Em primeiro lugar, cumpre esclarecer que, em nossa legislação penal, o aborto é e continua sendo crime, mesmo se praticado por médico para salvar a vida da gestante e em caso de estupro, a pedido da gestante ou de seu responsável legal. O que a legislação apenas pode fazer é, neste caso, não punir penalmente, por razões de política criminal.
Toda a legislação referente ao crime do aborto, no Brasil, está tipificada no Código Penal, nos artigos 124 a 128: a vida humana intrauterina desde a concepção é considerada bem jurídico fundamental. E a Constituição federal ao definir a dignidade da Pessoa Humana (art. 1º) e o Direito à Vida (art. 5º), destaca a inviolabilidade do direito à vida.
Conforme acertadamente defendido pela parlamentar Chris Tonietto, ao assegurar a inviolabilidade do direito à vida, a Constituição está dizendo que ninguém pode ser morto arbitrariamente. Para se dizer que tal garantia constitucional não se aplica ao nascituro concebido em um estupro seria preciso provar: ou que o nascituro não é titular de direitos, e sem direito à vida; ou que ele perdeu o direito à vida por ter cometido um ato culpável. Nenhuma dessas hipóteses se verifica. O Código Civil diz explicitamente que a lei põe a salvo desde a concepção os direitos do nascituro (art. 2º). Logo, o nascituro é titular de direitos (a começar pelo direito à vida). Além disso, o nascituro logicamente não é capaz de praticar atos culpáveis que lhe tire o direito à vida. Das três pessoas envolvidas no crime do estupro – o estuprador, a mulher estuprada e o bebê concebido –, podemos ter a certeza da absoluta inocência do bebê. A provocação de sua morte é uma injustiça absurda, cuja arbitrariedade fere frontalmente os dispositivos constitucionais que protegem a vida. Ademais, no caso da vida intrauterina, o bebê não pode ser condenado à morte, sem culpa e sem julgamento – e no caso de estupro, condenado por crime praticado por outro.
Não obstante, nas últimas décadas assistimos às tristes tentativas de instauração do aborto no Brasil. Observa-se ONGs que se utilizam do financiamento externo para desenvolver sua capacidade de produzir mudanças, entre as quais a criação de um conjunto de leis que permitisse às mulheres obter abortos e outros serviços necessários. Em 1998, presenciamos um grande retrocesso, quando o ministro da Saúde, apesar da grande oposição, aprovou as Normas Técnicas de Aborto Legal em casos de estupro ou risco de vida para a mãe. Desde então, os serviços de aborto em casos de estupro e risco de vida da mulher expandiram-se rapidamente. Nos bastidores do insidioso ativismo judicial, considera-se que agora somente existe uma única reforma principal que deve ser tentada: a completa legalização do aborto. Com isso, estão em curso equivocadas ações judiciais para alargar as hipóteses de aborto no Brasil.
Os perigos jurídico-políticos da introdução do aborto no Brasil são tremendos. Ficaremos vulneráveis à pauta dos organismos internacionais que exercem ingerência sobre a soberania nacional (fundações internacionais, clínicas de aborto etc.). O risco é grande, pois, quem define quando a vida começa ou quando um ser humano pode ou não ser considerado pessoa pode decidir sobre qualquer coisa.
E que possibilidades de ação tmos em nossas mãos? Em primeiro lugar, a tomada de consciência das circunstâncias reais nas quais o Brasil está envolvido. Em seguida, a busca de organização da sociedade civil para que haja efetiva representatividade e para que não se instaure o total relativismo. E que novas medidas legislativas abram possibilidades para uma proteção mútua da mãe e do bebê em situações de risco: projetos de Lei, apoio a associações e entidades da sociedade civil sem fins lucrativos que protegem a gestante e o nascituro etc.
Apoiar a vítima do estupro consiste em prover-lhe atendimento médico e psicológico, viabilizar a adoção do bebê, se assim ela o desejar, e não lhe causar outra dor, pois é inegável que depois de realizar um aborto, a mulher passa a ter diversos problemas, sejam de ordem física, emocional e psicológica.
“Jamais se pode aprovar o aborto, mas é preciso algo mais: procurar sobretudo combater as suas causas. Isso comporta uma ação política em particular no campo da lei. Mas é preciso, ao mesmo tempo, agir no plano dos costumes, concorrer para tudo aquilo que pode ajudar as famílias, as mães, as crianças. Assim, a Igreja, nestes últimos tempos, tem insistido na ideia de paternidade responsável, exercício de uma verdadeira prudência, humana e cristã. Deus, que é o autor da vida, confiou aos homens o encargo de preservá-la, com isso, ‘o aborto e o infanticídio são crimes abomináveis’ (GS 51)”. (Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, Declaração sobre o Aborto Provocado)
Obrigado pela clareza no argumento. Crime sim, e crime hediondo.
Obrigado pela clareza no argumento. Crime sim, e crime hediondo.
Excelente e muito oportuno o artigo. A banalização do dom da vida traz a reboque toda a sorte de ‘levantes’, disfarçados de discursos modernos que, na realidade, exterminam vulneráveis e indefesos. Esses esclarecimentos devem que ser disseminados para que a humanidade ‘acorde’ para o verdadeiro sentido da vida.
Muito bem explicado. Sim, é crime.
Apreciamos, imensamente, a sua excelente matéria publicada no jornal “O São Paulo”, na sua edição do dia 22 de setembro de 2023, intitulada: “Afinal, porque o aborto é crime”.
Um fortíssimo abraço.
Luiz Gonzaga Bertelli
Presidente da Academia Paulista de História (APH)
Diretor Presidente da União dos Juristas Católicos de São Paulo – UJUCASP