O SÃO PAULO ouviu representantes dos trabalhadores domésticos, da indústria e do comércio sobre ações individuais, corporativas e governamentais para a manutenção da dinâmica produtiva da sociedade em meio à pandemia
O Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil encolheu 4,1% em 2020. A taxa de desemprego no País supera os 14%, sendo ainda maior entre os trabalhadores informais. Essas são algumas das consequências da pandemia de COVID-19 listadas por economistas, banqueiros, empresários e ex-ministros em uma carta pública divulgada em março, na qual se ressalta que a principal medida para resguardar a vida das pessoas e retomar a pujança da economia do País é a ampla vacinação da população.
“A redução do nível da atividade nos custou uma perda de arrecadação tributária, apenas no âmbito federal, de 6,9%, aproximadamente R$ 58 bilhões, e o atraso na vacinação irá custar em termos de produto ou renda não gerada nada menos do que estimados R$ 131,4 bilhões em 2021, supondo uma recuperação retardatária em dois trimestres. Nesta perspectiva, a relação benefício versus custo da vacina é da ordem de seis vezes para cada real gasto na sua aquisição e aplicação”, escrevem os signatários da referida carta, na qual também defendem uma ampla distribuição de máscaras à população.
Até o início desta semana, pouco mais de 11% dos brasileiros já haviam recebido a 1a dose da vacina contra a COVID-19. A 2a dose foi aplicada em mais de 3% da população.
Auxílio emergencial: essencial
Neste mês, o Governo Federal iniciou o pagamento da nova rodada do auxílio emergencial, que será feito a 45,6 milhões de pessoas. O valor médio é de R$ 250.
“No ano passado, o auxílio emergencial foi fundamental para assistir esses trabalhadores mais vulneráveis que perderam seus empregos, e levou a uma redução da pobreza, evidenciando a necessidade de melhoria do nosso sistema de proteção social”, escrevem os signatários da carta, apontando, ainda, que “o acréscimo de adesão ao distanciamento social entre os mais vulneráveis depende crucialmente do auxílio emergencial”.
Esse impacto do auxílio emergencial foi observado pelo Sindicato das Empregadas e Trabalhadores Domésticos da Grande São Paulo (Sindoméstica). “Boa parte da categoria é de trabalhadores informais, sem registro em carteira, e 90% são de mulheres, muitas delas chefes de lar. O auxílio é essencial para que elas façam a manutenção da sua casa, principalmente as diaristas que não têm um salário fixo. Por menor que seja o valor do auxílio emergencial, ele socorre de alguma forma”, disse à reportagem Nathalie Rosário de Alcides, advogada do Sindoméstica, ressaltando, ainda, que para muitos o auxílio é a opção para não se exporem diariamente na busca de serviços eventuais.
De acordo com um estudo da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), 35,4% do total de recursos do auxílio emergencial em 2020 foi usado pelas pessoas para compras no comércio, percentual que este ano deve ficar em 31,2%.
Marcel Solimeo, economista-chefe da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), considera que a nova rodada do auxílio emergencial será fundamental para manter muitos comércios que já estão descapitalizados e endividados: “Muitos ainda estão resistindo, mas não vão permanecer por muito tempo. É preciso que o dinheiro do auxílio emergencial entre logo para a conta das pessoas”.
Apoio a médias e pequenas empresas
Para André Rebelo, diretor executivo de Economia e Estratégia da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), “o conjunto de políticas públicas que o Governo Federal produziu no ano passado foi muito importante, por isso houve a retomada econômica no segundo semestre, e o ano terminou na indústria, na agricultura, no varejo, acima do que estávamos antes da pandemia. Precisamos reviver este mix vitorioso, virtuoso: flexibilização das regras trabalhistas; postergação do prazo para o recolhimento de impostos, que deu fôlego para as empresas; aumento e criação de linhas de crédito específicas para as empresas; e o auxílio emergencial”.
No dia 7, o Governo Federal enviou ao Congresso um projeto que altera a Lei de Diretrizes Orçamentárias, a fim de que se autorizem créditos extraordinários destinados a programas emergenciais para redução de salário e jornada na iniciativa privada e apoio a micro e pequenas empresas, o chamado Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe). Em 2020, a primeira medida custou ao Governo Federal cerca de R$ 33,5 bilhões e beneficiou 10,2 milhões de trabalhadores. Já o montante destinado ao Pronampe foi de R$ 37 bilhões, e auxiliou cerca de 520 mil micro e pequenos negócios.
A ‘luta’ contra as aglomerações diárias
Na carta pública, os economistas, banqueiros, empresários e ex-ministros afirmam ser “urgente o reforço de medidas de distanciamento social”, e consideram que “a melhor combinação é aquela que maximize os benefícios em termos de redução da transmissão do vírus e minimize seus efeitos econômicos, e depende das características da geografia e da economia de cada região ou cidade”.
Na segunda-feira, 12, o estado de São Paulo retornou para a fase vermelha do plano de flexibilização das atividades presenciais, após permanecer por quase um mês na fase emergencial. Uma das sugestões aos setores produtivos para aquele período se mantém para este: o escalonamento de horários para a entrada e saída de funcionários nas indústrias (5h-7h e 14h-16h), serviços (7h-9h e 16h-18h) e comércios (9h-11h e 18h-20h).
“É uma medida que ajuda bastante, pois assim se dilui ao longo do dia as pessoas que precisam sair para trabalhar ou para comprar”, avalia Solimeo, da ACSP. Ele pondera, porém, que quando for permitida a reabertura dos comércios, uma limitação no horário de funcionamento será ineficaz. “Para evitar aglomerações, é preciso espalhar o horário de atendimento às pessoas. O contrário não faz sentido”, ressalta.
Tanto o Governo do Estado quanto a Prefeitura de São Paulo afirmaram que na fase emergencial houve redução no número de usuários nos transportes coletivos e nos índices de congestionamentos de veículos na capital paulista.
Um motorista de micro-ônibus que atua na zona Leste de São Paulo relatou à reportagem que a frota de veículos tem sido mantida, o fluxo de passageiros diminuiu no último mês, mas ainda há excedente de passageiros: “No horário de pico, o pessoal está viajando em pé ainda, mas não é uma lotação como antes, está com menos gente. Antes, eu levava 400 passageiros em um dia, hoje não carrego nem 200”, contou, lamentando, que muitos ingressam nos veículos com a máscara, mas depois a retiram para comer ou conversar.
Nathalie afirma que o Sindoméstica tem sugerido que os empregadores “forneçam meios de transporte seguro para os trabalhadores, como o transporte por aplicativo ou terceirizado, e se possível estabeleçam uma política de flexibilidade de jornada, para que o empregado não utilize o transporte público no horário de pico”.
Solimeo pondera que, pela estrutura da maioria dos comércios, seria inviável custear a ida do funcionário ao serviço por outro meio que não seja o transporte coletivo. Já Rebelo afirma que o escalonamento apresentado pelo governo paulista não altera a realidade para o setor industrial, pois boa parte das empresas já adota o horário sugerido. “Quem controla o transporte público é o governo do estado e o município. E o que fizeram para reduzir a lotação? Nada. Está tudo como antes. Que o governo faça algo e que não jogue a responsabilidade para a sociedade”, enfatizou o economista da Fiesp.