Diante da maior disponibilidade de recursos no fim de ano, famílias devem planejar finanças para que não lhes faltem recursos para os gastos dos primeiros meses de 2022
O pagamento do 13º salário a 83 milhões de brasileiros que atuam no mercado formal de trabalho ou que são aposentados e pensionistas deve injetar na economia do Brasil cerca de R$ 232,6 milhões, conforme projeções do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).
O valor médio a ser recebido é de R$ 2.539, dinheiro que ajudará a movimentar diferentes setores nesta época de compras para as festas de Natal e do Réveillon, e de viagens no começo da temporada de verão. As famílias, no entanto, devem planejar bem o uso desse dinheiro a mais, para que não aumentem seus endividamentos e tenham recursos para saldar os compromissos do começo de ano, como o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) e o Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA).
A reportagem do O SÃO PAULO conversou com a economista Cristiane Mancini, mestra em Economia pela PUC-SP sobre a gestão financeira nesta época do ano. Veja a seguir algumas dicas:
PRIORIZE PAGAR AS DÍVIDAS
O primeiro destino a ser dado para o valor do 13º salário é o pagamento das dívidas. Cristiane lembra que, ao saudá -las, se evitará mais juros e multas. “Ao não pagar um imposto, uma conta, uma parcela, pagamos no próximo mês juros ou multas. Por exemplo: se há um boleto para pagar uma geladeira este mês e não se paga, para o próximo mês terá que pagar essa parcela mais um valor adicional. Essa geladeira sairá muito mais cara. O mesmo ocorre com a parcela de um imóvel, de um automóvel.”
CUIDADO COM O ‘POUPEI O ANO TODO, AGORA POSSO’
Cristiane recomenda que quem poupou dinheiro ao longo de todo o ano não deve achar que agora é a hora de gastá-lo por completo: “Temos que ter cuidado com o que chamamos de demanda reprimida, que é ao longo do ano todo ‘evitar’ gastos e em algum momento não segurar mais essa impulsão por ‘gastar/consumir’”.
ANTES DE COMPRAR, PESQUISE
A economista lembra regras que são sempre válidas em todas as épocas do ano: “Deve-se pesquisar melhores preços, lojas, avaliar a necessidade ou não de presentear a todos, escolher as melhores taxas de entrega. Cada centavo deve ser levado em conta, porque cada economia será revertida para uma outra compra ou conta no futuro próximo ou distante”
CALCULE BEM ANTES DE PARCELAR
O parcelamento das compras no cartão de crédito deve ser feito de modo consciente pelo consumidor, sempre buscando responder às seguintes perguntas: “Você ganhará aquele montante para pagar as parcelas?”; “Aquela loja é a mais barata?”; “O produto escolhido, no caso para você, é o necessário para o momento ou existe algo com mais prioridade?”. Cristiane reforça: “Pesquisar é a minha maior recomendação. Pesquisar preço, frete e loja”.
VALE A PENA ESPERAR PELOS ‘SALDÕES DE LIMPA ESTOQUE’?
Questionada a esse respeito, especialmente para as compras de bens de longa e média duração, como televisão, geladeira e sofá, Cristiane diz que “sempre dependerá do preço. Pode ser que se encontre algum desconto mesmo no período de festas. Dependerá sempre da loja. Geralmente, o período de desconto gira em torno de março e não logo em seguida às festas. Por isso, se realmente necessita ou deseja algum bem de linha branca ou marrom, que são esses mencionados, o ideal é pesquisar o preço: caso seja interessante, compre. Caso contrário, espere, controle a impulsão a consumir e compre em um momento em que a ansiedade diminuirá”.
NÃO SE ESQUEÇA DE QUE ELES VÃO CHEGAR E MAIS CAROS: O IPTU E O IPVA
Quando o novo ano começar, será a hora de pagar o IPTU e o IPVA, que podem ser liquidados à vista ou parcelados. A primeira dica de Cristiane Mancini é desde já olhar os boletos pagos neste ano “para se ter uma ideia do quanto aproximadamente se pagará no próximo ano. Com isso, desde agora, já se poderá separar os valores para o pagamento desses impostos, não utilizando para outros gastos. É importante o comprometimento”.
Na cidade de São Paulo, o reajuste do IPTU em 2022 será limitado à inflação em até 10%. Essa regra valerá também para 2023 e 2024. Nos últimos 12 meses, a inflação foi de 10,67%, portanto, por ora, o reajuste no valor do IPTU será de 10%. Neste ano, não houve reajuste do IPTU em relação aos valores de 2020.
Quanto ao IPVA, o valor em 2022 será, em média, de 25% a 30% mais alto do que em 2021 no estado de São Paulo. Isso se explica pelo fato de este imposto estar atrelado ao valor venal de veículos usados ou à nota fiscal de compra de veículos novos. Como houve a valorização de ambos, o IPVA ficará mais caro. A boa notícia é que poderá ser parcelado em até cinco vezes. Até este ano, o limite era de três parcelas.
SE PUDER, INVISTA OU RESERVE PARTE DO RECURSO
Uma vez que as dívidas sejam saldadas, se comprou o necessário para desfrutar as festas e se reservou recursos para os gastos do começo do ano, é hora de se pensar em poupar parte do dinheiro. “Nesse momento, a poupança é uma opção, já que é atrelada à taxa Selic, assim o rendimento está interessante. E também o CDB atrelado à Selic é uma outra ótima opção. E para aqueles que possuem mais apetite para risco, investir em ações é sempre algo a considerar.”
A Selic é a taxa básica de juros da economia brasileira. Assim, seu valor impacta nos juros que são adotados em empréstimos, financiamentos e mesmo na rentabilidade de investimentos. Na prática, é uma espécie de dispositivo para regular a oferta de crédito, a fim de conter a inflação. No começo deste mês, o Comitê de Política Monetária do Banco Central elevou a taxa Selic para 9,25%. Conforme uma regra estabelecida no ano de 2012, quando a Selic está acima de 8,5%, há maior rendimento no valor do que está depositado na poupança. Também é comum que se aumentem os rendimentos na renda fixa, como é o caso do Certificado de Depósito Bancário (CDB), uma aplicação oferecida pelos bancos e que rende juros superiores aos da poupança.
A QUEM RECEBE O AUXÍLIO BRASIL: GASTOS CONSCIENTES E MEDIDOS
Neste mês, o valor mínimo do Auxílio Brasil será de R$ 400, pago a 14,52 milhões de famílias. Destas, cerca de 13 milhões recebiam até o mês passado valores inferiores a este montante, conforme dados do Ministério da Cidadania. Diante dessa maior disponibilidade de verbas no lar, Cristiane Mancini alerta: “Cuidado com a demanda reprimida, com a ilusão de acreditar que a possibilidade de compra aumentou. Dessa forma, recomendo priorizar medicamentos e alimentação e, em seguida, dívidas. Mesmo com o aumento, ainda é pouco, por isso o gasto deve ser extremamente consciente e medido”.