Em São Paulo, católicos ucranianos rezam pela paz e pedem o fim da guerra

Membros da comunidade ucraniana entoam o hino nacional da Ucrânia após missa pela paz em igreja da zona Leste de São Paulo (Foto: Luciney Martins/O SÃO PAULO)

A comunidade católica ucraniana de São Paulo se reuniu no domingo, 27, para celebrar uma missa pedindo a paz na Ucrânia após a invasão de tropas russas no país do leste europeu na última semana.

A Divina Liturgia (Eucaristia) em rito bizantino ucraniano aconteceu na igreja matriz da Paróquia Nossa Senhora Imaculada Conceição dos Católicos Ucranianos, na Vila Bela, zona Leste de São Paulo, ligada à Arquieparquia Católica Ucraniana São João Batista, com sede em Curitiba (PR). Nessa igreja, também está sediada a Paróquia Nossa Senhora da Glória, da Arquidiocese de São Paulo, que reúne os fiéis católicos de rito latino. Ambas, pastoreadas pelos sacerdotes da Ordem Basiliana de São Josafat, autorizados a celebrar nos ritos oriental e latino.

Perdão

Na liturgia bizantina, celebra-se nesta data o chamado “Domingo do Perdão”, que antecede o início da Quaresma. “Coincidência, neste domingo dedicado ao perdão, nós estarmos clamando pela paz”, enfatizou, na homilia, o Padre Estefano Elton Wonsik, Vigário Paroquial.

“Hoje, nosso coração, como ucranianos e descendentes, sofre… O único fruto da guerra é a morte. Por isso, hoje é um dia de esperança, mas também de lágrimas”, afirmou o Sacerdote, indagando se a humanidade ainda não aprendeu com os males causados pela guerra.

Padre Estefano recordou, ainda, as palavras do Papa Francisco, que afirmou que aqueles que trabalham para a guerra são “malditos e criminosos” e completou: “Os verdadeiros imitadores de Cristo não matam, ao contrário, devem dar a vida pelos outros”.

Missa em rito bizantino ucraniano (Foto: Luciney Martins/O SÃO PAULO)

Misericórdia

O Sacerdote reforçou que mesmo em meio a tamanha dor, os cristãos são chamados a conceder o perdão àqueles que agridem a sua terra de origem. “Eles precisam ainda conhecer a misericórdia de um Deus que é de paz, não de atritos, violência e morte”, manifestou o Padre ucraniano, acrescentando que “se Cristo foi capaz de deitar em uma cruz para tomar sobre si o pecado de toda a humanidade, nós somos capazes também de conceder o perdão”.

“Jesus também nos dá uma mensagem de esperança: ‘Deixo-vos a minha paz, não a que vem do mundo. Por isso, não se perturbe e nem inquiete o vosso coração. O coração do nosso salvador misericordioso, Jesus, olha hoje para o nosso pobre coração tão perturbado, inquieto, cheio de preocupações e lança a paz no nosso coração”, salientou o Sacerdote.

O celebrante concluiu a homilia com palavras de São João Paulo II, que, na mensagem para o Dia Mundial da Paz de 1997, afirmou: “O sofrimento de tantos irmãos e irmãs não pode nos deixar indiferentes! A sua dor faz apelo à nossa consciência, santuário interior onde nos encontramos face a face conosco mesmos e com Deus. E como não reconhecer que, embora em medida diversa, todos estamos envolvidos nesta revisão de vida a que Deus nos chama? Todos temos necessidade do perdão de Deus e do próximo. Por isso, todos devemos estar dispostos a perdoar e a pedir perdão”.

Único apelo

Ao tomar a palavra, o cônsul honorário da Ucrânia em São Paulo, Jorge Rybka, enfatizou o sofrimento dos ucranianos e seus descendentes que vivem no Brasil, diante de tantas mortes de civis no conflito armado em sua terra natal. “Não há nada mais a ser pedido do que a paz para todos”.

O cônsul acrescentou que o que é visto na ucrânia não se trata de uma guerra entre povos inimigos, mas motivadas por interesses que não correspondem à identidade dos povos russo e ucraniano. “Nós não estamos sendo agredidos por um povo”, afirmou Rybka, sublinhando que o povo russo também é vítima do conflito, dado que cerca de 20% da população da Ucrânia é de etnia russa e também é atingida diretamente pelos bombardeios.

De igual modo, as comunidades ucraniana e russa do Brasil têm uma fraterna relação e, por isso, sofrem com as tensões vividas em seus países. “Juntos, todas as comunidades, nacionalidades, crenças, esperamos o fim desse conflito”, afirmou o cônsul.

Jorge Rybka agradeceu as manifestações de apoio e carinho do povo brasileiro e das comunidades de outros países. No Brasil, vivem cerca de 600 mil ucranianos e seus descentes, sendo que 10 mil estão no estado de São Paulo. O cônsul também agradeceu o apoio humanitário oferecido pelos governos dos estados de São Paulo e do Paraná, onde se concentra a maior parte da colônia ucraniana no Brasil.  

(Foto: Luciney Martins/O SÃO PAULO)

Angústia por notícias

Marcelo Hrysewicz é filho de ucraniano e participou da missa com sua esposa, Manuela Hrysewicz. O Casal relatou ao O SÃO PAULO que tem tido dificuldades para contatar seus parentes na Ucrânia. “Eles estão a Oeste da Ucrânia, perto da fronteira com a Polônia, abrigados em bunkers [abrigos subterrâneos fortificados]. Fico o tempo todo atento ao celular para ver se recebo notícias”, relatou Marcelo.

Manuela acrescentou que a maior desse grupo é formada de mulheres e crianças. “Os civis têm se organizado em suas vilas e cidades para darem apoio uns aos outros”, disse, contando, ainda, que muitas dessas pessoas são interceptadas nas ruas tanto pelas forças militares ucranianas quanto as russas, o que causa mais angústia aos parentes que acompanham de longe.

Outro desafio relatado por Manuela é a “guerra da desinformação” veiculação nas redes sociais que acabam deixando a população dos dois países envolvidos no conflito confusos, além de insuflar o sentimento de ódio entre povos que sempre viveram harmoniosamente.

O contato com os parentes fica cada vez mais difícil, pois muitos ataques também têm como alvo o desabastecimento de energia e de meios de comunicação. Padre Estefano contou à reportagem que muitos paroquianos relatam que, com o passar dos dias, diminuem as possibilidades de comunicação com parentes ucranianos e isso os deixa ainda mais preocupados. “Não podemos perder a fé e a esperança. Mas vivemos dias de muita aflição”, disse.

No fim da missa, o Sacerdote rezou o ofício bizantino pelos falecidos, recordando, de modo especial, as vítimas dos conflitos. Após a liturgia, os membros da comunidade ucraniana se reuniram diante do altar da Igreja e entoaram emocionados o hino nacional da Ucrânia, manifestando o amor por seu país de origem.

(Foto: Luciney Martins/O SÃO PAULO)
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