O Concílio Vaticano II situa a origem da Igreja na vida de comunhão e ação da Santíssima Trindade: no desígnio do Pai Criador, na missão do Filho Redentor e na ação do Espírito Santificador (cf. LG 2-4). É bela e profunda a definição da Igreja como “o povo reunido na unidade do Pai e do Filho e do Espírito Santo” (nº 4). Isso caracteriza a Igreja como um “mistério”, cuja realidade vai muito além dos seus aspectos visíveis e históricos. Na Igreja, existe mais do que o humano: Nela está presente e age o Divino.
Ensina ainda o Concílio: “Aprouve a Deus santificar e salvar os homens, não singularmente, sem nenhuma conexão uns com os outros, mas constitui-los em um povo, que O conhecesse na verdade e santamente O servisse” (nº 9) Desde a sua origem, portanto, a Igreja é uma realidade comunitária orgânica, na qual uns estão relacionados com os outros e dependem dos outros, ajudando-se reciprocamente para alcançar mais facilmente os grandes objetivos da vida e do chamado a viver o “mistério da Igreja”.
São Paulo, para falar da Igreja e da vida comunitária, usa a imagem do corpo, onde há uma cabeça (Cristo) e muitos membros, órgãos e funções (os cristãos). Nenhum membro ou órgão existe só em função de si próprio, mas para o bem do corpo inteiro, na diversidade de suas funções e necessidades (cf. 1Cor 12,12-27). Para dar a entender melhor o que é a Igreja, o Novo Testamento também recorre à imagem da construção, cuja rocha firme e pedra angular é Jesus, e todos os cristãos são como pedras vivas na construção desse “templo espiritual”, casa de Deus entre os homens (cf. 1Pd 2,7; 1Cor 3, 9-17).
A Igreja de Cristo é, pois, essa realidade bela e orgânica, um organismo vivo e não apenas uma instituição juridicamente estruturada. Nela e por ela, Deus Trindade continua agindo no mundo em benefício da vida e salvação plena da humanidade. Ela é o povo de Deus, dos discípulos de Cristo, reunidos em torno Dele pela fé, esperança e amor, conduzidos por Ele qual bom pastor, santificados continuamente mediante sua Santa Paixão, Morte e Ressurreição, alimentada e fortalecida por Ele na sua palavra e no seu corpo doado, pão vivo para a vida do mundo.
A imagem mais eloquente daquilo que é a Igreja, nós a temos na comunidade que celebra a Eucaristia: somos povo convocado pela palavra de Deus, que responde pela fé, animado e guiado pelo Espírito Santo, e se reúne em torno de Cristo, presente nos sinais da Eucaristia, da Palavra, do altar, do sacerdote, da comunidade reunida em seu nome. Somos povo em comunhão, sem distinções nem discriminações, que celebra como se fosse um só coração, cujas preces, louvores, súplicas e ações de graças sobem ao Pai pela mediação de Jesus Cristo. E, da celebração da Eucaristia, alimentados e renovados, fortalecidos e confortados, somos novamente enviados em missão ao meio do mundo, nos afazeres e deveres cotidianos para testemunhar que o Reino de Deus chegou.
A vida cristã, pois, está longe de ser um exercício individualista e autorreferencial de apatia em relação àquilo que nos cerca ou de fuga dos irmãos e de seus mil clamores, de suas “alegrias e esperanças, sofrimentos e angústias”. A vida cristã é vivida pessoalmente, mas com profundas relações e laços comunitários. É na participação na vida comunitária que crescemos na fé, aprendemos dos irmãos, nos sentimos amparados e mais seguros, encontramos luz e referências para compreender melhor a “ouvir o que o Espírito diz à Igreja”. Na participação na vida comunitária da Igreja, encontramos o testemunho de tantos irmãos, mais amadurecidos na fé, esperança e caridade, e temos a certeza de que, tantos que nos precederam na fé, nos deixaram um legado de valor incalculável na compreensão do Evangelho e da sua interpretação na vida.
Diante disso, imaginemos o que perdem os irmãos que se afastam da vivência da fé em comunidade e preferem trilhar um caminho solitário! Quem deixa de participar da vida comunitária da Igreja dificilmente consegue compreender a fé cristã e terá grandes dificuldades para crescer e perseverar na fé. Penso na implicação que isso tem para a iniciação à vida cristã e as diversas formas de catequese ao longo das fases da vida.
A iniciação à vida cristã nunca pode ser feita de forma abstrata, sem vincular o que se transmite com a vivência disso na comunidade cristã. Ela precisa ter presente a inserção dos que iniciam o caminho da vida cristã no grande caminhar do povo de peregrinos, para aprenderem, passo a passo, a caminhar com esse povo, sentir com ele, ser parte dele, alegrar-se com ele, amparar-se nele, crescer e amadurecer com ele, abraçar a missão de testemunhas de Jesus Cristo e do Evangelho do Reino de Deus no mundo. Será que nossas catequeses estão fazendo isso?