Em vigília ecumênica, Papa diz que o silêncio é ‘essencial’ e orienta a vida do cristão e da Igreja

Vatican Media

Diferentes, mas unidos, juntos, em oração, representantes de comunidades cristãs de todo o mundo rezaram na Praça São Pedro, no sábado, 30 de setembro, em uma vigília ecumênica convocada pelo Papa Francisco para dar o tom da 16ª Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos. Além dos 18 mil peregrinos presentes, participaram do encontro “Together” (“Juntos”, em inglês) o Patriarca Ecumênico Bartolomeu, líder da Igreja greco-ortodoxa, e o Arcebispo de Cantuária, Justin Welby, principal clérigo da Igreja Anglicana – entre outros.

Eles vieram a Roma como sinal de unidade da Igreja universal, aquela fundada por Jesus Cristo sobre os apóstolos, que se reúne também hoje para pedir ao Espírito Santo que oriente o caminho e, em especial, ilumine os trabalhos do Sínodo da Igreja Católica, que está em andamento.

O Papa Francisco comentou que a vigília foi um encontro da “comunidade cristã que se originou no dia de Pentecostes”. Todos chamados “à mesma esperança”, apesar de suas diferenças culturais, nacionais, linguísticas, pois todos foram batizados pelo mesmo Espírito.

Como anunciaram na oração de conclusão da vigília, pronunciada pelos líderes cristãos simultaneamente: “Espírito Santo, sopro de Pentecostes, envia-nos para anunciar Cristo e para acolher nas nossas comunidades aqueles que ainda não O conhecem. Desce, rezamos, sobre os participantes no Sínodo e sobre todos os presentes, enchendo-os da Tua sabedoria e coragem para que sejam servos da comunhão e testemunhas ousadas do Teu perdão no mundo de hoje.”

A vigília de oração antes da assembleia sinodal foi organizada pela comunidade ecumênica francesa de Taizé – famosa pelos cantos que entoa, e que envolvem todos os que ouvem, e os convidam a cantar. São melodias simples, mas envolventes, que se repetem de forma suave e eloquente, chamam à introspecção, à reflexão e à sintonia com os tons e acordes. Na Praça, ressoavam por toda a parte. Sons que eram interrompidos por momentos de profundo silêncio.

Com efeito, a vigília previu oito minutos de silêncio, entre cantos e intercessões, e o silêncio foi, justamente, o tema da meditação do Papa Francisco. “O silêncio é essencial na vida daquele que crê”, disse o Pontífice. “Deus não ama as proclamações e as exclamações, as fofocas e os rugidos”, afirmou. Deus prefere, pelo contrário, “o sussurro de uma brisa leve” (1 Reis 19,12). Silêncio a ser vivido também na vida da Igreja, completou Francisco, em que “o Espírito Santo harmoniza pontos de vista, porque Ele é harmonia”.

No “caminhar juntos” dos cristãos – expressão que vem do grego synhodos – é preciso “aprender novamente a fazer silêncio”, argumentou o Papa, “para escutar a voz do Pai, acham a da de Jesus e o grito do Espírito”. O Sínodo é um local de fraternidade e para purificar a Igreja “das fofocas, das ideologias e das polarizações”, comentou.

ASSEMBLEIA DO SÍNODO COMEÇA COM RETIRO ESPIRITUAL

Os mais de 460 participantes da assembleia sinodal, no Vaticano, participaram de um retiro iniciado em 30 de setembro e concluÍdo na terça-feira, 3. A ideia do Papa Francisco era marcar o início desta etapa do caminho sinodal com a vigília ecumênica na Praça de São Pedro e, em seguida, uma reflexão partilhada sobre o processo que está para começar.

As orações do retiro, realizado em Sacrofano, nos arredores de Roma, foram guiadas pela Madre Maria Ignazia Angelini, OSB, e as meditações pelo Padre Timothy Peter Joseph Radcliffe, OP. Ambos são reconhecidos mundialmente por estudos e escritos teológicos e espirituais. Em todos os dias, houve uma oração da manhã, duas meditações sobre a vida da Igreja e o Padre presidiu a Santa Missa.

Beleza tão antiga e tão nova

“Meus irmãos e irmãs, podemos estar divididos entre esperanças diferentes [nesta assembleia sinodal], mas se ouvimos o Senhor e uns aos outros, buscando entender sua vontade para a Igreja e para o mundo, estaremos unidos em uma esperança que transcende nossos desacordos, e seremos tocados por aquele que Santo Agostinho chamou ‘a beleza tão antiga e tão nova’”, disse o Padre Radcliffe em sua primeira reflexão.

“Viemos para este Sínodo com esperanças conflituosas, mas isso não precisa ser um obstáculo insuperável. Estamos unidos na esperança da Eucaristia, uma esperança que abraça e transcende tudo o que desejamos”, continuou no segundo encontro. Em seus discursos, ele citou diferentes temas tocados pela consulta sinodal realizada até aqui.

Os diferentes entendimentos do que a Igreja deveria ser ou poderia se tornar, disse ele, são algo normal e esperado em um encontro como este, mas faz desta reunião um verdadeiro sínodo é a “identidade cristã”.

“Nossas vidas são nutridas por amadas tradições e devoções. Sem elas, estamos perdidos, de luto. Mas também temos que lembrar todos aqueles que não se sentem em casa na Igreja”, observou. “Temos que fazer uma jornada rumo a uma Igreja em que eles não estejam mais às margens, mas no centro.”

Rezar pela unidade, em ‘coração e mente’

“Estamos reunidos neste Sínodo porque também nós estamos divididos e esperamos e rezamos pela unidade do coração e da mente”, disse o Padre Radcliffe na terceira meditação. “Este deve ser o nosso precioso testemunho num mundo dilacerado por conflitos e desigualdades. O Corpo de Cristo deve encarnar a paz que Jesus prometeu e pela qual o mundo anseia.” Essa união provém da crença no Reino de Deus, dentro do qual há muitas “moradas” (João 14,1), comentou.

Mas como ouvir juntos à voz do Senhor? “Este Sínodo será frutuoso se nos levar a uma amizade mais profunda com o Senhor e uns com os outros”, disse o sacerdote dominicano. Ao chamar as pessoas de “amigos”, Cristo estabeleceu uma relação conosco. “Pregamos o Evangelho por meio de amizades que ultrapassam as fronteiras. Deus atravessou a divisão entre o Criador e a criatura. Que amizades impossíveis podemos fazer?”

O caminho sinodal, portanto, passa por “ser verdadeiros sobre nossas dúvidas e questões, uns com os outros, as questões para as quais não temos respostas claras”, e buscar juntos as respostas. “A amizade floresce quando nos atrevemos a partilhar as nossas dúvidas e a procurar a verdade juntos. Qual é o sentido de falar com pessoas que já sabem tudo ou com quem estamos completamente de acordo?”, afirmou.

Trata-se de fazer amizades. A amizade é um esforço criativo, definiu ele, não acontece naturalmente. Citando C. S. Lewis, disse que “os amantes olham um para o outro, mas os amigos olham na mesma direção: podem discordar um do outro, mas pelo menos partilham algumas das mesmas questões.”

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