A tradicional Folia de Reis é uma manifestação popular que busca preservar a religiosidade nas cidades do interior paulista. Vários grupos se apresentaram no evento Revelando SP, entre os dias 20 e 24, no Parque da Água Branca, na zona Oeste da capital.
O Dia de Reis é celebrado em 6 de janeiro, data em que o calendário da fé cristã narra a visita dos três reis magos ao Menino Jesus, em Belém. Segundo o relato bíblico, os reis, guiados por uma estrela, levaram ao recém-nascido ouro, incenso e mirra.
A Folia de Reis é uma tradição centenária na cultura popular, que reúne grupos de cantadores e instrumentistas que vão, de casa em casa, para homenagear os reis magos: Baltazar, Belchior e Gaspar.
No Revelando SP, considerado o maior festival de cultura popular do estado de São Paulo, mais de 25 grupos de Folia de Reis, vindos do interior paulista, se apresentaram mostrando ao público, de todas as idades, essa manifestação da religiosidade e da fé por meio da arte.
ORIGEM
A Folia de Reis está associada a uma tradição cristã de origem portuguesa e espanhola, que foi trazida para o Brasil, provavelmente, no século XIX. São manifestações culturais-religiosas que buscam manter viva a devoção aos reis magos, ao Divino Espírito Santo, a São Sebastião, a São Benedito e a Nossa Senhora da Conceição.
As folias, também conhecidas como caravanas ou companhias, são formadas por um mestre ou embaixador, um contramestre, os três reis magos, os palhaços e os foliões.
Os grupos são conhecidos por suas danças e cantorias acompanhadas por múltiplos instrumentos de corda, sanfonas e percussão, que saem pelas ruas, de casa em casa, cantando louvores e recolhendo donativos para ações caritativas nas paróquias e comunidades.
FÉ E CULTURA
A Companhia de Reis Estrela Guia, de São José do Rio Preto (SP), foi fundada em 1970, com o intuito de propagar a fé e a tradição de prestar homenagens aos reis magos.
Junio Fonseca Nascimento, 37, é o atual presidente, embaixador da companhia e membro do grupo há 27 anos: “Como foliões, nossa principal missão é mostrar essa devoção popular às novas gerações. Atualmente, somos 30 membros na companhia que fomenta essa tradição cultural com o intuito de resgatar os jovens para o caminho da fé”, disse, recordando que conheceu o grupo ainda na infância, quando viu uma apresentação pelas ruas da cidade.
“Minha esposa e filhos me acompanham. Somos, assim como na maioria dos grupos, em pequena quantidade, e muitos já em idade avançada. O que nos fortalece é a certeza da missão realizada”, disse Nascimento.
ESPIRITUALIDADE E ARTE
Wallace Henrique Calixto Chagas, 24, é o palhaço da Companhia Estrela Guia e ingressou no grupo após ver a sua atuação na cidade. Já são 18 anos como membro do grupo.
“Aprendi com meus pais a participar da missa e atuar nas pastorais da paróquia. A companhia de Folia de Reis me apresentou uma nova dinâmica de expressar a espiritualidade por meio da arte. É fantástico ver crianças, jovens, adultos e idosos unidos pela arte na evangelização”, afirmou, emocionado.
Chagas recordou que as apresentações da companhia se destacam no período de 24 de dezembro a 6 de janeiro, e que, durante o ano eles são chamados para eventos em São José do Rio Preto e arredores.
“Meus amigos ficam impressionados porque deixo de ir a baladas, festas e até rodeios para evangelizar. A Estrela Guia é uma família na qual aprendo muito e quero que mais pessoas tenham contato com essa folia do bem”, contou.
SEGUNDA FAMÍLIA
A Folia de Reis Santo Antônio, de Caraguatatuba (SP), foi fundada em 1998. Atualmente, conta com 13 membros que no período de outubro a janeiro, aos fins de semana, realizam visitas a mais de 100 famílias na cidade, simbolizando o percurso dos reis magos ao encontro de Jesus.
“A visita nas casas é um momento de evangelização, uma oportunidade de transmitir a fé e até convidar para a atuação nas pastorais da Igreja”, destacou Edil de Almeida do Espírito Santo, 74, coordenador do grupo, do qual começou a participar aos 7 anos de idade, acompanhando seus pais que eram foliões. “Na companhia, aprendi muitas coisas, mas sempre destaco a humildade, a simplicidade e o senso de família. Esta é a minha segunda família”, afirmou.
ENGAJAR NOVOS MEMBROS
A Companhia de Reis São Francisco de Assis foi fundada em 1987 pelo folião Pedro Moreira de Sousa, o Goiano, a pedido do Padre Piaza, da Comunidade São Francisco de Assis, em Indaiatuba (SP).
Manoel Antonio Macedo, 70, presidente da companhia, participa desde sua fundação. “Para mim, o significado maior de ser folião de Santos Reis é saber que nós representamos uma história, que tem um significado importante para nossa fé e para a tradição da Igreja. É tão bom quando a gente sai com a companhia – porque levamos a fé, o amor, a esperança, e mantemos acesa a chama que não deixa essa cultura e a tradição se perderem”, afirmou.
Macedo ainda enfatizou que a missão é engajar os jovens para dar continuidade a essa jornada de fé. “Somos no momento 35 membros, mas todos já idosos”, disse, enfatizando a missão de levar a mensagem dos santos reis às casas das pessoas.
Amélia Cordeiro, 72, contou à reportagem que seu pai participava do grupo e ela desde pequena sempre atuou como foliã. “Hoje meu filho e neto participam como foliões, isso significa que essa tradição vem de família e atravessa gerações”, disse.
“Muitos podem achar ‘brega’ nossa ação, mas é preciso transmitir nossa cultura, é uma forma de evangelizar a humanidade, levando uma pitada de amor, compreensão e união às famílias e à sociedade”, afirmou.
Antonio Pereira dos Santos, 74, participa do grupo desde os 12 anos de idade. “Ser folião é um orgulho. Somos bem recebidos nas casas. Independentemente da religião, o respeito predomina, pois nosso ideal é levar a mensagem do Evangelho”, disse, ressaltando que tem o sonho de ver mais pessoas, sobretudo jovens, nas companhias para prosseguir essa tradição que atravessa gerações.