Obra sacra em igreja de São Paulo ressalta a fé e as raízes católicas da história do Brasil

Painel do artista Cláudio Pastro foi restaurado na Paróquia Nossa Senhora da Esperança, na Diocese de Santo Amaro 

Romolo Picoli Ronchetti

Na Paróquia Nossa Senhora da Esperança, na Diocese de Santo Amaro, zona Sul de São Paulo, a história de fé e arte se renovou com a restauração de um importante mural do renomado artista sacro Cláudio Pastro. Criada nos anos 1990, a obra, símbolo do legado cultural e religioso da comunidade, ganhou vida nova graças a uma doação anônima e ao esforço conjunto de uma equipe multidisciplinar formada pela arquiteta e restauradora Silvana Borges, o artista sacro Romolo Picoli Ronchetti, o monge beneditino Dom Marcelo Molinero e a doutoranda em Teologia Christiane Meier. O projeto, além de preservar a memória de um dos maiores artistas brasileiros do gênero, reflete o compromisso da comunidade com a proteção de seu patrimônio histórico, cultural e religioso. 

FÉ E HISTÓRIA 

O painel une iconografia cristã e referências históricas brasileiras. A obra foi concebida durante uma reforma do espaço litúrgico, na década de 1990, liderada pelo Padre Samuel Pereira Viana, então Pároco, que buscava transformar o local, até então uma quadra de esportes adaptada, em uma igreja digna do culto e da beleza litúrgica. 

“A busca por Cláudio Pastro ocorreu porque ele era a principal referência em arte sacra no Brasil, alguém que prezava pelo belo e entendia a função evangelizadora da liturgia”, explicou Padre Samuel, mestre em Teologia Sistemática pela Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma e presbítero da Diocese de Santo Amaro. 

O painel restaurado de Cláudio Pastro é uma rica expressão do simbolismo cristão. No centro da obra, Cristo Pantocrator, descrito como o “sol nascente que nos veio visitar”, aparece envolto por um sol, cujos raios representam a universalidade de sua realeza. Elementos como as sete estrelas, as lâmpadas e a árvore da vida reforçam a conexão com a simbologia bíblica e referências históricas, como as figuras de Frei Henrique de Coimbra e Pedro Álvares Cabral, que evocam a celebração da primeira missa no Brasil, entrelaçando espiritualidade e história em uma única composição. 

A preservação de obras como a de Cláudio Pastro vai muito além da questão estética; é um compromisso com a memória cultural e a formação de um olhar mais atento ao belo. Essas criações não apenas embelezam os espaços sagrados, como também carregam a história e a espiritualidade de uma comunidade, sendo instrumentos de conexão entre o passado e o presente. 

“Preservar sua obra não é apenas manter viva a memória do artista, mas também daqueles que contribuíram para embelezar nossas igrejas. Ele é um dos maiores nomes da arte sacra brasileira, reconhecido mundialmente. Como ele dizia, gosto se educa, e nosso povo precisa dessa educação para o belo”, destacou Padre Samuel. 

ARTE E PARCERIA 

Romolo Picoli Ronchetti, artista sacro, destacou ao O SÃO PAULO, que ao saber da reforma, buscou meios para viabilizar a restauração da obra. “Com a reforma, o mural sofreu com respingos de tinta acrílica, escorrimentos e resíduos de massa, comprometendo sua integridade”, recordou. 

A restauração foi realizada com isolamento técnico e sensibilidade artística. “O processo envolveu limpeza mecânica a seco e química, seguido da aplicação de uma solução consolidante para restaurar a saturação das cores. Também fizemos a reintegração cromática em áreas em que a tinta havia se desprendida”, explicou Romolo. Concluído em cinco dias, o trabalho foi entregue à comunidade no dia 15 de novembro, devolvendo ao espaço litúrgico a profundidade espiritual e a maestria artística do mural. 

“O painel centraliza Cristo como o Senhor da História e Luz dos Povos, destacando o encontro do Evangelho ladeado pelos povos originários do Brasil. A visão histórica e litúrgica é uma característica presente nas obras de Pastro”, mencionou o artista sacro. 

O vitral, projetado por Pastro, foi recuperado com a ajuda da empresa D’Falco, especializada em vitrais. A peça foi removida, limpa, estruturada e protegida com vidro especial, garantindo sua durabilidade e segurança. 

PRESERVAR O PATRIMÔNIO RELIGIOSO 

Preservar a arte religiosa é uma forma de manter viva a história e a identidade cultural do Brasil. Essa é a visão da arquiteta e conservadora-restauradora Silvana Borges, que desempenhou papel fundamental na restauração do painel de Cláudio Pastro. Para ela, o patrimônio religioso não é apenas uma expressão de fé, mas também um reflexo profundo da cultura e da memória coletiva do país. 

“Lidar com o patrimônio religioso é preservar a nossa história. Trinta por cento de todos os bens tombados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) pertencem à Igreja Católica. E, mesmo quando não se trata de bens tombados, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) recomenda a conservação dessas obras como patrimônio cultural”, explica Silvana, destacando a importância de iniciativas que garantam a longevidade dessas criações, independentemente de sua classificação formal. 

“Restaurar a obra nesta Paróquia foi um trabalho em equipe que reforça a importância da preservação do patrimônio sacro e da arte sacra no interior das igrejas”, destacou a arquiteta. O esforço conjunto teve como objetivo não apenas recuperar a obra de Cláudio Pastro, mas também garantir que o belo continue a servir como instrumento para a celebração do mistério da fé, unindo arte, espiritualidade e a comunidade reunida em torno do altar. 

PARA CONHECER A OBRA: 

Paróquia Nossa Senhora da Esperança 
Rua Nossa Senhora de Nazaré, 101 
Cidade Dutra – São Paulo – SP 

 

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