‘Estamos vivendo uma nova página da Igreja no Chipre’, afirma Dom Bruno Varriano em visita a São Paulo

Bispo Auxiliar do Patriarcado Latino de Jerusalém presidiu missa na Catedral da Sé. Religioso franciscano, ele nasceu na capital paulista em 1971

Fotos: Luciney Martins/O SÃO PAULO

Estar na Catedral da Sé e dar testemunho da fé na cidade de São Paulo é algo que o paulistano Dom Bruno Varriano, OFM, já fez algumas vezes em seus 52 anos de vida.

Na quarta-feira, 3, porém, a subida ao presbitério da Igreja Mãe da Arquidiocese de São Paulo foi especial para o religioso da Ordem dos Frades Menores (OFM), já que pela primeira vez ele ali presidiu missa após ser nomeado Bispo Auxiliar do Patriarcado Latino de Jerusalém, em janeiro deste ano e receber a ordenação episcopal em março.

“Estar aqui é uma grande alegria. Estou um pouco emocionado. É uma celebração que toca o coração do Bispo”, disse Dom Bruno no começo da missa que ele presidiu às 12h, tendo entre os concelebrantes Dom Jorge Pierozan, Bispo eleito de Rio Grande (RS) e que até junho era Bispo Auxiliar de São Paulo, e o Padre Luiz Eduardo Baronto, Cura da Catedral da Sé.

“Estamos muito felizes por tê-lo conosco nesta celebração. Tenho certeza de que ela se reveste de um significado todo especial para o senhor e mostra, também, a grandiosidade da missão da Igreja. Imagem, meus irmãos, quantos quilômetros nos separam do Chipre. No entanto, lá está um paulista, bispo, para ser um sinal do Evangelho no meio daquele povo”, disse o Padre Baronto ao saudar Dom Bruno.

REFAZENDO RELAÇÕES

No começo da homilia, Dom Bruno fez menção a uma palavra grega que desde que chegou à ilha do Chipre tem tocado seu coração: ευχαριστώ, que significa obrigado, mas que também está no radical da palavra Eucaristia naquele idioma.

“Para dizer obrigado, o povo cipriota usa essa palavra que também é a raiz para a palavra Eucaristia. E é realmente na Eucaristia que eu digo obrigado a Deus pela vocação e pelo dom da vida; e agradeço por ter nascido em um país no qual se procura a paz, este Brasil com tantas culturas, com tanta história de povos que vieram, como é o caso da minha família, italiana, que para cá veio e preparou um coração para um chamado especial”, disse o Prelado.

O Bispo Auxiliar do Patriarcado Latino de Jerusalém pediu aos fiéis que rezem por sua missão no Chipre, uma ilha – que conforme recordou – tem importância estratégica no mar Mediterrâneo e remete às primeiras comunidades cristãs, por ser a pátria de Barnabé, o qual para lá levou São Paulo Apóstolo para que evangelizasse os gentios.

Dom Bruno recordou que há quatro séculos um bispo católico latino não vivia no Chipre, isto porque o último se desentendeu fortemente com os cristãos ortodoxos, fato que rompeu os laços fraternos durante todo este tempo.  “Quando o Papa Francisco visitou o Chipre no ano de 2021, ele decidiu que era a hora de ter novamente um bispo católico latino para somar forças ao Arcebispo Maronita”, comentou.

O Bispo recordou que foi nomeado pelo Pontífice para iniciar uma nova página da Igreja no Chipre. “Confesso que fui com medo, pois a língua grega não é fácil e até precisei melhorar o meu nível de inglês para poder falar com as pessoas. Mas há um povo maravilhoso no Chipre! Fui logo acolhido pelo Arcebispo Maronita, que me abraçou e disse: ‘Você está conosco, vamos ajudá-lo’”.

“Estamos vivendo uma nova página da Igreja no Chipre, em que o diálogo, o amor, a unidade é com o que nós nos preocupamos”, assegurou.

Dom Bruno também mencionou as obras de misericórdia que tem realizado com a ajuda de sacerdotes e religiosos, como a acolhida a pessoas vítimas de perseguição, algo que ainda que tenha iniciado com receio de retaliações continuou a fazê-lo, já que – segundo ele – não existe medo maior do que o julgamento que um dia Deus lhe fará.  “O Senhor me perguntará: tive fome, tive sede, estava com frio, era peregrino e não tinha onde morar, e o que você fez? Tenho medo do juízo dos outros, mas tenho mais medo ainda Daquele Juízo”, disse, apontando os dedos para o alto.

A FÉ E A DETERMINAÇÃO CRISTÃ DIANTE DAS PERSEGUIÇÕES

Desde 1974, a ilha do Chipre é um território marcado por divisões. No sul, há relativa tranquilidade com o Governo da República do Chipre, enquanto o norte está sob o controle de cipriotas turcos, que proclamaram a “República Turca do Norte do Chipre”.

Conforme relatórios da fundação pontifícia Ajuda à Igreja que Sofre, essa divisão resultou na fuga dos cipriotas gregos (na sua maioria cristãos ortodoxos) para o sul e dos cipriotas turcos muçulmanos que se refugiaram no norte. Esta divisão também separou as comunidades religiosas de ambos os lados, e restringiu o acesso a locais religiosos importantes, incluindo a mesquita Hala Sultan Tekke no sul e o mosteiro de São Barnabé no norte.

Ao final da missa na Catedral da Sé, Dom Bruno Varriano recordou os desafios pastorais que a Igreja encontra no norte do Chipre e a determinação com que os tem enfrentado com a força da fé.

“Aluguei um estacionamento para poder celebrar a Eucaristia em uma comunidade no norte do Chipre, pois não nos deixam usar as nossas igrejas. Elas foram transformadas em mesquitas, bares e academias… Vejam o quanto ‘nos amam’ no norte do Chipre. E aceitamos ‘esta grande demonstração de amor’ e não vamos embora. Continuamos lá. Continuaremos a levar mais religiosos, mais padres. E eu já decidi que vou dormir duas noites por semana lá no território ocupado, para que no dia que eu chamar um padre para lá ficar, ele não tenha medo”, comentou o Prelado.

Dom Bruno disse ainda que a ação pastoral no Chipre conta com amplo respaldo do Papa Francisco e do Patriarca Latino de Jerusalém, o Cardeal Pierbattista Pizzaballa.

Por fim, o Bispo pediu ao povo de Deus em São Paulo que continue a rezar “para que a Igreja no Chipre possa viver esta nova página pela qual estamos trabalhando, com a intercessão de São Barnabé e de São Paulo. E assim caminhamos para a beleza que é o anúncio do Evangelho”.

Dom Bruno Varriano foi ordenado sacerdote em 30 de agosto de 1997, na Arquidiocese de Campobasso, na Itália. Em 1999, ingressou na Custódia da Terra Santa, na Ordem dos Frades Menores. No dia 5 de outubro de 2003, professou solenemente seus votos perpétuos. Entre 2013 e 2022, foi guardião e reitor da Basílica da Anunciação, em Nazaré e antes da nomeação ao episcopado exercia o ofício de Vigário Patriarcal latino para a região pastoral do Chipre.

O Patriarcado Latino de Jerusalém tem jurisdição sobre a Palestina, Israel, Jordânia e Chipre, sendo imediatamente sujeito à Santa Sé.

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