Um novo jeito de servir a Deus

Jovem religiosa encontrou na culinária uma forma de viver a radicalidade da sua consagração

Irmã Lorayne, vencedora da atual temporada do reality show – Arquivo Pessoal

Vocação é um chamado para servir a Deus e ao próximo, unido a um carisma, à espiritualidade e a uma missão. Culinária é a arte de cozinhar e encantar por meio de sabores e temperos. Irmã Lorayne Caroline Tinti, 33, religiosa consagrada do Instituto das Comunidades de Nossa Senhora da Ressurreição (Irmãs da Ressurreição), participou recentemente do reality culinário “Masterchef Brasil”, transmitido por uma emissora de televisão, e foi a campeã da temporada, levando o troféu de “Melhor Cozinheira”.

COMEÇO DE TUDO

Irmã Lorayne nasceu em Catanduva, cidade do interior de São Paulo. De família humilde, filha de pais espíritas, avó paterna católica e avó materna evangélica, a jovem religiosa afirma ter sido escolhida por Deus para uma missão especial: “Deus me escolheu para seguir seus passos em uma congregação religiosa, mesmo em meio à diversidade religiosa da minha família”.

Lorayne conheceu a congregação quando seus pais a matricularam no Colégio das Irmãs da Ressurreição. Aos 16 anos, começou a Catequese para adultos e, simultaneamente, encontros vocacionais. Aos 18, ingressou na congregação para as etapas formativas, e, aos 24 anos, professou os votos religiosos. “Hoje, meus pais são ministros da Igreja Católica, participam do Encontro de Casais com Cristo (ECC) e, claro, grande apoiadores da minha vocação”, destaca a consagrada, que pertence ao instituto há 15 anos, onde emitiu seus votos perpétuos.

DESPERTAR DE UMA NOVA PAIXÃO

Lorayne, no início da sua etapa formativa, foi encaminhada para uma casa de missão da congregação em Jequitinhonha (MG), um espaço de acolhimento onde as religiosas oferecem curso de panificação a jovens da região com o intuito de proporcionar dignidade e uma capacitação profissional. “É um ato de ensinar, produzir o alimento com as mãos, servir e saciar a fome de quem mais precisa”, salienta.

Nesse ambiente, resgatou dentro de si uma paixão: a culinária. “Minha mãe, avós e tias são excelentes cozinheiras e isso despertou algo em mim com o desejo de aprender e aprimorar os meus dotes culinários. Sabia cozinhar o básico, mas, aos poucos, fui buscando aprender a fazer comidas mais elaboradas. A abundância da inter-regionalidade no convento é muito enriquecedora, fui apresentada a novos ingredientes, sabores, temperos, é uma verdadeira escola gastronômica.”

Atualmente, a freira atua em uma escola de formação integral na qual capacita crianças e adolescentes com aulas de culinária. “Tenho a oportunidade de ensinar as crianças a ter prazer em cozinhar, também de se alimentar de forma saudável.” Também ensina o ofício na comunidade formativa onde reside atualmente. “Costumo dizer que não são aulas de Gastronomia, mas a arte de aprender a dar vida e sabor aos alimentos”, enfatiza.

Quem pensa que a jovem freira se cansa de tantos afazeres no dia a dia se engana. Ela ainda cozinha e monta marmitas que são doadas para a “ONG Beija Flor”, que as distribui para moradores de ruas da capital de São Paulo, “gesto concreto de saciar a fome de quem está à margem da sociedade e precisa do básico: um prato de comida”.

REALITY CULINÁRIO

“O ‘Masterchef Brasil’ é um programa de culinária que sempre me chamou a atenção, pelos desafios, pela superação de cada participante, sem contar as guloseimas que, só de pensar, dão água na boca; participar nunca foi prioridade”, recorda a irmã.

Este ano, por causa da pandemia de COVID-19 que abalou o mundo, o reality abriu as portas para cozinheiros amadores e, “quando vi essa novidade, pensei: ‘vouparticipar’. A madre superiora não concordou, comeceuma campanha entre as irmãs que me apoiaram; então, a superiora acabou concordando e foi um momento muito especial”, destaca a freira.

Na competição, Lorayne teve duas provas: uma de receita doce e a outra de salgado. Apresentou dois pratos: um tiramisu (sobremesa de origem italiana à base de queijo, chocolate e café) e um strogonoff de camarão. “Confesso, nunca tinha feito um tiramisu na minha vida, só provado uma única vez. Foi Deus que me guiou durante a competição e, claro, os participantes e os jurados foram muito atenciosos e respeitosos, e me deram dicas importantes”.

A jovem salienta que participar da competição que tem visibilidade nacional despertou nos jovens que a assistiram um grande interesse em conhecer a missão, carisma e espiritualidade das religiosas: “Houve uma procura significativa de jovens manifestando o desejo de consagrar sua vida a Deus, e outros se expressaram muito felizes e surpresos com a presença de uma freira em um reality culinário. Foi uma oportunidade de mostrar o rosto jovem da vida religiosa”.

É, também, “uma maneira de despertar nos jovens a busca da concretização de seus sonhos, mas, para isso, é preciso acreditar, é preciso correr atrás para a sua realização”, confirma a religiosa.

O troféu “Melhor Cozinheira” é uma confirmação e uma conquista “para mim e para nós, religiosas, que temos uma opção de vida pautada na radicalidade do seguimento a Cristo, mas que somos humanas e cheias de qualidades, dons e talentos que o mundo precisa conhecer”, finaliza Lorayne. O valor financeiro da premiação a religiosa destinou na íntegra aos projetos sociais em que atua e pretende ensinar culinária a pessoas carentes e capacitá-las a uma profissão digna.

A religiosa Masterchef compartilha com os leitores do O SÃO PAULO uma receita fácil de fazer e superdeliciosa. “O bolo natalino é o meu preferido.”

Bolo natalino

  • Ingredientes: 2 ovos (gemas e claras separadas)
  • 150ml de leite 1 colher bem cheia de manteiga
  • ½ xícara de chá de açúcar
  • 1 xícara de chá de farinha de trigo
  • 1 colher de sobremesa de fermento em pó
  • 100g de frutas cristalizadas
  • 1 colher de sobremesa de essência de panetone
  • 1 colher de café de raspas de laranja ou limão

Modo de preparo:

Bata as claras em neve e reserve. Na batedeira, bata as gemas, a manteiga e o açúcar por aproximadamente 3 minutos, até obter um creme. Acrescente o leite, a essência de panetone, as raspas de laranja ou limão e a farinha, e bata ligeiramente, só para misturar os ingredientes. Adicione as claras em neve e misture aos poucos. Passe as frutas cristalizadas na farinha de trigo e retire o excesso (isso evita que elas fiquem só no fundo do bolo) e misture as frutas cristalizadas delicadamente à massa. Acrescente o fermento em pó. Está pronta a massa. Unte a forma. Coloque em cima da massa as frutas cristalizadas para decorar e asse em forno preaquecido a 180ºC por 35 minutos.

guest
0 Comentários
Inline Feedbacks
Veja todos os comentários