Em cada árvore, muitas vidas beneficiadas

Crescem em São Paulo as ações da população para o plantio de árvores. Prefeitura lançará Plano Municipal de Arborização Urbana (PMAU) no fim deste mês. Exemplo do Estado do Vaticano, que mantém a Floresta do Clima, na Hungria, mostra que é possível alcançar o equilíbrio no uso dos recursos do planeta, a casa-comum

Foto: Joca Duarte

Maior permeabilidade do solo, controle da temperatura e da umidade do ar, manutenção da biodiversidade e redução da poluição são alguns dos benefícios que as árvores proporcionam ao meio ambiente e ao ser humano. No Brasil, visando a aumentar a conscientização sobre a importância de preservá-las, é comemorado anualmente, em 21 de setembro, o Dia da Árvore.

No ano passado, 119 mil km2 de florestas foram desmatadas em todo o mundo, conforme dados da Universidade de Maryland. A preservação das árvores também está em risco nos ambientes urbanos, especialmente devido a ocupações irregulares ou construções ilegais.

Muitas, porém, são as iniciativas positivas de preservação e plantio de árvores. Em julho, por exemplo, a modelo Gisele Bündchen liderou uma campanha global para viabilizar o plantio de 40 mil árvores na Amazônia. O saldo foi além do esperado e deve resultar em 250 mil árvores plantadas.

Em Brotas (SP), referência nacional no turismo ecológico e de aventura, dados de 2016 indicam que, em dez anos, a área de vegetação da cidade cresceu mais de 500%, graças à mobilização do poder público e dos donos de propriedades rurais para o plantio de árvores em espaços depreciados ou nos quais predominava a monocultura da cana-de-açúcar. A paisagem melhorou, assim como a qualidade dos rios e a diversidade da fauna, com o retorno de espécies à região, como o lobo-guará.

Na grande metrópole

Na capital paulista, apenas em viários e calçadas, há 652 mil árvores, conforme o último levantamento da Prefeitura, feito em 2015. A partir deste dado e doMapeamento Completo da Vegetação, lançado este ano, foi elaborado o Plano Municipal de Arborização Urbana (PMAU), que será lançado no fim deste mês, nas comemorações da Semana da Árvore.

Entre outros aspectos, o PMAU, elaborado após consulta pública à população, contempla um inventário tanto quantitativo quanto qualitativo; o diagnóstico do déficit de vegetação arbórea por distrito e por subprefeitura, com ordem de prioridades de ação; a identificação das áreas e logradouros públicos que podem receber vegetação arbórea; a classificação e indicação das espécies ou conjunto de espécies mais adequadas ao plantio; a determinação de objetivos e metas de curto, médio e longo prazo para prover a cidade de cobertura arbórea; e o estabelecimento de um programa de educação ambiental à população atendida simultaneamente ao cronograma de plantio.

“No Plano de Arborização, prevê-se um conjunto de ações especificamente voltadas para regiões onde se identificou que há temperaturas mais altas, por exemplo. Analisamos que tipo de espécies temos que plantar nesses locais, para que ao longo de um determinado tempo seja possível resolver esse problema”, afirmou à reportagem Priscilla Cerqueira, diretora da Divisão de Arborização Urbana (DAU) da Secretaria do Verde e do Meio Ambiente.

Com o apoio da população

Priscilla lembra que todo morador da cidade que queira realizar o plantio de uma árvore, pode obter gratuitamente uma muda. Para tal, deve preencher um cadastro na Prefeitura, pelo telefone 156 ou em https://sp156.prefeitura.sp.gov.br.

Uma vez aprovado o pedido, a retirada da muda deve ocorrer, após agendamento prévio, nos viveiros municipais Manequinho Lopes (no Parque Ibirapuera) ou Harry Blossfeld (no Parque Cemucam), localizado em Cotia (SP).

Já para o caso de uma empresa que queira se responsabilizar pela manutenção de praças ou canteiros centrais, o pedido deve ser feito na subprefeitura em que está localizada.

“Com relação a como se fazer o plantio, existe um Manual Técnico de Arborização Urbana, que está disponível no site da Secretaria do Verde e do Meio Ambiente, com algumas explicações sobre qual o tamanho do berço [área aberta no solo onde se realiza o plantio] que deve ser feito de acordo com o tamanho da muda, qual é o local mais adequado para se plantar determinada espécie – na calçada ou no quintal de casa –, qual época do ano a árvore floresce, se ela atrai passarinho ou não”, detalha Priscilla. O Manual está disponível para download neste link: https://cutt.ly/ofPuGus.

A diretora da DAU recomenda que quem deseja plantar uma árvore em áreas públicas faça contato prévio com a subprefeitura mais próxima ou com a Secretaria. “Pode ser que já exista algum projeto previsto para determinada rua ou praça, e esse contato evitará que a árvore que alguém pretende plantar com muito carinho seja removida por causa de uma obra que vai ser feita em breve no local”, esclareceu.

Memorial para as vítimas de COVID-19

No começo de junho, a Prefeitura de São Paulo anunciou que plantará uma árvore em homenagem a cada pessoa morta por coronavírus na cidade. O chamado Memorial para as Vítimas da COVID-19 está localizado no Parque do Carmo e já foram plantadas mais de 3 mil árvores. Com a iniciativa, a Prefeitura também busca reflorestar parte da vegetação do parque, que foi afetado por dois incêndios no ano passado.

Novas Árvores por Aí

Na zona Oeste de São Paulo, o projeto Novas Árvores por Aí desenvolve trabalhos voltados ao resgate da biodiversidade na cidade. Os participantes realizam desde o plantio de árvores nas calçadas até o cultivo de pequenos bosques e também desenvolvem projetos de paisagismo, jardins de chuva, palestras e cursos.

Uma dessas atividades é o plantio das florestas de bolso, que pode ser implantado em pequenos espaços, a partir de 15m², ou também em grandes áreas, como projetos de restauração florestal na zona rural. A maioria dos plantios foi feita por meio de mutirões de voluntários, como o realizado em 2016, no parque Cândido Portinari, na Vila Hamburguesa. Na ocasião, foram plantadas 600 mudas nativas da Mata Atlântica de 90 espécies, em uma área de 700m².

Nessa modalidade de plantio, a compensação ambiental acontece por meio da criação de um microclima. Para isso, as árvores são plantadas a cada 1,5 metro de distância uma das outras. A estimativa dos organizadores é que a floresta de bolso do Parque Cândido Portinari esteja formada até 2022.

Outros detalhes sobre o projeto podem ser acessados em http://novasarvoresporai.com.br/

Plantatuapé

Em São Paulo, dos dez bairros com menor quantidade de árvores por habitante, sete ficam na zona Leste da cidade. Essa realidade chamou a atenção de Nicolas Cerrini, 28, que em 2016, ao retornar dos Estados Unidos pós-graduado em Sustentabilidade, iniciou ações de plantio de árvores no bairro do Tatuapé. A partir de 2018, a iniciativa Plantatuapé se tornou mais constante. Atualmente, acontece uma vez por mês, aos sábados ou domingos.

Voluntários do Plantatuapé realizam plantio em praça na zona Leste da cidade

“Começamos entre cinco amigos, com todo o custeio das mudas e das ferramentas por nossa conta. Quando começamos a divulgar a ação nas mídias sociais, outras pessoas se mostraram interessadas. Chegamos a realizar eventos de plantios com a participação de até 45 pessoas”, recordou Cerrini ao O SÃO PAULO.

Ainda hoje, as ferramentas e as mudas são disponibilizadas pelo Plantatuapé. “A única coisa que quem participar precisa levar é a boa vontade”, comentou o fundador da iniciativa. Em razão da pandemia de COVID-19, o número de participantes tem se restringido a 15 pessoas por plantio e há redobrados cuidados com o distanciamento social e a higienização das ferramentas.

Desde 2018, já foram plantadas mais de 200 mudas. Toda a ação é feita de acordo com o Manual Técnico de Arborização Urbana, e o grupo prioriza o plantio em canteiros e praças em que não há árvores ou nos quais poucas existem.

“A nossa ideia é plantar nos lugares conhecidos como ‘ilhas de calor’, onde há baixo índice de árvores adultas. Atualmente, o plantio está sendo feito no bairro Aricanduva, em uma praça de cerca de 60m² na rua Santo Isidoro, que, além de não ter muitas árvores, é bastante frequentada e está constantemente com sujeira e dejetos”, explicou Cerrini.

O Plantatuapé adota a técnica de floresta de bolso, que prioriza o plantio de várias espécies em poucos metros quadrados. “Quando diversas árvores são plantadas próximas, ocorre uma espécie de competição entre elas pela luz solar, recursos naturais do solo, sais minerais e pela água da chuva ou dos lençóis freáticos, o que faz com que cresçam mais rápido”, detalhou.

De acordo com Cerrini, os benefícios em médio prazo para os locais são a regularização do clima – “com diversas árvores criando sombra, a temperatura diminui e o ambiente se torna mais fresco”; a purificação do lençol freático – “por sua genética, as raízes vão à procura de água no lençol freático e acabam por filtrá-la”; e a captura de gás carbônico – “uma árvore adulta tem a possibilidade de absorver cerca de 150kg de gás carbônico por dia”.

O bom êxito da iniciativa só tem sido possível com a participação da comunidade local. “Todos os plantios que realizamos precisam de ações de manutenção, como uma rega, uma poda, um trabalho de limpeza, e não é sempre que conseguimos fazê-las. Assim, uma das coisas que combinamos com os moradores que ficam animados com essa iniciativa é que a cada 15 dias eles reguem as árvores, caso nós não consigamos”, conclui o jovem.

Todos os detalhes sobre a iniciativa podem ser consultados no Instagram – @plantatuape.

Redução das emissões de dióxido de carbono

O plantio de árvores é também uma medida eficaz para a neutralização da emissão de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera, uma vez que as árvores, pelo processo de fotossíntese, absorvem esse gás, que é um dos causadores do efeito estufa.

Foto: Joca Duarte

A redução certificada de emissões de CO2 por empresas e instituições é também conhecida como créditos de carbono. Por convenção, uma tonelada de CO2 corresponde a um crédito de carbono, e a partir dessa mensuração é possível saber quantas árvores devem ser plantadas para compensar as emissões de gases geradores de efeito estufa.

Os créditos de carbono surgiram com o Protocolo de Kyoto, acordo internacional que estabeleceu que, entre 2008 e 2012, os países desenvolvidos deveriam reduzir 5,2% (em média) das emissões de gases do efeito estufa em relação aos níveis medidos em 1990. Apesar da meta de redução ser coletiva, cada país obteve metas individuais mais altas ou mais baixas, conforme seu estágio de desenvolvimento. No ano passado, foram 37 bilhões de toneladas de CO2 emitidos no mundo todo.

Hoje já existem calculadoras digitais que permitem que uma pessoa ou família contabilize a quantidade de CO2 emitido conforme seus hábitos de vida e quantas árvores são necessárias para neutralizar essa emissão. Um exemplo pode ser visto neste link https://tinyurl.com/rf8gmd9.

Exemplo do Vaticano

Um dos primeiros países que alcançaram a neutralização da emissão de CO2 por ano foi o Estado do Vaticano, que, desde 2007, possui a Floresta do Clima, localizada no Parque Nacional de Bükk, na Hungria. A área foi reflorestada como compensação pelas emissões de dióxido de carbono que a Santa Sé lança em seu território de 0,44 km².

Vaticano mantém a Floresta do Clima no o Parque Nacional de Bükk, na Hungria

O Papa Francisco dedicou o último capítulo da encíclica Laudato si’ para destacar o compromisso do Estado do Vaticano com o meio ambiente. Entre as medidas estão a coleta seletiva de resíduos, iniciada em todos os escritórios; circuitos fechados para a água das fontes; redução progressiva de agrotóxicos; consumo de recursos energéticos (em 2008, um sistema de luz solar foi instalado no telhado da Sala Paulo VI e adotou-se novos sistemas de iluminação com economia de energia na Capela Sistina, na Praça São Pedro e na Basílica do Vaticano, que resultaram na redução de custos em 60%, 70% e 80%, respectivamente.

Na encíclica, o Pontífice também chamou a atenção para o impacto na qualidade de vida do crescimento desmedido e descontrolado de muitas cidades. “Há bairros que, embora construídos recentemente, se apresentam congestionados e desordenados, sem espaços verdes suficientes. Não é conveniente para os habitantes deste planeta viver cada vez mais submersos de cimento, asfalto, vidro e metais, privados do contato físico com a natureza”, afirmou.

Ao falar da “educação na responsabilidade ambiental”, o Papa indicou inúmeras atitudes comuns de cada cidadão, dentre as quais, o plantio de árvores.

(Com informações de Público, G1, Vatican News e Instituto Brasileiro de Florestas)

(Colaboraram: Jenniffer Silva e Flavio Rogério)

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