Há 280 anos era criada a Diocese de São Paulo

Em 6 de dezembro de 1745, por meio da bula “Candor lucis aeternae”, o Papa Bento XIV criava a Diocese de São Paulo, desmembrando-a do território da Diocese de São Sebastião do Rio de Janeiro. O primeiro bispo foi Dom Bernardo Rodrigues Nogueira.

Esse marco foi fundamental para o fortalecimento da presença católica na Capitania de São Paulo, que se preparava para novos desafios em um contexto de expansão territorial e aumento populacional.

antiga catedral da se
Antiga Sé Catedral da São Paulo, no ano de 1907

A estrutura diocesana permitiu maior articulação entre as comunidades católicas e possibilitou a ampliação das atividades pastorais. Capelas e igrejas foram sendo erguidas para atender à demanda religiosa de uma população em crescimento. A organização eclesiástica teve impacto direto na formação do tecido social e cultural de São Paulo. Além dos templos, a Igreja criou espaços de acolhimento, como casas para órfãos e pobres, desempenhando um papel crucial na formação da identidade paulistana.

No dia 7 de junho de 1908, o Papa São Pio X elevou a Diocese de São Paulo a sede metropolitana, criando a província eclesiástica homônima com outras cinco dioceses, também criadas na mesma data. Até então, todo o Estado de São Paulo formava uma única diocese.

Ao todo, São Paulo teve 12 bispos e sete arcebispos – Dom Duarte Leopoldo e Silva (1907- 1938), Dom José Gaspar D’Afonseca e Silva (1939-1943), Cardeal Carlos Carmelo de Vasconcelos Motta (1944-1964), Cardeal Agnelo Rossi (1964-1970), Cardeal Paulo Evaristo Arns (1970-1998), Cardeal Cláudio Hummes (1998-2006) e, desde abril de 2007, o Cardeal Odilo Pedro Scherer.

ORDENS E CONGREGAÇÕES

A atuação dos missionários das grandes ordens e congregações religiosas foi essencial para o desenvolvimento da Igreja em São Paulo e, consequentemente, da própria cidade.

Os jesuítas, já conhecidos pelo papel na fundação da cidade, além da catequese, introduziram práticas educativas, literárias e artísticas. Seu modelo pedagógico era baseado em um ensino integral, que unia disciplinas seculares e religiosas. Essa abordagem lançou as bases para o desenvolvimento educacional da cidade. Além disso, os jesuítas foram pioneiros no estudo da fauna, flora e cultura indígena, contribuindo para o registro histórico e científico da região.

Os beneditinos chegaram à cidade em 1598, estabelecendo o Mosteiro de São Bento. Essa instituição tornou-se um dos maiores centros de espiritualidade e educação da cidade. O mosteiro não só abrigava monges, mas também oferecia ensino de qualidade, sendo um dos primeiros a introduzir aulas de música sacra e latim.

Os franciscanos vieram em 1639, dedicando-se ao trabalho com os mais necessitados. Sua atuação incluiu a criação de hospitais, albergues e cozinhas comunitárias. Além disso, os franciscanos foram fundamentais para a propagação de devoções populares, como a veneração a São Francisco, Santo Antônio e a Imaculada Conceição, que se tornaram símbolos de fé para muitas famílias paulistanas.

No final do século XIX, os scalabrinianos chegaram para atender à crescente comunidade de imigrantes italianos em São Paulo. Eles fundaram paróquias e escolas para preservar a cultura e a fé dessa população. Seu trabalho foi essencial na integração dos italianos à sociedade brasileira, criando uma ponte entre tradições europeias e o novo contexto latino-americano.

Hoje, são diversos os carismas religiosos presentes na Igreja em São Paulo que se somam aos movimentos, associações de fiéis, pastorais e demais organizações eclesiais que atuam na evangelização da cidade. 

EDUCAÇÃO E CARIDADE

Desde o período colonial, a Igreja investiu na educação como ferramenta de promoção humana. Escolas e colégios religiosos foram responsáveis por formar gerações de paulistanos, difundindo valores éticos e cristãos. Em tempos modernos, a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), fundada em 1946, tornou-se referência em ensino superior, contribuindo para debates sociais e políticos relevantes.

A Igreja em São Paulo também teve papel destacado na formação de sacerdotes, inicialmente, por meio do seminário provincial, inaugurado em 1856, no bairro da Luz, e que, em 1934, foi transferido para o Ipiranga, formando presbíteros para a Arquidiocese e outros estados brasileiros. 

Na área da caridade social, a Igreja mantém uma atuação constante por meio de pastorais e instituições que dão testemunho da caridade de forma organizada nas mais variadas frentes. A Arquidiocese de São Paulo foi pioneira na criação de movimentos e organizações que defendem e promovem a dignidade humana, sobretudo nos contextos de violação de direitos fundamentais, como no período do regime militar.

SANTOS E BEATOS

São Paulo também é uma cidade marcada pela presença de santos e beatos que viveram ou tiveram ligação com a cidade. Além de São José de Anchieta, destaca-se Santo Antônio de Sant’Ana Galvão (1739-1822), canonizado em 2007, que é o primeiro santo brasileiro. Ele viveu em São Paulo no século XVIII, dedicando-se à vida religiosa e ao cuidado pastoral. Frei Galvão foi um dos fundadores do Mosteiro da Luz, no qual atualmente vivem as religiosas Concepcionistas.

Santa Paulina do Coração Agonizante de Jesus (1865-1942) é outro exemplo de grande importância para a Igreja em São Paulo. Ela fundou a Congregação das Irmanzinhas da Imaculada Conceição, uma ordem religiosa dedicada à educação e à caridade. Santa Paulina representa o espírito missionário da Igreja, buscando sempre atender às necessidades dos mais vulneráveis em uma cidade em rápido crescimento.

De particular relevância para São Paulo é a Beata Assunta Marchetti (1871-1948), cofundadora das Irmãs Missionárias de São Carlos Borromeo (Scalabrinianas), que dedicou sua vida ao cuidado dos migrantes, órfãos e enfermos na cidade.

Outro destaque é o Beato Mariano de la Mata (1905-1983), sacerdote agostiniano espanhol radicado no Brasil, que se dedicou à educação e ao cuidado dos enfermos. Ele viveu boa parte de sua vida em São Paulo, deixando um legado de compaixão e serviço abnegado.

Foto: Luciney Martins

DEUS HABITA ESTA CIDADE

Durante sua história, a Igreja particular de São Paulo passou por enormes transformações, que também estão relacionadas às mudanças sociais, demográficas, econômicas, culturais e religiosas. De Igreja “interiorana”, ela precisou confrontar-se com o surgimento rápido da metrópole e com todos os desafios daí decorrentes. E não é diferente hoje, dado que ela procura ser “testemunha de Jesus Cristo” na complexidade da grande cidade.

Em 1989, a Arquidiocese sofreu uma significativa reestruturação, quando foram criadas quatro novas dioceses: Campo Limpo, Osasco, Santo Amaro e São Miguel Paulista. Essa divisão territorial buscou facilitar o atendimento pastoral e a presença da Igreja em áreas mais distantes do centro.

Dessas circunscrições, São Paulo, São Miguel Paulista e Santo Amaro correspondem aos limites da capital. Já Campo Limpo e Osasco também possuem outros municípios em seu território. Dos 12,33 milhões de habitantes da cidade (IBGE-2020), cerca de 80% são católicos, somando as cinco dioceses. Ao todo, vivem e atuam na capital cerca de 1,5 mil padres, entre diocesanos e religiosos. Já o número de religiosas consagradas passa de 2,3 mil.

A influência da Igreja Católica em São Paulo transcende o campo espiritual, permeando a cultura, a política e as ações sociais. Desde a fundação até os dias atuais, a Igreja moldou a identidade paulistana, reafirmando-se como uma força indispensável no desenvolvimento da maior metrópole brasileira.

1º SÍNODO ARQUIDIOCESANO

Entre 2017 e 2023 foi realizado o 1º sínodo arquidiocesano, caminho de comunhão, conversão e renovação missionária. Desde o seu término, tem entrado vigor os instrumentos referentes à sua renovação pastoral e administrativa da Arquidiocese: criação de 24 decanatos, promulgação de novos diretórios para a Pastoral dos Sacramentos e da Formação Presbiteral, além das Normas Administrativas e Financeiras da Arquidiocese.

(Texto produzido a partir de reportagem do jornalista Fernando Geronazzo em 22 de janeiro de 2025)

280 ANOS DE BISPADO DE SÃO PAULO

Cardeal Odilo Pedro Scherer
ARCEBISPO METROPOLITANO DE SÃO PAULO


Durante o período colonial, até 1745, São Paulo, o Sul do Brasil inteiro, Minas Gerais, Mato Grosso e Goiás, do ponto de vista eclesiástico, foram dependentes, primeiramente, do bispado de São Salvador da Bahia; em seguida, a partir de 1676, do bispado de São Sebastião do Rio de Janeiro. Até a proclamação da República (1889), havia bem poucas dioceses no Brasil.

No início do século XVIII, houve um movimento em São Paulo, pedindo ao rei de Portugal que se erigisse uma sede de diocese em São Paulo, uma vez que o bispo do Rio de Janeiro não dava conta de promover a evangelização e de assistir a população do vasto território de sua diocese. 

Foi somente em 22 de abril de 1745 que Dom João V, rei de Portugal, assinou o decreto para a criação da diocese de São Paulo. De fato, pelo regime do Padroado, cabia ao rei de Portugal zelar pelas necessidades da Igreja na colônia do Brasil, inclusive mediante a criação de dioceses e paróquias. Poucos meses mais tarde, em 6 de dezembro de 1745, o Papa Bento XIV promulgou a Bula Pontifícia Candor Lucis Aeternae (O Esplendor da Luz Eterna), mediante a qual sancionava a criação da diocese de São Paulo, como havia proposto o rei de Portugal. A nova diocese era integralmente desmembrada da diocese do Rio de Janeiro e abrangia um vasto território correspondente aos atuais estados de São Paulo e Paraná, ao Sul de Minas Gerais e ao Sul do Mato Grosso.

Com a mesma Bula, o Papa acolhia ainda outras propostas para a organização da estrutura eclesiástica no Brasil, criando a diocese de Mariana, abrangendo a maior parte do atual estado de Minas Gerais, e as prelazias de Goiás e de Cuiabá, abrangendo os estados atuais de Goiás e o centro-norte de Mato Grosso. As prelazias de Goiás e de Cuiabá, juntamente com São Paulo e Mariana, foram as primeiras sedes episcopais do Brasil erigidas mais para o interior do Brasil, fora da região costeira. Apresentava-se, assim, a possibilidade de uma presença mais efetiva da Igreja junto das populações do vasto interior do Brasil.

A Bula também determinava a instalação das catedrais nas respectivas dioceses recém-criadas: a de São Paulo e a de Mariana, com o título da Assunção de Nossa Senhora. É interessante observar que o dogma da Assunção de Nossa Senhora só seria proclamado dois séculos mais tarde, no ano santo de 1950. O título e a devoção a Nossa Senhora elevada ao céu já estavam presentes na Igreja muito tempo antes.

O primeiro bispo de São Paulo foi Dom Bernardo Rodrigues Nogueira, proveniente de Portugal, onde tinha sido professor de Direito Canônico e Teologia e Vigário Geral da sede primacial de Braga. Vindo ao Brasil, deteve-se por meses no Rio de Janeiro, de onde tomou posse de São Paulo por meio de um procurador; em seguida, ainda do Rio de Janeiro, já começou a tratar dos interesses da nova diocese, aonde chegou um ano após a sua criação e foi recebido com festa. Dom Bernardo trabalhou intensamente para a organização da nova diocese, vindo a falecer em 7 de novembro de 1748.

Desde a sua criação, a diocese de São Paulo teve 19 bispos, sendo arcebispos os últimos sete. Em 8 de junho de 1908, a diocese de São Paulo foi elevada em sede de província eclesiástica, tornando-se arquidiocese. Em 2025, lembramos os 280 anos de criação da diocese de São Paulo, que já consolidou uma rica história de presença e atuação evangelizadora e pastoral no meio da população. Esta ocasião nos estimula a recordar e divulgar essa história, para que seja conhecida por quem vive o momento presente. Temos um passado e não somos os primeiros a trabalhar por esta Igreja particular. Muitos nos precederam no caminho da fé e na missão da Igreja, exercida em circunstâncias certamente muito diversas das atuais. Conhecer a nossa história pode ser inspirador para darmos a nossa contribuição para a edificação dessa história.

Por divina Providência, este também é um Ano Jubilar para a Igreja, voltado especialmente à ação de graças a Deus pelos benefícios recebidos, à conversão a Deus, para acolher a sua misericórdia infinita e para renovar os propósitos bons e as disposições para seguir em frente no bom caminho. Às grandes intenções do Ano Jubilar, podemos unir nossas intenções particulares na comemoração dos 280 anos de história da diocese de São Paulo.
Ainda mais: este Ano Jubilar traz como tema a esperança: “Somos peregrinos de esperança”, de uma esperança que “não decepciona” (Rm 5,5). A Igreja é peregrina de esperança, testemunha da esperança grande e firme, que tem seu fundamento em Deus. Seja este um ano para a renovação da esperança e do ânimo cristão e missionário em nossa Arquidiocese.

TEXTO PUBLICADO NO O SÃO PAULO – 22/01/2025

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