Documento-síntese do Sínodo lista muitas problemáticas a aprofundar, mas também lança luz sobre oportunidades e convergências
Fruto de um trabalho realizado em “clima de escuta recíproca e de diálogo sincero” durante um mês de reuniões no Vaticano, a síntese da 16ª Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos foi publicada em 28 de outubro como resultado parcial do Sínodo sobre a Sinodalidade. Após consultas nas igrejas locais que duraram dois anos, mais de 360 representantes vieram a Roma para discutir e propor percursos de renovação da vida eclesial.
A assembleia continua sendo um encontro entre bispos, mas dessa vez incluiu leigos, pessoas consagradas, sacerdotes e diáconos. As sessões, entretanto, não se propuseram a dar respostas a questões polêmicas, mas a expor temas importantes para a Igreja de hoje e, na medida do possível, identificar consensos. Em um processo de escuta, uns aos outros e, juntos, ao Espírito Santo, eles partiram do princípio de que o estilo sinodal é essencial para seguir em frente.
A síntese, que pode ser lida no site do O SÃO PAULO, já prepara a próxima assembleia, a ser realizada em outubro de 2024. “Neste relatório de síntese, recolhemos os principais elementos emersos do diálogo, da oração e do confronto que caracterizam estes dias”, dizem os autores do texto.
“Descobrimos, de fato, que caminhar juntos como batizados, na diversidade dos carismas, das vocações, dos ministérios, é importante não só para as nossas comunidades, mas também para o mundo”, afirmam. Dividido em três partes, o relatório aborda, em todo o seu corpo, convergências, questões a enfrentar e propostas para diversos temas. A seguir, alguns destaques do documento.
IGREJA COMO POVO DE DEUS
Como pano de fundo do documento está a noção de que a Igreja é “mistério e povo de Deus, chamado à santidade”, conforme o Concílio Vaticano II. Isso quer dizer que todos os membros da Igreja, por meio do Batismo, são iguais em dignidade, ainda que na vida e trajetória de cada pessoa o chamado possa se expressar diferentemente. Esse conceito, diz o relatório, “valoriza a contribuição de todos os batizados, na variedade de suas vocações, com uma melhor compreensão e prática do Evangelho”.
Um dos principais frutos do Sínodo, afirma-se no relatório, foi reforçar nas pessoas a “crescente consciência de nossa identidade como povo fiel de Deus, dentro do qual cada um é portador de uma dignidade derivante do Batismo e chamado à corresponsabilidade pela missão comum de evangelização”. Para que isso seja vivido plenamente, é preciso construir uma Igreja que seja “casa e família de Deus”, mais próxima das pessoas, especialmente as que mais sofrem, “menos burocrática e mais relacional”.
ATENÇÃO AOS QUE ESTÃO ‘FORA’
Centrados na Palavra de Deus e na Eucaristia, diz o texto, é possível acolher na Igreja membros de todas as “tribos, línguas, povos e nações” (Ap 7,9). São conceitos que a assembleia pede para aprofundar, do ponto de vista teológico e espiritual, humano e social, partindo da Tradição da Igreja. É preciso reconhecer e cultivar “a sensibilidade pela riqueza da variedade das expressões de ser Igreja”, reforçar os caminhos de iniciação na fé e acolher a todos.
Isso envolve, ainda, segundo o relatório, ter uma Igreja atenta aos pobres, isto é, os que são vítimas de “muitas formas de pobreza material”, e os excluídos da sociedade e das estruturas eclesiais. Também quem vive na vulnerabilidade e no sofrimento – como os migrantes, idosos, pessoas solitárias, exploradas, vítimas de abusos, vítimas da guerra e de catástrofes ambientais. É preciso nutrir “os mesmos sentimentos de Cristo Jesus” (Fil 2,5), diz o texto. O Sínodo recomenda maior difusão dos ensinamentos da Doutrina Social da Igreja.
Também destaca que as comunidades cristãs devem escutar e acompanhar os mais afastados da Igreja. “De diferentes maneiras, as pessoas que se sentem marginalizadas ou excluídas da Igreja por causa de sua situação conjugal, identidade e sexualidade também pedem para serem ouvidas e acompanhadas, e que sua dignidade seja defendida”, diz o texto. “Na Assembleia, percebeu-se um profundo sentimento de amor, misericórdia e compaixão pelas pessoas que são ou se sentem feridas ou negligenciadas pela Igreja, que desejam um lugar para voltar ‘para casa’ e onde possam se sentir seguras, ser ouvidas e respeitadas, sem medo de ser julgadas. Ouvir é um pré-requisito para caminharmos juntos em busca da vontade de Deus. A assembleia reafirma que os cristãos não podem desrespeitar a dignidade de nenhuma pessoa.”
UNIDADE NOS MINISTÉRIOS
Muito se falou sobre a participação dos fiéis na vida da Igreja e as diferentes formas de viver uma plena reciprocidade por meio dos vários ministérios. Alguns deles são ministérios formais, como o ministério ordenado (bispos, padres e diáconos) ou os ministérios instituídos (leitor, acólito, catequista). Outros são ministérios mais informais, mas não menos importantes, e que se expressam dentro e fora da Liturgia: a caridade aos pobres, a formação, o cuidado aos enfermos, por exemplo.
Na promoção da plena comunhão de todos os cristãos, a 16ª assembleia recomenda conhecer melhor a identidade e missão das igrejas orientais e de outras confissões cristãs em um “diálogo participado”. Diz o texto que “não pode haver sinodalidade sem a dimensão ecumênica.” Também se refletiu muito sobre o papel do bispo como pastor do povo de Deus a ele confiado, e sobre a interação, em uma Igreja cada vez mais participativa e sinodal, entre os bispos locais e destes com o bispo de Roma, o Papa, sucessor de Pedro.
Além disso, partindo do princípio de que “a Igreja é missão” e que “todo cristão é uma missão neste mundo”, a assembleia reforça que “a família é a coluna que sustenta toda comunidade cristã”. A família é “comunidade de vida e de amor, um lugar privilegiado de educação à fé e à prática cristã, que necessita de um particular acompanhamento dentro das comunidades”. Os homens e mulheres leigos “contribuem de modo vital para realizar a missão em todos os ambientes e nas situações mais comuns de cada dia”, diz.
Nesse sentido, a assembleia se mostra especialmente atenta a duas categorias essenciais: os jovens e as mulheres. “As igrejas de todo o mundo formularam claramente o pedido de maior reconhecimento e valorização da contribuição das mulheres e de um aumento das responsabilidades pastorais confiadas a elas em todas as áreas da vida e da missão da Igreja. Para dar melhor expressão aos carismas de todos e responder melhor às necessidades pastorais, como a Igreja pode incluir mais mulheres nas funções e ministérios existentes? Se forem necessários novos ministérios, em que nível e de que forma?”, diz o texto.
Entre os espaços típicos dos leigos, entre eles os jovens, o relatório menciona o ambiente digital, o mundo do trabalho, as culturas jovens, a economia e a política, a pesquisa científica, a educação e a formação, além das iniciativas para “o cuidado da casa comum” e a participação da vida pública em geral. Onde estiverem presentes, os cristãos leigos “são chamados a testemunhar Jesus Cristo na vida cotidiana e a partilhar explicitamente a fé com os outros”, descreve.