Papa aos católicos da Terra Santa: que ninguém roube a esperança de nossos corações

Através de uma carta, Francisco expressa proximidade, afeto, gratidão, encorajamento e a esperança de que em breve será possível “ressuscitar” com o Senhor, dirigindo-se aos fiéis de todos os ritos e confissões que se preparam para celebrar a Páscoa “nos lugares onde o Senhor viveu, morreu e ressuscitou”, e onde hoje as pessoas estão “sofrendo dolorosamente o drama absurdo da guerra”.

Vatican Media

“Tenho pensado em vocês há algum tempo e rezo por vocês todos os dias. Mas agora, às vésperas desta Páscoa, que para vocês representa tanto a Paixão e ainda mais a Ressurreição, sinto a necessidade de escrever-lhes para dizer que os trago em meu coração.”

Assim escreve Francisco em uma carta aos católicos de toda a Terra Santa em vista da Páscoa. O Papa exprime sua proximidade aos fiéis e seu “afeto como um pai”, especialmente entre aqueles que, nesses meses, “estão sofrendo mais dolorosamente o drama absurdo da guerra” e experimentam sentimentos de “angústia e perplexidade”.

Esperar contra toda esperança

O Santo Padre recorda que a Páscoa é ainda mais significativa para os fiéis que a celebram nos lugares onde o Senhor viveu, morreu e ressuscitou: “não apenas a história, mas nem mesmo a geografia da salvação existiriam sem a Terra que vocês habitam há séculos, onde desejam permanecer e onde é bom que permaneçam”. 

“Obrigado pelo vosso testemunho de fé, obrigado pela caridade entre vocês, obrigado por saberem esperar contra toda esperança.”

Uma terra dilacerada pelo conflito

O Papa recorda a viagem que fez em 2014 à Jordânia, Palestina e Israel, e faz suas as palavras de São Paulo VI, o primeiro Pontífice a peregrinar à Terra Santa, há 50 anos, quando enfatizou o perigo da continuação das tensões no Oriente Médio para a paz no mundo inteiro. 

Em sua mensagem, Francisco afirma que a Terra Santa não é apenas “guardiã dos Lugares de Salvação”, mas uma testemunha constante, “através de seus próprios sofrimentos” da Paixão do Senhor e, ao mesmo tempo, “com sua capacidade de se levantar e seguir em frente, anunciou e continua a anunciar que o Crucificado ressuscitou”. O Pontífice enfatiza:

“Nestes tempos sombrios, quando a escuridão da Sexta-feira Santa parece cobrir vossa terra e muitas partes do mundo desfiguradas pela loucura fútil da guerra, que é sempre e para todos uma derrota sangrenta, vocês são tochas acesas na noite; vocês são sementes do bem em uma terra dilacerada pelo conflito.”

Que ninguém roube a nossa esperança 

Francisco renova sua oração dirigindo-se diretamente ao Senhor, e com uma súplica intercede pelos povos da Terra Santa: 

“Senhor, Vós que sois a nossa paz (cf. Ef 2,14-22), Vós que proclamastes que bem-aventurados são os pacificadores (cf. Mt 5,9), livrai o coração humano do ódio, da violência e da vingança. Nós olhamos para Ti e Te seguimos, porque perdoas, porque és manso e humilde de coração (cf. Mt 11,29). Fazei com que ninguém roube de nossos corações a esperança de nos levantarmos e ressuscitarmos convosco, fazei com que não nos cansemos de afirmar a dignidade de todo homem, sem distinção de religião, etnia ou nacionalidade, começando pelos mais frágeis: mulheres, idosos, crianças e pobres”.

Vocês não estão sozinhos

Por fim, o Papa renova seu convite “a todos os cristãos do mundo inteiro” para que apoiem concretamente e rezem insistentemente “para que toda a população de sua querida Terra possa finalmente estar em paz”.

Que o ouro da unidade cresça e brilhe no cadinho do sofrimento, também com os irmãos e irmãs das outras confissões cristãs, aos quais também desejo manifestar minha proximidade espiritual e expressar meu encorajamento. Trago todos vocês em minhas orações.”

“Eu os abençoo e invoco sobre vocês a proteção da Santíssima Virgem Maria, filha dessa terra. Renovo meu convite a todos os cristãos do mundo para que sintam seu apoio concreto e rezem incansavelmente, para que toda a população de sua querida Terra possa finalmente estar em paz”, conclui Francisco.

Confira a carta na íntegra

Amados irmãos e irmãs!

Há muito tempo que vos trago no pensamento, rezando por vós todos os dias. Mas agora, nas vésperas desta Páscoa que para vós sabe muito de Paixão e ainda pouco de Ressurreição, sinto necessidade de vos escrever para dizer que vos trago no coração. Sinto-me próximo de todos vós, nos vossos variados ritos, amados fiéis católicos espalhados por todo o território da Terra Santa, mas de modo particular daqueles que, nestes momentos, estão a sofrer mais dolorosamente o drama absurdo da guerra; sinto-me próximo das crianças a quem é negado um futuro, de quantos choram e sofrem, de todos aqueles que sentem angústia e desânimo.

A Páscoa, coração da nossa fé, é ainda mais significativa para vós que a celebrais nos Lugares onde o Senhor viveu, morreu e ressuscitou: nem a história, nem mesmo a geografia da salvação existiriam sem a Terra que há séculos habitais e onde quereis permanecer e será bom que o possais fazer. Obrigado pelo vosso testemunho de fé, obrigado pela caridade que frutifica entre vós, obrigado por saberdes esperar contra toda a esperança.

Desejo que cada um de vós possa sentir o meu afeto de pai, que conhece os vossos sofrimentos e canseiras, nomeadamente os destes últimos meses. E juntamente com o meu afeto, possais sentir o de todos os católicos do mundo! Como Bom Samaritano, o Senhor Jesus, nossa Vida, derrame sobre as vossas feridas do corpo e da alma o óleo da consolação e o vinho da esperança.

Ao pensar em vós, vem-me à memória a peregrinação que fiz convosco há dez anos; e faço minhas as palavras que há cinquenta anos São Paulo VI, o primeiro Sucessor de Pedro peregrino na Terra Santa, dirigiu a todos os crentes: «O prolongar-se do estado de tensão no Médio Oriente, sem que se realizem passos decisivos para a paz, constitui um grave e constante perigo, que ameaça não só a tranquilidade e a segurança daquelas populações – e a paz do mundo inteiro –, mas também certos valores que são sumamente caros, por diferentes motivos, a grande parte da humanidade» (Exort. ap. Nobis in animo).

Amados irmãos e irmãs, a comunidade cristã da Terra Santa não se limitou a ser, ao longo dos séculos, guardiã dos Lugares da salvação, mas testemunhou constantemente, através das próprias tribulações, o mistério da Paixão do Senhor. E, com a sua capacidade de se erguer e avançar, anunciou, e continua a anunciar, que o Crucificado ressuscitou; com os sinais da Paixão, apareceu aos discípulos e subiu ao Céu, levando para o Pai a nossa humanidade atormentada mas redimida. Nestes tempos sombrios, em que as trevas da Sexta-Feira Santa parecem cobrir a vossa Terra e demasiadas partes do mundo desfiguradas pela loucura inútil da guerra, que é sempre e para todos uma sanguinosa derrota, vós sois tochas acesas na noite; sois sementes de bem numa terra dilacerada por conflitos.

Rezo por vós e convosco: «Senhor, Vós que sois a nossa paz (cf. Ef 2, 14-22), Vós que proclamastes bem-aventurados os obreiros da paz (cf. Mt 5, 9), libertai o coração do homem do ódio, da violência e da vingança. Nós Vos seguimos com os olhos postos em Vós que perdoais e sois manso e humilde de coração (cf. Mt 11, 29). Não deixeis que ninguém nos roube do coração a esperança de nos levantar e ressurgir convosco, fazei que não nos cansemos de afirmar a dignidade de todo o homem, sem distinção de religião, etnia ou nacionalidade, a começar pelos mais frágeis: as mulheres, os idosos, os pequeninos e os pobres».

Irmãos, irmãs, quero dizer-vos: Não estais só, nem vos deixaremos sozinhos; permaneceremos solidários convosco através da oração e da caridade operosa, esperando poder voltar em breve, peregrino, até junto de vós, para vos ver e abraçar, partir o pão da fraternidade e contemplar aqueles rebentos de esperança que brotaram das sementes por vós espalhadas no sofrimento e cultivadas com paciência.

Sei que os vossos Pastores, os religiosos e as religiosas estão unidos a vós: de coração lhes agradeço por tudo o que fizeram, e continuam a fazer. Cresça e brilhe, no cadinho do sofrimento, o ouro da unidade com os irmãos e as irmãs das outras Confissões cristãs, a quem desejo também manifestar solidariedade espiritual e exprimir o meu encorajamento. A todos recordo na oração.

Abençoo-vos e sobre vós invoco a proteção da Bem-Aventurada Virgem Maria, filha da vossa Terra. A todos os cristãos do mundo, renovo o convite a fazer-vos sentir o seu apoio concreto e rezar incansavelmente para que a população inteira da vossa querida Terra possa finalmente estar em paz.

Fraternamente,

Roma, São João de Latrão, Semana Santa de 2024.

FRANCISCO

Fonte: Vatican News

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