Marcado pelo convite à preparação para acolher o Deus que vem, o advento é momento de peregrinação interior e oração
Restam poucos dias para o término do ano litúrgico e a Igreja se prepara para viver uma das etapas litúrgicas mais aguardadas pela grande maioria dos fiéis: o tempo do Advento.
A palavra advento é originária do latim, adventus. No vocabulário pagão, significa “acontecimento” e se referia à ascensão do imperador ao trono. No linguajar eclesiástico-litúrgico, porém, significa “vinda ou chegada”. Esta se refere a Jesus, o Filho de Deus, o esperado desde sempre. Aquele que veio ao mundo para salvá-lo e cujo nascimento é recordado a cada ano, no dia do Natal.
SIGNIFICADO
Não é possível precisar a história e o significado primitivo do Advento, porém é necessário distinguir elementos que dizem respeito a práticas ascéticas e outras de caráter estritamente litúrgico: um Advento que é a preparação para o Natal, a primeira vinda de Jesus à humanidade, como uma criança indefesa; e um Advento que celebra a vinda gloriosa de Cristo, no fim dos tempos, também chamado de Advento escatológico.
“Por este duplo motivo é que o tempo do Advento se apresenta como um período de piedosa e alegre expectativa, um tempo de oração e meditação, diferente do tempo quaresmal, que se caracteriza pela penitência”, explica o Padre Helmo Cesar Faccioli, Assistente Eclesiástico para a Liturgia na Arquidiocese de São Paulo.
HISTÓRIA
A celebração do Advento é própria do Ocidente. Já no fim do século IV, na Espanha e na Gália (território que ocupava a França atual, além da Bélgica, Suíça e partes da Alemanha e da Itália), havia um período preparatório para o Natal, durante seis semanas (como a duração atual do Advento na liturgia ambrosiana).
No fim do século VII, em Roma, havia registros de um Advento litúrgico de cinco domingos, proveniente da Gália, de Ravena ou da Itália meridional. De caráter a recordar a parusia do Senhor, o seu conteúdo original se baseava no texto de Mt 24,27: “Assim será a vinda do Filho do Homem”. Os domingos que antecediam o Natal seriam destinados a fechar o ano litúrgico e recordar a conclusão do mistério salvífico de Cristo.
“Foi entre os séculos XII e XIII, em Roma, com o missal de São Pio V, que se definiram, liturgicamente como se conhece hoje, as quatro semanas que antecedem o Natal como uma ampla reflexão que prepara os fiéis para a vinda do Senhor”, complementa Padre Helmo.
TEXTOS BÍBLICOS
Os textos propostos pela liturgia para as celebrações eucarísticas durante o Advento são permeados por uma vasta riqueza de significados.
Embora haja algumas mudanças em virtude dos ciclos litúrgicos que dividem os anos em A, B e C, as leituras bíblicas utilizadas nas missas dominicais do Advento propõem, em primeiro lugar, um anúncio profético, geralmente extraído do livro do profeta Isaías; em seguida, um ensinamento apostólico de caráter moral, retirado das cartas do Apóstolo Paulo; e, por fim, uma narrativa do Evangelho.
A cada domingo do Advento, o conteúdo das leituras focaliza um tema específico: no primeiro, a vigilância na espera de Cristo; no segundo, o convite à conversão, baseado na pregação de João Batista; no terceiro, o testemunho dado pelo precursor de Jesus; e, no quarto, o anúncio do nascimento de Jesus a José e Maria.
O duplo caráter do Advento, que celebra tanto a espera do Salvador na glória quanto a sua vinda na carne, também emerge nos textos das Sagradas Escrituras: o primeiro domingo aponta para a parusia final; o segundo e o terceiro destacam a vinda cotidiana do Senhor; e o quarto, por sua vez, prepara os fiéis para o nascimento de Cristo, ao mesmo tempo em que faz dele a teologia e a história.
PRINCIPAIS FIGURAS
Na liturgia do Advento, destacamse algumas figuras bíblicas que conferem um acento especial a este tempo litúrgico:
Isaías: no livro deste profeta, encontra-se um eco da grande esperança que confortou o povo eleito durante os séculos difíceis e decisivos de sua história, sobretudo durante o exílio. A segunda parte de sua obra contém um alegre anúncio de libertação e da criação da nova Jerusalém, constituindo uma mensagem constante de esperança para os homens de todos os tempos.
João Batista: como o último dos profetas, sua pessoa resume toda a história precedente e confirma o seu cumprimento. Sinal da intervenção de Deus em favor de seu povo, como precursor do Messias, tem a missão de preparar os caminhos do Senhor, oferecer a Israel o conhecimento da salvação, que consiste na remissão dos seus pecados, e, sobretudo, indicar Cristo já presente no meio do seu povo.
Nossa Senhora: destaca-se a relação de Maria e sua cooperação com o mistério da redenção da humanidade, atrelando-a à vinda do Senhor e lembrando que nela culmina toda a esperança messiânica de todo o povo do Antigo Testamento. Recorda-se, também, sua divina maternidade e ressalta-se o seu papel como aquela que une o Salvador ao gênero humano.
São José: embora retratado com o atributo de humilde, sua importância é evidente ao assumir o papel de esposo de Maria e pai adotivo de Jesus. Em decorrência de sua fé, são atribuídas a ele as seguintes palavras no texto evangélico: homem justo (cf. Mt 1,19). José é o elo que, por meio de Davi, de quem descende, une Cristo à grande promessa, isto é, Abraão. Por ser legalmente filho de José, Jesus pode reivindicar para si o título messiânico de “filho de Davi”, o que confere a seu pai terreno um lugar no mistério da encarnação do Verbo.
LITURGIA
Segundo o Padre Helmo, o tempo do Advento não dispensa a ascese, porém não se trata de um tempo marcadamente penitencial, embora a liturgia prescreva a moderação na ornamentação da igreja e no uso dos instrumentos musicais. Ele recorda que não se canta o “Glória”, a não ser em alguma solenidade, como a da Imaculada Conceição, no dia 8 de dezembro, no Brasil, ou Nossa Senhora de Guadalupe, no México, no dia 12 de dezembro, por exemplo. O “Glória” fica, portanto, reservado para o anúncio alegre da natividade de Jesus na Vigília do Natal e, depois, é retomado nas demais celebrações.
“Durante aquele tempo litúrgico, diz-se o “Aleluia”, pois a alegria está permeada no mistério do Advento. A alegria, como dimensão escatológica, e como dimensão da manifestação do filho de Deus à humanidade”, instrui o Sacerdote.
A cor litúrgica do tempo do Advento é o roxo, porém, segundo o liturgista, na Europa, ao contrário do Brasil, há uma distinção na tonalidade dessa cor em relação à utilizada na Quaresma, que é mais escura na preparação para a Páscoa, a fim de se acentuar o caráter penitencial.
“Para o Advento, é conveniente o uso de uma tonalidade mais clara, pois este tempo se reveste de um convite à ascese, à peregrinação interior e à oração, um tempo de aguardar a vinda luminosa de Cristo, luz dos povos”, conclui o Padre.