Evento em São Paulo destacou o legado de Santa Hildegarda de Bingen; especialistas e religiosos discutiram práticas que integram ciência, espiritualidade e natureza

Fotos: Luciney Martins/O SÃO PAULO
Unindo ciência e espiritualidade de maneira inovadora, o legado de Santa Hildegarda de Bingen inspirou o 1º Congresso Internacional de Medicina Natural do Brasil, realizado em São Paulo, no Auditório Paraíso, na sexta-feira, 7, e no sábado, 8.
Especialistas em saúde natural do Brasil e do mundo apresentaram as contribuições da Santa alemã que viveu no século XII sobre as propriedades medicinais das plantas, o uso terapêutico de pedras preciosas, os princípios de uma alimentação saudável e as práticas integrativas que unem corpo, alma e espírito.
“Santa Hildegarda é a prova de que fé e ciência não se contradizem, mas se completam”, afirma o Padre Filipe Mirapalheta, um dos palestrantes. Para ele, compreender o ser humano em sua totalidade é resgatar a visão original da criação. “Para Santa Hildegarda, não existe saúde do corpo, da alma ou do espírito separadamente; existe apenas saúde, porque tudo faz parte de uma mesma realidade: a vida humana”, conclui.

VISÃO INTEGRAL DA CURA
Com mais de sete anos de experiência na medicina natural, Letícia Hoppe, idealizadora do evento e fundadora da Farmácia Hildegardiana, transformou uma experiência pessoal de enfermidade em missão.
“Conheci Santa Hildegarda depois que fui morar na Alemanha. Passei por um problema sério de saúde e foi a medicina inspirada por ela que me ajudou a encontrar a cura. A partir dessa experiência, percebi que tinha uma missão: levar esse conhecimento ao Brasil. Assim nasceu a Farmácia Hildegardiana”, detalhou.
A trajetória de Letícia encontrou eco no trabalho da nutricionista e médica Priscila Antunes, que também viu na medicina hildegardiana uma resposta capaz de integrar todas as dimensões da vida humana.

“Fiquei muito surpresa ao encontrar uma mulher do século XII falando de forma tão atual. Foi com ela que aprendi que a medicina do corpo não está separada da espiritualidade. Para alcançar um novo cenário de vida e caminhar rumo à cura, é preciso alinhar a mentalidade, curar os vícios por meio da prática das virtudes e viver o legado que Santa Hildegarda deixou”, comenta.
A nutricionista destaca que a medicina tradicional permanece indispensável, mas que a abordagem natural é complementar e necessária: “Existem tratamentos fundamentais para doenças crônicas ou inflamatórias, mas a medicina natural acrescenta um cuidado mais amplo: ajuda o paciente a reduzir doses, a melhorar a absorção dos medicamentos e a alcançar mais sucesso dentro do tratamento. Em muitos casos, contribui até para a cura ou remissão, diminuindo a necessidade do uso contínuo de remédios”.

BASES DA MEDICINA HILDEGARDIANA
Para Hildegarda, toda a criação está interligada, o ser humano é um “microcosmo” dentro do “macrocosmo”. Assim, para ela, Deus se revela tanto nas realidades visíveis da natureza quanto nas dimensões invisíveis e eternas. Em seus escritos, ela mostra que compreender a saúde é também compreender a harmonia entre o Criador, a criação e a criatura.
Hildegarda acreditava que o afastamento de Deus – consequência do pecado original – rompe a harmonia interior e gera desequilíbrio físico e emocional. Assim, a cura não se limita a tratar sintomas, mas envolve um processo de reconciliação espiritual e retorno à ordem divina. O corpo e a alma, para ela, adoecem juntos, e a verdadeira saúde é fruto da integração entre oração, bons hábitos e o cuidado com a natureza.
Inspirada na regra beneditina Ora et labora (“orar e trabalhar”), Hildegarda propôs uma vida equilibrada, baseada em alimentação saudável, jejuns moderados, repouso adequado, trabalho com sentido e busca pela serenidade interior. Condenava tanto os excessos quanto as privações extremas, defendendo a moderação como caminho para o bem-estar integral.

Entre os pilares de sua medicina está o conceito de viriditas, que expressa a “força verde” ou “energia vital” presente em tudo o que vive. Essa vitalidade divina sustenta o equilíbrio da criação e pode ser reativada por meio de práticas que restauram o vigor do corpo e a paz do espírito.
Sua medicina, portanto, vai além da fitoterapia ou da nutrição: é uma visão integral de saúde que une ciência, espiritualidade e natureza. Ao valorizar os alimentos puros, os remédios naturais e o equilíbrio interior, Santa Hildegarda antecipou muitos princípios hoje reconhecidos pela medicina integrativa e pela psicossomática.

EFEITO NATURAL QUE TRANSFORMA
Ao longo do evento, alguns participantes relataram benefícios da medicina hildegardiana. Este foi o caso de Márcia Lúcia das Chagas Souza, da cidade de Senador Amaral (MG): “Eu tenho endometriose severa e, depois de duas cirurgias, perdi três bebês. Ouvi em uma live da doutora Priscila que a endometriose está muito ligada à negação. Segui suas orientações: comecei uma mudança de mentalidade, usei os chás e fiz os tratamentos naturais. Depois disso, o Tobias nasceu”.
Para o Padre Filipe Mirapalheta, compreender o ser humano em sua totalidade ajuda inclusive a distinguir situações espirituais de questões físicas ou emocionais: “Trabalhei por quatro anos como exorcista com Dom Zeno Hastenteufel, Bispo emérito de Novo Hamburgo (RS), e posso afirmar com segurança: em cerca de 90% dos casos, a raiz do problema era física ou química, não sobrenatural. Muitas pessoas buscavam o sacerdote acreditando viver algo espiritual, quando na verdade precisavam de um acompanhamento integral para reorganizar sua vida interior”.

CIÊNCIA E ESPIRITUALIDADE
Ao entrar no auditório, os congressistas eram imediatamente envolvidos por um ambiente que parecia suspenso no tempo, desconectado da metrópole deixada para trás ao cruzar a porta. À frente do palco, uma harpa era dedilhada com suavidade, enquanto jogos de luz verde tingiam as paredes brancas e criavam uma atmosfera de natureza e serenidade. O kit sustentável, com ecobag, bloco e caneta de materiais recicláveis, reforçava o propósito do encontro: promover o natural não apenas como estética, mas como modo de vida.
A programação abordou temas como longevidade, desinflamação e o cuidado da alma, conduzidos por Letícia Hoppe e Priscila Antunes. Médicos, pesquisadores, religiosos e estudiosos da medicina natural também conectaram a sabedoria de Santa Hildegarda às práticas contemporâneas de saúde.
Um dos momentos mais aguardados foi a conferência “Os remédios universais de Santa Hildegarda”, ministrada ao vivo, da Alemanha, pelo doutor Wighard Strehlow, considerado o maior especialista mundial em medicina hildegardiana.
Ao longo dos dois dias, subiram ao palco nomes como o psiquiatra Ítalo Marsili, a pesquisadora Larissa Menegatti, a terapeuta Andressa Retchelly, o professor João Carlos Nara, e os Padres Filipe Mirapalheta e Allan Rodrigues. Eles abordaram temas como a força vital da criação, a dimensão feminina na espiritualidade e os temperamentos humanos. O evento foi encerrado com uma mesa-redonda conduzida por Letícia Hoppe e Priscila Antunes.

O FUTURO DA MEDICINA NATURAL
O próximo Congresso Internacional de Medicina Natural já está sendo preparado para 2027, com o propósito de ampliar o diálogo entre fé, ciência e natureza.
Mais informações sobre a medicina inspirada em Santa Hildegarda podem ser encontradas no perfil oficial da @farmacia.hildegardianna e nas páginas pessoais de Letícia Hoppe (@lehoppe) e Priscila Antunes (@drapriantunes).






