Acolher a dor do irmão salva vidas

São registrados cerca de 12 mil suicídios todos os anos no Brasil

Reprodução

O mês de setembro é dedicado à prevenção ao suicídio. De acordo com um relatório divulgado em 2019 pela Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 800 mil pessoas tiram a própria vida todos os anos no mundo, o que equivale a uma morte a cada 40 segundos.

Segundo a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), são registrados cerca de 12 mil suicídios todos os anos no Brasil, sendo a terceira maior causa de morte de adolescentes e jovens na faixa dos 13 aos 29 anos no País. De acordo com a entidade, 96,8% das pessoas que cometem suicídio têm um transtorno mental diagnosticável.

FENÔMENO COMPLEXO

“Quando se fala de suicídio, normalmente vêm à tona perguntas como: ‘Por que ele fez isso?’; ‘O que estava tão ruim na vida dele que o motivou a tomar esta decisão?’; ‘Como não pudemos perceber que ele estava sofrendo tanto?’; ‘Mas tudo parecia tão bom na vida dele…’. Essas dúvidas surgem porque, na visão leiga, comportamentos suicidas são compreendidos como um fenômeno motivado apenas pelo ambiente e por questões socioculturais”, destaca a médica psiquiatra Doris Hupfeld Moreno, coordenadora do Ambulatório Integrado de Bipolares (AIBIP) do Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP, e uma das autoras de um dossiê sobre o suicídio publicado em 2019 pelo Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp).

O psicólogo norte-americano Edwin Schneidman, um dos principais especialistas em suicídio e criador de um centro de prevenção nos Estados Unidos, afirma que a pessoa que fala ou pensa em suicídio não quer, de fato, pôr fim à sua vida, mas acabar com a sua dor.

Por isso, a busca de profissionais de saúde mental (psiquiatras e psicoterapeutas) e serviços públicos como o Centro de Atenção Psicossocial (Caps), por exemplo, tem um papel fundamental no combate a esse mal. Segundo o Ministério da Saúde, nos municípios onde existe o Caps, o índice de suicídios é reduzido em 14%.

NA FAMÍLIA

Padre Licio Araújo Vale, sacerdote da Diocese de São Miguel Paulista e membro da Associação Brasileira de Estudos e Prevenção ao Suicídio, é autor do livro “Mente suicida – Respostas aos porquês silenciados”, que acaba de ser lançado pela Paulinas Editora.

O Sacerdote ressaltou que o suicídio é um assunto considerado tabu, mas precisa ser abordado nas famílias, escolas e igrejas. Ele insiste no papel fundamental das famílias na prevenção ao suicídio, sobretudo na educação das crianças para aprenderem a lidar com as dores e frustrações da vida. “A vida é cheia de alegrias e satisfações, mas também é repleta de dores. Se perdermos a capacidade de educar os filhos para esses limites, na primeira grande frustração na adolescência, associada ao impulso próprio dessa fase da vida, podem pensar na possibilidade do suicídio”, frisou o Padre, lembrando o elevado índice de suicídios nessa faixa etária.

A FÉ

Ainda segundo a OMS, em um estudo intitulado “Prevenir o suicídio – um imperativo global”, entre os principais elementos que ajudam na prevenção a suicídios estão o cultivo de relações pessoais sólidas, um estilo de vida e de enfrentamento positivo das situações cotidianas e o cultivo de uma crença religiosa ou espiritual.

“Participar de uma comunidade de fé reforça os laços afetivos e sociais. No nosso caso, como cristãos, o hábito de rezar diariamente, de meditar a Palavra de Deus, de alimentar uma relação com Deus, ajuda a pessoa a encontrar um sentido sobrenatural para a vida e, con- sequentemente, aprender a lidar com a dor”, salientou Padre Licio.

Por outro lado, lidar com a dor não significa negar sua existência ou su- bestimá-la. “A pessoa que sofre preci- sa ser ouvida e se sentir acolhida, por menor que seja a causa daquilo que a faz sofrer. É por isso que a campanha Setembro Amarelo tem como lema ‘Falar é a melhor solução’”, reforçou o Sacerdote, sublinhando que “a dor não expressa perdura até que a pessoa não a suporte mais”.

Nesse sentido, serviços de escuta, como o Centro de Valorização da Vida (CVV), e, no âmbito eclesial, as pastorais da escuta e da acolhida, são essenciais na prevenção ao suicídio. Além disso, Padre Licio reforçou a missão importante dos sacerdotes, por meio da direção espiritual e da Confissão, oferecendo escuta, aconselhamento e sendo mediadores entre aqueles que sofrem e a misericórdia de Deus, sem prescindir, claro, do encaminhamento ao devido acompanhamento profissional, sempre que necessário.

LEIA TAMBÉM:
O que diz a Doutrina da Igreja sobre o suicídio?

ALGUNS SINAIS DE COMPORTAMENTO SUICIDA

⚠ Mudanças marcantes de comportamento ou hábitos

⚠ Preocupação com sua própria morte ou falta de esperança

⚠ Isolamento social

⚠ Interesse por sites e/ou redes sociais sobre suicídio

⚠ Automutilação e/ou práticas autodestrutivas

⚠ Na adolescência: comportamentos típicos dessa fase, como agressividade, irritabilidade e impulsividade podem camuflar um quadro depressivo

⚠ Em idosos: diminuição ou ausência de cuidados com o corpo, isolamento social e doenças crônicas

(Fontes: Núcleo de Estudo e Prevenção do Suicídio e Ministério da Saúde)

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