O debate sobre as mudanças climáticas ultrapassa o campo científico e político: tornou-se também uma questão ética, espiritual e civilizatória. Tanto o Acordo de Paris (2015) quanto a Doutrina Social da Igreja oferecem marcos convergentes para a construção de um novo paradigma de responsabilidade ambiental. Enquanto o Acordo propõe um pacto internacional pela limitação do aquecimento global, a Igreja Católica convoca os fiéis e toda a humanidade a uma conversão ecológica – uma mudança profunda de mentalidade e de estilo de vida; e de políticas públicas mais justas.
O Compêndio da Doutrina Social da Igreja apresenta uma reflexão ética sobre a criação e a responsabilidade humana diante da natureza. Ainda que anterior ao Acordo de Paris e à encíclica Laudato si’, o documento já delineava uma autêntica teologia da ecologia.
O Compêndio recorda que o mundo criado é dom de Deus confiado ao ser humano como guardião e administrador. A destruição ambiental é vista como sinal de uma crise moral, resultado de uma visão utilitarista e consumista da natureza (nº 462). O texto enfatiza ainda que o meio ambiente é um bem comum universal, que deve ser preservado em nome da justiça entre gerações (nº 466).
Assim, a Doutrina Social da Igreja entende o cuidado com o clima não apenas como dever ecológico, mas como ato de amor ao próximo, sobretudo aos pobres e às futuras gerações, que sofrem mais intensamente os efeitos da degradação ambiental. Essa visão une ecologia e ética social, propondo uma “conversão ecológica” pessoal e comunitária (nº 488-491).
O Acordo de Paris, aprovado na COP21, é um tratado internacional voltado à mitigação das mudanças climáticas, com metas globais para limitar o aquecimento a 1,5°C. Mais do que um pacto técnico, ele expressa um compromisso ético global: o reconhecimento de que o planeta é uma casa comum e que a humanidade partilha uma responsabilidade solidária sobre o clima.
Esse princípio encontra correspondência direta com o ensinamento do Compêndio e da Igreja. Assim como o tratado, o pensamento social cristão reconhece que o problema climático decorre de um modelo de desenvolvimento insustentável, baseado no consumo excessivo e na desigualdade.
Ambos os discursos propõem, portanto, um novo paradigma – de cooperação internacional, justiça social e cuidado compartilhado.
Em 2015, o Papa Francisco publicou a encíclica Laudato si’ – sobre o cuidado da casa comum, que aprofunda e atualiza os princípios do Compêndio à luz da crise climática contemporânea. A encíclica reconhece explicitamente os impactos das mudanças climáticas causadas pela ação humana, e convoca a uma “ecologia integral”, que une meio ambiente, economia, cultura e espiritualidade.
Francisco reforça que “tudo está interligado” (nº 91) e que a degradação ambiental e a pobreza têm a mesma raiz moral: a indiferença e a ganância. A encíclica, portanto, complementa o Compêndio ao propor uma ética global do cuidado, em sintonia com os objetivos do Acordo de Paris. Ambos os documentos – um religioso e outro político – defendem que o futuro do planeta depende de solidariedade, justiça e conversão dos estilos de vida…
O diálogo entre o Compêndio da Doutrina Social da Igreja, a Laudato si’ e o Acordo de Paris revela uma profunda convergência: todos reconhecem que a crise climática é também uma crise moral e espiritual. Enquanto o Acordo estabelece metas concretas de redução de emissões, a Doutrina Social indica o fundamento ético e espiritual dessas metas – a necessidade de uma nova relação entre humanidade e criação.
O cuidado com o clima, portanto, não é apenas uma questão técnica, mas expressão de fé, justiça e amor. A sociedade civil, todos nós, portanto, inspirados por esses princípios, somos chamados a tornar-nos protagonistas da conversão ecológica e da construção de um mundo sustentável, solidário e em paz.






