Há 90 anos, Nossa Senhora do Carmo intercede pela Bela Vista

Fundado em 1934, o templo carmelita, elevado à dignidade de Basílica Menor em 1950, é um ‘pedaço do céu’ em um dos bairros mais tradicionais de São Paulo

A Igreja Nossa Senhora do Carmo, na Bela Vista, inaugurada em 1934, foi elevada à dignidade de basílica menor em 1950 e hoje atrai devotos marianos de diferentes partes do Brasil
Luciney Martins/O SÃO PAULO

Um dos ícones históricos e culturais de São Paulo, a Igreja Nossa Senhora do Carmo, na Bela Vista, completou 90 anos de história em julho. Inaugurado em abril de 1934, o templo foi elevado à dignidade de basílica menor pelo Papa Pio XII, por decreto, em 8 de dezembro de 1950.

As celebrações pelo jubileu começaram em 6 de julho e se estenderam até o dia 16, memória litúrgica da padroeira, quando aconteceram 16 missas, uma delas presidida por Dom Rogério Augusto das Neves, Bispo Auxiliar da Arquidiocese na Região Sé, seguida de uma procissão pelas ruas do bairro. Pessoas de diversas partes do estado de São Paulo foram até o templo para homenagear a “Senhora de Marrom”, como a chamam carinhosamente alguns de seus devotos.

Por força da lei estadual nº 17.959, promulgada em 1º de julho deste ano, o Dia de Nossa Senhora do Carmo, celebrado em 16 de julho, está no Calendário Oficial do Estado de São Paulo.

“Os paulistas têm por Nossa Senhora do Carmo grande devoção, demonstrada pelos templos a ela erigidos, pelas festas tradicionais e por elegê-la como sua padroeira. E por essas manifestações de fé, entendo que sua inclusão no Calendário Oficial do Estado de São Paulo representa a vontade de milhares de nossos concidadãos em seu louvor”, justificou o deputado estadual Rogério Santos, autor do projeto que levou à promulgação da lei.

Pascom Paroquial

SUBINDO O MONTE CARMELO

A história da Província Carmelitana Fluminense, que hoje abrange os estados do Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, Bahia, Tocantins e Rio Grande do Sul, além do Distrito Federal, se entrelaça com a do próprio Brasil. Em 1580, chegaram ao País, junto com a coroa portuguesa, quatro religiosos carmelitas liderados pelo Frei Bernardo Pimentel, O. Carm. Pouco tempo depois, começaram as fundações dos conventos, sendo o de São Paulo o quarto, inaugurado em 1594 na região da Sé.

O imóvel ocupado pelos frades carmelitas foi desapropriado em 1926, tornando-se necessário encontrar um novo endereço. “A Igreja do Carmo acabou indo para o bairro da Bela Vista, onde antes havia uma chácara de flores. A palavra carmelo quer dizer ‘jardim de flores’, ou seja, vemos isso como um sinal de que a devoção não perderia sua originalidade”, afirmou o Frei Ivanildo Justino, que está redigindo seu trabalho de conclusão do curso para a graduação em Teologia justamente sobre os 90 anos da Igreja Nossa Senhora do Carmo.

Outra semelhança significativa é que o local onde está a atual basílica é a parte mais alta da região, assim como o Carmelo está situado na parte alta de Israel. “Entrar na Basílica é como subir ao Monte Carmelo para se encontrar com Deus”, diz Frei Thiago Borges, Reitor.

Frei Ivanildo detalha como se deu a ida dos carmelitas para o novo endereço em 1928: “Era o dia 15 de abril. Depois da missa, às 15h, houve uma procissão apoteótica. Os jornais da época publicaram esse marco em que a imagem da Virgem saía pela última vez pelos umbrais da porta do Carmelo, e a bênção da pedra fundamental na nova igreja”; o templo seria inaugurado somente em 1934.

“Além da imagem da Virgem, tudo que estava na antiga igreja foi transladado para a nova: bancos, altares, afrescos e objetos. Os frades da época entenderam que tudo que havia na igreja era fruto do suor e da generosidade do povo que tinha feito as doações. Não deixaram nada para trás, a fim de honrar esse carinho com o sagrado”, prossegue Frei Ivanildo.

DEGRAUS PARA O CÉU

Os degraus que separam a rua das portas da igreja representam um itinerário espiritual para alguns fiéis. A subida não apenas leva a um nível geograficamente mais elevado, mas também provoca uma elevação para um ambiente celeste, segundo Maria Tereza, que trabalha na região e regularmente faz suas preces na Basílica durante o horário de almoço.

“Não sei se é o silêncio e a penumbra, mas me sinto entrando no céu quando passo por esta porta. No meio de São Paulo, um lugar assim é um milagre”, diz a devota.

Frei Thiago explica que a sensação de chegar ao Paraíso é provocada pela própria arquitetura da igreja. “Uma das pinturas do teto mostra a mesma escada da frente da igreja, e ela vai até o céu. É uma continuidade espiritual que os fiéis sentem quando entram aqui”. Além dessa pintura, muitas outras formam uma verdadeira “árvore genealógica” do Carmelo, começando pelo profeta Elias e passando por grandes santos carmelitas, como Santa Teresa d’Ávila, São João da Cruz e Santa Teresinha do Menino Jesus.

“Todos os dias, quando entro na igreja, eu me lembro de quantos pedidos já fiz aqui e quantas graças alcancei”, diz Maria Luzia Raz Santana, paroquiana há mais de 20 anos, e que já acompanhou naquele mesmo presbitério a consagração de seu filho à Ordem Terceira do Carmo e o casamento de sua filha. “Desde que comecei a frequentar a Basílica, me sinto familiarizada com Maria. Ela, de fato, vive no meio de nós e abençoa sempre a todos”.

FÉ PARA SUPERAR AS ADVERSIDADES

Com a igreja instalada em uma parte de São Paulo marcada pela miséria e o abandono, os frades perceberam a necessidade de auxiliar o povo de Deus, oferecendo-lhes também o necessário para o corpo. Por meio dos Vicentinos, são distribuídas cestas básicas a famílias carentes, e pela Oficina de Santa Rita, há a doação de enxovais para mulheres grávidas em situação de vulnerabilidade.

“A ajuda social também estimula a fraternidade, pois vejo o outro como um irmão que caminha comigo”, diz Frei Thiago, indicando, porém, que “nossa maior contribuição para o povo em necessidade é proporcionar a experiência com Deus, com sua Palavra, com a Vir- gem e com os sacramentos. É apenas por meio dessa experiência que as pessoas alcançam uma fé capaz de superar todas as dificuldades”.

REFRÃO DO HINO JUBILAR DA BASÍLICA

Da excelsa Rainha dos Céus,
os louvores queremos entoar,
neste monte da Bela Vista,
as grandes glórias de Maria proclamar.
Oh! Salve! Salve! Senhora do Carmelo,
doce estrela suave do Mar.
És a Mãe dos Carmelitas,
da Bela Vista rainha singular

(Letra e música: Frei Ivanildo Justino, O. Carm – SP).

O ESCAPULÁRIO

Muitas pessoas conhecem a espiritualidade carmelita por meio do escapulário, um sacramental formado por dois pedaços de tecido marrons ligados por um cordão. Um deles exibe a imagem de Nossa Senhora do Carmo e o outro mostra o Sagrado Coração de Jesus ou o emblema da Ordem do Carmo.

“O escapulário não é um acessório ou amuleto; é um presente de Nossa Senhora, um sinal de proteção da Mãe do Céu para seus filhos. Revestindo o escapulário, nós nos revestimos de Cristo para amar como Ele amou”, explica Frei Thiago.

Para saber mais sobre o tema, leia o artigo “Nossa Senhora do Carmo: uma devoção mariana relacionada ao Antigo Testamento”, publicado no site do O SÃO PAULO.

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José Ricardo Moro
José Ricardo Moro
28 dias atrás

Qual a data da Dedicação (Consagração) da Basílica e qual Bispo que presidiu?