fazem parte dos cerca de 2,4 milhões de habitantes da Faixa de Gaza que vivem em condições precárias, sem energia elétrica, gás, alimentos e medicamentos. Somente no domingo, 22, foi autorizada a entrada de ajuda humanitária pela fronteira com o Egito.

Do outro lado da fronteira, famílias sofrem sem notícias dos cerca de 200 reféns israelenses, incluindo idosos e crianças, em poder do Hamas.

O Patriarca, que chegou a se oferecer em troca das crianças reféns, fez questão de ressaltar que esta não é uma guerra entre israelenses e palestinos, mas contra um grupo ideológico que não representa o povo palestino.

Sem deixar de reconhecer a histórica tensão na Terra Santa, o Cardeal Pizzaballa acredita que a paz é possível, porém essa exige a coragem e a disposição de israelenses e palestinos reconhecerem os erros passados e aceitarem que ambos terão de renunciar a algo. Isso significa que as fronteiras precisam ser definidas e que se reconheça a plena autonomia do estado Palestino, os refugiados sejam repatriados o quanto possível e que em Jerusalém haja, de fato, a coexistência pacífica desses diferentes povos.

E nós, cristãos, que também veneramos essa região como sagrada, somos chamados, ao contrário de qualquer narrativa que sustente a polarização de “uns contra os outros”, a ser um sinal de diálogo e de reconciliação na terra onde foi fincado o madeiro da cruz da qual pendeu a salvação do mundo por Aquele que invocamos como o verdadeiro Príncipe da Paz.

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