Cristãos: os mais perseguidos em todo o mundo

Na quinta-feira, 6, acontece o Dia de Oração pelos Cristãos Perseguidos, promovido pela  Fundação Pontifícia Ajuda à Igreja que Sofre


Cristãos rezam em frente ao ícone de Nossa Senhora das Dores, na Síria, um dos países onde há perseguição aos que professam a fé no Cristo (Crédito: ACN)

Nadeem Joseph era um dos sobreviventes do ataque terrorista sofrido pelos cristãos na Igreja de Todos os Santos, no Paquistão, em 2013. Em maio deste ano, ele mudou-se com a família para TV Colony, em Peshawar. Pouco tempo depois, um vizinho muçulmano passou a ameaçá-lo, dizendo que deveria deixar o bairro, que “não era para cristãos sujos”. Em 4 de junho, Nadeem foi atingido no estômago por três balas. Passou por várias cirurgias, mas morreu no dia 29 daquele mês.

O caso de Nadeem é um dos milhares que ilustram a perseguição sofrida pelos cristãos. De acordo com a Fundação Pontifícia Ajuda à Igreja que Sofre (ACN), que apoia projetos da Igreja Católica em mais de 140 países, 80% das pessoas que sofrem perseguições por causa da fé são cristãs. Além disso, entre o total de cristãos no mundo, 327 milhões vivem em países onde há perseguição religiosa, e 178 milhões estão em localidades onde são discriminados por motivos religiosos. Somados a estes dados, chega-se à constatação de que um em cada cinco cristãos está em países nos quais há perseguição ou discriminação religiosa.

Oração pelos que mais sofrem

Todos os anos, a ACN promove o Dia de Oração pelos Cristãos Perseguidos. Em 2020, será na quinta-feira, 6, quando todos são convidados a fazê-lo em missas, momentos de Adoração, na reza do Santo Terço ou com orações individuais.

A iniciativa, que tem o apoio da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), começou em 2015 e faz referência à noite de 6 de agosto de 2014, quando cerca de 100 mil cristãos tiveram de abandonar suas casas na Planície de Nínive, no Iraque, após serem expulsos pelos extremistas do grupo Estado Islâmico.

Mas, por quê?

Segundo Valter Callegari, diretor da ACN Brasil, a perseguição religiosa está associada especialmente a elementos de origem econômica, étnica e geográfica. “De uma maneira generalizada, podemos afirmar que os cristãos sofrem ameaças de três frentes: do hiperextremismo islâmico, do nacionalismo populista e dos regimes autoritários. Os cristãos sofrem nas mãos de regimes nacionalistas ou teocráticos que proíbem qualquer coisa que não seja estabelecida pelos mandatários, que, muitas vezes, criam um ambiente que fomenta a violência contra os cristãos, e, não raras vezes, eles próprios usam da força e enfrentamento violento. Já no caso do hiperextremismo islâmico, a perseguição ocorre sempre de forma violenta”, explicou ao O SÃO PAULO.

Perseguição e discriminação

O diretor da ACN Brasil afirmou que a perseguição é algo que ocorre de modo ativo, por atores estatais ou não, com vistas a exterminar, expulsar ou subjugar pessoas de um grupo religioso: “A perseguição tem um caráter sistemático e, frequentemente, é acompanhada de violência. Grupos minoritários podem estar sujeitos a homicídio, expropriação forçada, roubo, deportação, exílio, conversão forçada, casamento forçado, rapto, acusações de blasfêmia etc. Em casos extremos, a perseguição pode se transformar em genocídio”.

Já a intolerância religiosa é mais abrangente e existe em praticamente todos os países e culturas. “É preciso, no entanto, registrar uma mudança significativa quando a intolerância é mostrada abertamente e permanece incontestada pelas autoridades competentes. A intolerância se desenvolve com a repetição de mensagens, retratando um grupo em particular como perigoso ou nocivo em uma sociedade. O ofendido ou lesado, contudo, ainda tem recurso à lei. A intolerância é a mais difícil de quantificar do que a perseguição, pois é mais frequentemente definida como um sentimento”, prosseguiu Callegari.

Extremistas islâmicos

De acordo com a ACN, a perseguição aos cristãos nos principais países do Oriente Médio tem diminuído, mas suas consequências ainda são perceptíveis nos fluxos migratórios, crises de segurança, pobreza extrema e recuperação lenta das comunidades afetadas.  

A situação é mais grave atualmente no continente africano, onde extremistas islâmicos têm perseguido os cristãos com o uso da força e até subornos para que mudem de religião.

“Os grupos que foram derrotados e expulsos do Oriente Médio encontraram um terreno fértil em alguns países africanos. Embora grupos como o Boko Haram já estivessem na Nigéria há mais tempo, agora essa presença tem se expandido para outros países, como, por exemplo, Burkina Faso, Níger e Madagascar. A explicação dessa mudança aponta que esses grupos hiperextremistas crescem onde não há uma resposta governamental estruturada. Em outras nações da África, como a Tanzânia e o Quênia, uma resposta rápida do governo impediu que o hiperextremismo avançasse”, explicou Callegari.

O poder da oração

“É uma missão de toda a Igreja rezar pelos cristãos perseguidos”, ressaltou o diretor da ACN Brasil, ao recordar que a Fundação Pontifícia tem como pilares a informação, a oração e a ação. Ele convida todos a rezar por aqueles “que têm sua fé testada com duras provas diariamente”.

Na Arquidiocese de São Paulo, o Cardeal Scherer presidirá missa no contexto do Dia de Oração pelos Cristãos Perseguidos, na quinta-feira, dia 6, às 12h, na Catedral da Sé.

Saiba mais detalhes sobre o Dia de Oração pelos Cristãos Perseguidos em www.acn.org.br/6deagosto.

A perseguição aos cristãos no século XX

O século XX foi marcado por genocídios e guerras que vitimaram milhões de pessoas. Os cristãos e, em particular, os católicos, foram alvo de perseguição por regimes totalitários e fanatismos religiosos. O jornal O SÃO PAULO apresenta uma breve linha do tempo com as maiores perseguições aos cristãos no século passado.

1899-1901 – Levante dos Boxers, na China: iniciado no fim do século XIX, buscou expulsar todos os estrangeiros do país. Bispos, centenas de padres e freiras, além de dezenas de milhares de leigos, foram mortos.

1915-1923 – Genocídio Armênio: o Império Turco-Otomano realizou o primeiro massacre em massa de cristãos do século XX. As estimativas são de 1,5 milhão de cristãos mortos.

1917-1988 – União Soviética: em um regime fundado a partir de uma ideologia anticristã, milhões de cristãos foram perseguidos e mortos. A política soviética pretendia controlar, suprimir e, em última instância, eliminar quaisquer crenças religiosas. Foram mortos de 12 milhões a 20 milhões de cristãos, e, pelo menos, 100 mil clérigos russos executados somente durante o Grande Expurgo, uma violentíssima campanha de repressão política entre 1936 e 1938 comandada por Josef Stalin.

1917-1929 – México: a constituição mexicana de 1917 previa uma série de artigos anticlericais. O governo de Plutarco Elías Calles, inspirado pela maçonaria, a partir de 1924, começou a colocar em prática uma violenta perseguição à Igreja. A Guerra Cristera foi a reação de muitos católicos à perseguição.

1936 – Guerra Civil Espanhola: o conflito entre comunistas e as tropas de Franco ocasionou a perseguição à Igreja Católica. No chamado Terror Vermelho, grupos da esquerda mataram 6.832 padres. Outros milhares de leigos católicos foram mortos por simplesmente expressarem sua fé, sem direito a nenhuma defesa. Morreram cerca de 50 mil pessoas.

1941-1945 – Nazismo: aos campos de concentração, além dos judeus, foram mandados, também, milhares de católicos. O campo de Dachau, na Alemanha, recebeu em torno de 2,5 mil padres, monges e seminaristas, dos quais mais de mil morreram ali. Nesse campo, foi morto o Beato Karl Leiner. Em Auchwitz, São Maximiliano Maria Kolbe e Santa Edith Stein foram martirizados.

1948 – Revolução Comunista na China: foi proibida a posse de quaisquer textos religiosos. Igrejas foram destruídas e fechadas. Há registro de cerca de 2 milhões de mortos.

1954-1957 – Comunismo no Sudeste Asiático: comunistas perseguiram católicos no Vietnã do Norte e arredores. Milhares foram decapitados por se recusarem a pisar em crucifixos.

1985-2005 – Perseguição islâmica no Sudão: a partir de 1985, houve uma grande perseguição aos cristãos, pois estes se recusavam a aceitar a Sharia, a lei islâmica. Milhões perderam suas casas e muitos foram mortos. A perseguição terminou em 2005, com a assinatura de um cessar-fogo.

(Pesquisa e edição de texto: Gustavo Catania Ramos)

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