Não é raro ouvir que o papel do Padre na Igreja não está claro, especialmente, numa “Igreja sinodal”, onde se dá importância a todos os membros e o papel do Padre parece ficar reduzido na sua importância. Outras vezes, numa compreensão insuficiente de “combate ao clericalismo”, também pode acontecer que o papel do Padre fique esvaziado de maneira equivocada. Como fica o Padre numa Igreja sinodal?
O Documento final da assembleia do Sínodo sobre a sinodalidade da Igreja (2021-2024), que o Papa Francisco assumiu como seu documento, resume em três as características de uma “Igreja sinodal” (cf. nº 30). Antes de tudo, trata-se de um estilo peculiar que qualifica a vida e a missão da Igreja como um “caminhar juntos, reunir-se em assembleia do povo de Deus convocado pelo Senhor Jesus, na força do Espírito Santo, para anunciar o Evangelho”. Isso deve marcar o modo ordinário de viver e agir da Igreja e se expressa na acolhida comunitária da Palavra de Deus, na celebração da Eucaristia e na fraternidade da comunhão, participação e corresponsabilidade de todo o povo de Deus. A obra da Igreja não é fruto de esforços isolados e personalistas.
Em segundo lugar, a sinodalidade refere-se às estruturas, processos e organizações eclesiais nos quais a natureza sinodal se exprime de maneira institucional, de maneira análoga, nos vários níveis da sua realização local, regional ou universal. Tais estruturas e processos servem ao discernimento autorizado da Igreja na sua vida e da missão. São eles, por exemplo, os vários conselhos de uma paróquia ou diocese, as conferências episcopais e outros organismos regionais ou universais, como o próprio Sínodo dos Bispos.
Em terceiro lugar, faz parte da sinodalidade da Igreja o próprio processo e evento sinodal universal, convocado e presidido em âmbito local, regional ou universal pela Autoridade competente, para promover a escuta e o discernimento sobre a vida e a missão da Igreja e sobre decisões a serem tomadas. No processo sinodal, o povo de Deus é envolvido de modos e em níveis diversos.
A sinodalidade da Igreja, portanto, expressa um modo de ser e de viver da Igreja, Povo de Deus, onde se procura reconhecer e promover a “cidadania eclesial” dos membros da Igreja, valorizando a dignidade e a vocação comum de todos os batizados, filhos de Deus e membros da Igreja, e promovendo a participação de todos na vida e missão da Igreja, cada um conforme o dom recebido. Numa Igreja sinodal, não há lugar para uma espécie de clientelismo religioso, onde alguns se presumem como “donos do bem religioso” e os outros como “consumidores do bem religioso”. A Igreja está longe de ser um ente empresarial de bens religiosos. Ela é a comunhão ou comunidade dos batizados, filhos e filhas de Deus, discípulos missionários de Jesus Cristo e testemunhas do Evangelho do Reino de Deus no mundo.
Qual é, pois, o lugar do Padre numa Igreja sinodal? O documento sinodal remete à eclesiologia do Concílio Vaticano II, onde se afirma que os presbíteros “formam com o Bispo um único presbitério” (LG 28) e colaboram com ele no discernimento dos carismas e no acompanhamento e orientação da Igreja local, com atenção especial ao serviço da unidade (cf nº 72). Evidentemente, o Documento sinodal não pretende expor de modo completo e exaustivo a doutrina e a teologia do sacerdócio católico, e refere-se à natureza sinodal do sacerdócio e do seu exercício. O ministério ordenado do Bispo, do presbítero e do diácono está a serviço do anúncio do Evangelho e da edificação da comunidade eclesial. O ministério do Padre, vivido de maneira sinodal, deve ser compreendido na sua relação com o bispo, com os demais presbíteros e com o povo de Deus confiado aos seus cuidados.
Na relação com o Bispo, o ministério é vivido como comunhão no mesmo dom e missão, embora em graus e competências diferentes. Com os demais presbíteros, a sinodalidade é vivida como comunhão e fraternidade no sacerdócio, enquanto dom e serviço, na atenção e ajuda recíprocas, tanto humanas quanto na missão pastoral. O exercício do ministério sempre deveria ser compreendido como dom e graça que se tem em comum com os outros presbíteros, e como serviço compartilhado ao Povo de Deus.
Numa Igreja sinodal, o Padre vive e atua na relação com os demais membros do povo de Deus como presidência da comunidade que lhe é confiada, em nome de Cristo e da Igreja, para servi-la nos bens de Deus e acompanhá-la no caminho da missão e da santificação. Numa Igreja sinodal, o Padre não perde sua importância, muito pelo contrário. Ele segue sendo o servidor do Povo de Deus, que valoriza todos os dons e carismas e vocações existentes na sua comunidade, promove os organismos de participação nas responsabilidades da comunidade eclesial, como os diversos conselhos, organizações pastorais e associações laicais e carismas da vida consagrada e chama a todos para a vivência da vida cristã, o testemunho e a missão. Seu papel, numa Igreja sinodal, não ficou diminuído, mas destacado e, certamente, colocado numa perspectiva de “comunhão, participação e missão”.