‘Amai os vossos inimigos’

7º DOMINGO DO TEMPO COMUM 20 DE FEVEREIRO DE 2022

Saul moveu exércitos para capturar e destruir Davi, que teve de viver como fugitivo, sem paz nem descanso. Em mais de uma ocasião, auxiliado por Deus, Davi pôde matar sem dificuldade aquele que lhe perseguia. Contudo, sempre poupou a vida de Saul. Isso se deveu à grandeza de alma do futuro rei e, também, ao fato de que via no outro não apenas um adversário, mas alguém escolhido e assinalado por Deus: “Quem poderia estender a mão contra o ungido do Senhor, e ficar impune?” (1Sm 26,9).

Este gesto generoso prefigurou a revelação que, séculos mais tarde, faria Nosso Senhor Jesus Cristo: “Amai os vossos inimigos e fazei o bem aos que vos odeiam, bendizei os que vos amaldiçoam, e rezai por aqueles que vos caluniam” (Lc 6,27s). Essa recomendação possui uma finalidade prática pois, se agíssemos com vingança, o mal se multiplicaria ilimitadamente no mundo e a vida em sociedade se tornaria impossível. Alguém precisa romper esse ciclo! Por isso, diz São Pedro: “Não pagueis o mal com o mal, nem ofensa com ofensa. Ao contrário, abençoai” (1Pd 3,9).

Além disso, orar, perdoar e querer o bem de quem não nos quer bem é essencial no processo de maturidade humana e de identificação com Jesus Cristo. Pois, “se amais somente aqueles que vos amam, que recompensa tereis? Até os pecadores amam aqueles que os amam” (Lc 6,32). Como Jesus, importa que sejamos “misericordiosos, como também o Pai é misericordioso” (Lc 6,36). O amor aos inimigos somente é possível mediante a oração – devemos implorá-lo a Deus – e se fundamenta sobre a fé viva operante por meio da caridade (cf. Gl 5,6).

Não se trata de sermos indiferentes ao mal sofrido, nem ingênuos ou medrosos diante dos homens. Tampouco se trata aqui de negar o direito à legítima defesa. Quando podemos evitar que as pessoas que Deus nos confiou sofram um mal grave, seja físico ou espiritual, a legítima defesa é inclusive um dever! Jesus nos pede, principalmente, que abandonemos o orgulho para buscar a salvação de quem nos odeia. Afinal, diz o Senhor: “Não quero a morte do pecador, mas que se converta e viva” (Ez 18,23).

A ofensa feita pelos outros a nós é muito pequena perto da ofensa a Deus que são cada um dos nossos pecados. Se o Senhor é paciente, perdoa-nos, compreende-nos e faz o possível para nos livrar do fogo eterno que mereceríamos por conta de nossas faltas, tanto mais devemos estar dispostos a perdoar e pedir a Deus por aqueles que são feitos do mesmo barro que nós.

Como Davi, aprendamos a ver o próximo – apesar de seus pecados e defeitos – como alguém profundamente amado por Deus, em cuja imagem todos fomos criados. Sobretudo se tratando de um cristão – um filho adotivo de Deus e irmão na fé –, devemos vê-lo como alguém que, no Batismo, foi ungido pelo Senhor. Ora, as faltas dos cristãos serão castigadas quando “o Senhor retribuir a cada um conforme a sua justiça e a sua fidelidade” (1Sm 26,23). Nós, porém, “não estenderemos a mão contra o ungido do Senhor” (1Sm 26,23).

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