Gratidão e compromisso de rezar pelo bem da Igreja

Vatican Media

Nos últimos dias de seu pontificado, em fevereiro de 2013, Bento XVI agradeceu o carinho recebido e enfatizou razões para a renúncia.

“Queridos amigos! Deus guia sua Igreja, ele a conserva sempre, e especialmente nos tempos difíceis. Não percamos nunca essa visão da fé, que é a única visão verdadeira do caminho da Igreja e do mundo. Que viva sempre em nossos corações, no coração de cada um de vocês, a certeza jubilosa de que o Senhor está perto, que Ele não nos abandona, que está perto de nós e nos envolve em seu amor. Obrigado!”. 

Essas palavras finais de Bento XVI, diante de milhares de pessoas na Praça de São Pedro, em sua última audiência pública como Papa, em 27 de fevereiro de 2013, sintetizam a gratidão aos fiéis e clérigos e a confiança em Cristo, que o agora Papa emérito externou desde 11 de fevereiro, quando, em latim, durante consistório com os cardeais no Vaticano, anunciou que deixaria o exercício do ministério de Pedro. 

“No mundo de hoje, sujeito a mudanças tão rápidas e abalado por questões de profunda relevância para a vida da fé, para governar a barca de São Pedro e proclamar o Evangelho, é necessário tanto força da mente quanto do corpo, o que, nos últimos meses, se deteriorou em mim numa extensão em que eu tenho de reconhecer minha incapacidade de adequadamente cumprir o ministério a mim confiado”, explicou durante o consistório daquele dia 11.

Na Catequese do dia 13, Bento XVI voltou a afirmar que renunciaria ao pontificado pelo bem da Igreja e enfatizou que “a Igreja é de Cristo, o qual nunca fará faltar a sua guia e o seu cuidado”. 

No mesmo dia, na missa da Quarta-feira de Cinzas, salientou que o verdadeiro discípulo de Jesus não serve a si mesmo ou ao público, mas ao Senhor, na simplicidade e na generosidade, e indicou que cada fiel deve testemunhar a fé e a vida cristã para manifestar a face da Igreja.

Bento XVI também sinalizou para a importância de a Igreja se renovar. Em encontro com os padres de Roma, no dia 14 de fevereiro daquele ano, disse que todos precisam “trabalhar para que se realize verdadeiramente o Concílio Vaticano II e se renove a Igreja” e na oração do Ângelus, no dia 17, afirmou que a Igreja convoca todos os seus membros a se renovar. 

Na audiência pública de 27 de fevereiro, ressaltou que o Evangelho é a força da Igreja, que em seus quase oito anos de pontificado “assistiu a momentos de alegria e luz, mas também a momentos difíceis”, mas que sempre soube que Deus a conduz, e falou sobre a natureza da Igreja: “não uma organização, não uma associação para finalidades religiosas ou humanitárias, mas um organismo vivo, uma comunidade de irmãos e irmãs no corpo de Jesus Cristo, que nos une a todos. Vivenciar a Igreja dessa maneira e ser quase capaz de tocar com as mãos o poder de sua verdade e seu amor é uma fonte de alegria, em um tempo em que muitos falam do declínio dela”. 

Em seu último dia de pontificado, em 28 de fevereiro, antes de deixar o Vaticano, Bento XVI agradeceu aos cardeais e prometeu estar unido a eles em oração. E já como Papa emérito, na residência apostólica de Castel Gandolfo, sintetizou como serviria a Igreja a partir de então: “Sou simplesmente um peregrino que inicia a última etapa de sua peregrinação nesta terra. Mas gostaria ainda com o meu coração, com o meu amor, com a minha oração, com a minha reflexão, com todas as minhas forças interiores, de trabalhar em prol do bem comum e do bem da Igreja e da humanidade”.

“O Senhor me chama para ‘subir o monte’, para me dedicar ainda mais à oração e à meditação. Mas isso não significa abandonar a Igreja, pelo contrário, se Deus me pede isso é para que eu a possa continuar servindo com a mesma dedicação e o mesmo amor com o qual fiz até hoje, mas de um modo mais adequado à minha idade e às minhas forças”, disse na oração do Ângelus, de 24 de fevereiro. 

‘Aula de eclesiologia’ e ‘gesto corajoso’: o que disseram os cardeais brasileiros sobre a renúncia de Bento XVI

A edição do O SÃO PAULO de 5 de março de 2013 trouxe as repercussões dos cardeais brasileiros sobre a renúncia do Papa Bento XVI ao pontificado, ocorrida em 28 de fevereiro daquele ano.

O Cardeal Raymundo Damasceno Assis, então Arcebispo de Aparecida (SP), ressaltou que o gesto de renunciar foi “um exemplo de humildade, simplicidade e de coragem”, especialmente de coragem, “sentindo que suas forças estão debilitadas. A renúncia foi um gesto corajoso!”.

Dom Raymundo enalteceu Bento XVI como grande teólogo e pensador, que não se furtou a dialogar com a cultura e ciência. “Ele contribuiu para que a vida humana fosse defendida e valorizada em toda a sua preciosidade, como dom de Deus ao homem. Além disso, o Papa cobrou dos governos de todos os países um trabalho de superação da pobreza e de acesso à justiça, especialmente para os mais pobres. Ele também se manifestou muito em relação ao meio ambiente”.

Também o Cardeal Geraldo Majella Agnelo lembrou que o Papa Bento XVI foi alguém que transmitiu uma catequese muito forte sobre a Palavra de Deus, era um homem de oração e preocupado com as questões sociais. “Nós nos acostumamos a receber dele uma catequese muito forte sobre a Palavra de Deus. Ele sempre nos ajudava a interpretá-la e a tirar consequências para a nossa vida cristã”, comentou.

Na mesma edição, o Cardeal Odilo Pedro Scherer, Arcebispo Metropolitano de São Paulo, comentou que Bento XVI “deixa um legado importante para a Igreja e será certamente recordado na história da Igreja como um dos grandes papas teólogos; tanto pelo que escreveu e falou quando já era Sumo Pontífice quanto pelo que escreveu antes disso. Será recordado também pelo seu esforço em ajudar a Igreja a voltar-se para a essência de sua fé e de sua missão. Mostram isso suas encíclicas sobre a esperança e a caridade, as exortações apostólicas sobre a Eucaristia e a Palavra de Deus. E será recordado, também, por ter estimulado o clero a buscar a autenticidade na vivência de sua vocação e toda a Igreja, na revalorização de sua fé e no esforço renovado para transmiti-la aos outros”.

O Arcebispo Metropolitano observou, ainda, que aquela renúncia ao pontificado “é um gesto que ajudará a Igreja a voltar-se mais para o essencial de sua vida e missão, a partir de um renovado encontro com sua própria razão de ser e existir; um professor de teologia, em Roma, observou: a renúncia foi sua última aula de eclesiologia”.

Na mesma edição, foi reproduzida a íntegra da mensagem do Cardeal Scherer, datada de 13 de fevereiro de 2013, em que ele se dirige ao Papa Bento XVI, falando por si e em nome do clero, dos religiosos, demais consagrados e dos leigos da Arquidiocese.

“Vossa Santidade nos deu um grande exemplo de humildade e coragem e, ao mesmo tempo, de fé e generosidade, ao colocar em evidência que o bem e a missão da Igreja devem ocupar o primeiro lugar nas preocupações de todos aqueles que são chamados e constituídos no serviço do Rebanho do Senhor. Ao entregar a Santa Igreja ‘aos cuidados do seu Supremo Pastor, Nosso Senhor Jesus Cristo’, Vossa Santidade indicou qual é a verdadeira natureza do ministério do Papa, dos Bispos e de todos os Sacerdotes, colocados a serviço da Igreja: somos todos servidores do Povo de Deus em nome de Jesus Cristo e por encargo seu. É ele o verdadeiro e único Senhor e Pastor da Igreja, que cuida dela e quer o seu bem mais do que ninguém outro!”.

Na mesma mensagem, o Arcebispo de São Paulo manifestou ao Papa sua “mais sincera compreensão, respeito e admiração pelo gesto humilde, corajoso e generoso de Vossa Santidade e pelo ensinamento de fé que nos deixa, no serviço a Jesus Cristo e à Igreja. Não devemos estar apegados a cargos e posições, quando está em jogo o bem maior da Igreja, à qual servimos”.

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