Maio, mês de Maria… mês da Mãe de Deus e nossa

No universo católico nada se compara à devoção mariana. Basta falar na “Mãe de Deus e nossa” para que uma torrente de ternura, gratidão e esperança se espalhe pela multidão dos fiéis. Sabiamente, o esperto João Grilo, em O Auto da Compadecida, de Ariano Suassuna, vendo-se à beira da condenação, irremediavelmente nas mãos do Diabo, recorre àquela que não falha, certo de que a compaixão de Nossa Senhora não o abandonará.

Arte: Sergio Ricciuto Conte

Ao longo dos séculos, todo tipo de cristão se entregou aos cuidados de Maria. Pobres e ricos, iletrados e eruditos, pacifistas e guerreiros, santos e pecadores buscaram – e encontraram – na Mãe de Deus, consolo, abrigo e proteção. Não à toa, Nossa Senhora é padroeira dos latino-americanos em mais de 25 figuras espalhadas pelo continente. Quase sempre são pequenas imagens, feitas ou encontradas pelo povo simples (índios, pescadores, tropeiros); muitas com feições indígenas ou enegrecidas. Muitas vezes, como no caso de Guadalupe (México), Aparecida (São Paulo) e Nazaré (Pará), foram encontradas por pessoas pobres e socialmente excluídas; ou foram desde o início alvo da devoção de escravos ou indígenas, como nos casos de Copacabana (Bolívia), San Cristóbal (Cuba) e las Victorias (Venezuela).

No século XX, as principais aparições da Virgem antecederam grandes desgraças, preparando e consolan- do o povo para as provações que se seguiriam. Em Fátima, em 1917, as aparições são cercadas de pelo menos um fenômeno grandioso: um deslocamento anormal do sol, presenciado por cerca de 70 mil pessoas, num raio de 18km, difícil de explicar como histeria coletiva, como fenômeno astrológico ou meteorológico. Além disso, as mensagens deixadas aos videntes de Fátima falam de eventos geopolíticos mundiais: a ascensão e a queda do comunismo na Rússia, um novo tempo de provação e massacres, no qual o “sangue dos mártires” seria usado para “regar a alma dos que se aproximam de Deus”. As duas mais famosas, além de Fátima, aconteceram em Ruanda (já reconhecida pela Igreja), em 1981, pouco antes da guerra civil que matou cerca de 800 mil pessoas, e em Međjugorje, também em 1981, antecedendo a guerra civil da Bósnia-Herzegovina.

Nas imagens da padroeira das Américas ou nas grandes aparições do século XX se reafirmam um conjunto de imagens arquetípicas, que – de certa forma – transcendem a própria fé católica, para se tornar símbolo de toda a dor e toda a ternura que pode haver no coração humano. Afinal, qual dor pode ser maior do que a da mãe que vê seu filho amado morrer injustamente? Qual doação humana pode ser mais irrestrita do que a da mãe que se desvela por seu filho?

O ser humano não está só. As beatas chorosas, entoando desafinadas litanias pelo bem do mundo e de seus entes queridos, não estão sós. O caipira Pirapora, que reza na canção de Renato Teixeira, que só tem seu olhar para mostrar, não está só. Os massacrados no absurdo da guerra, pelos quais papas e santos ousaram perguntar a Deus “onde Tu estavas quando isso aconteceu?”, como fez Bento XVI em Auschwitz, não estão sós. Mas também Deus, em sua onipotência aparentemente tão distante de nossas emoções cotidianas, não está só. Também Ele experimentou um amor de mãe… Um amor de mãe nos une ao Infinito. Podemos crer ou não, mas nosso coração não pode manter sua humanidade sem se comover com o anúncio de tal prodígio!

O jesuíta argentino Jorge Mário Bergoglio faz parte desta imensa multidão de cristãos devotos da Virgem Maria. Como Papa Francisco, achou, em Roma, um lugar para seu encontro pessoal com a Mãe – e escolheu esse lugar para ser enterrado. Nesta edição do Caderno Fé e Cultura, o mariologista Padre Alexandre Awi Mello nos conta essa história – e comenta suas implicações para uma justa compreensão do papado de Francisco.

guest
0 Comentários
Inline Feedbacks
Veja todos os comentários