As desigualdades de gênero e a luta por direitos femininos sob medida

Nesta semana do Dia Internacional da Mulher, na qual se comemoram tantas conquistas femininas, é importante sair do lugar-comum do discurso sobre a necessidade de igualdade de direitos entre homens e mulheres, para tratar da necessidade de se pensar direitos das mulheres sob medida, considerando-as em concreto, em sua diversidade de gênero e em sua diversidade dentro do próprio gênero. 

Na esfera dos comportamentos que conformam direitos femininos, prever constitucionalmente que mulheres e homens são iguais em direitos perante a lei não basta. É preciso considerar as mulheres em suas diferentes idades e etapas da vida, inseridas em seu específico contexto social. E, nesse sentido, pensar em direitos à educação, ao trabalho, ao planejamento familiar e à velhice digna, com a flexibilidade necessária de leis e políticas públicas que adequem o formalismo vazio da lei à realidade. A verdadeira conquista será obter a medida de justiça adequada a cada uma das mulheres. 

Nesse contexto, parece fundamental partir das contribuições da Doutrina Social da Igreja que põe em primeiro plano a centralidade da pessoa humana para uma defesa de direitos femininos adequados, com respeito absoluto da mulher, pessoa humana, do feto feminino à mulher idosa, na sua diversidade e, ao mesmo tempo, na adversidade de um país no qual as limitações econômico-sociais impõem padrões insuficientes para a concretização dos direitos sociais. 

Ao se tratar de direitos, portanto, com o viés do verdadeiro respeito à diversidade feminina, o mais adequado é permitir o acesso amplo a direitos à educação, ao trabalho, à propriedade, à participação na vida política, mas, ao mesmo tempo, respeitar a mulher na sociedade, seu modo de conduzir as relações na comunidade e na vida social, sua exclusividade natural de provedora da vida e portadora do feto, seu ambiente de trabalho adequado para lhe permitir ser esposa e mãe e para que não enfrente o preconceito só pelo fato de nascer mulher e de um dia poder engravidar, ter que se dedicar à criação dos filhos e ao cuidado dos idosos em seu lar.

A efetivação de direitos femininos, considerando sua desigualdade natural, biológica e social, deve levar a um desenho de leis e políticas públicas que levem em conta essa desigualdade e não queiram tratar a mulher como se um homem fosse ou como se todas as mulheres, em qualquer etapa da vida ou qualquer contexto social, fossem iguais. É fundamental tratar desiguais desigualmente. 

É preciso repensar comportamentos para que o Direito, que os reflete em seu formalismo, possa trazer valores, princípios e novas condutas à luz da Doutrina Social. No âmbito da luta por direitos, parece faltar um advocacy católico mais corajoso, por meio do comportamento concreto de cada católico e da Igreja-instituição, contra qualquer forma de descarte da mulher – do cuidado com o feto ao tratamento da mulher idosa. Um comportamento que corrobore a defesa da dignidade da mulher em qualquer idade e contra qualquer forma de violência verbal ou sexual. Ao mesmo tempo, reflita um posicionamento firme, nada ideológico, mas principio lógico-valorativo, que se oponha a discursos de alguns grupos minoritários que reduzem nossos direitos sexuais e reprodutivos femininos à liberdade para a promiscuidade e ao aborto. 

Por fim, um comportamento que se coloque contra a defesa do trabalho até morrer, por meio de trabalho à exaustão, ou contra o descarte das mulheres idosas, reclusas para morrer no isolamento de asilos e institutos. E isso passa pela defesa e valorização da família, da comunidade e de um Estado que se inspire na Doutrina Social da Igreja e leve a direitos de cuidado das mulheres idosas em suas casas, com atendimento domiciliar, aposentadoria mínima digna, assistência financeira, familiar e à sua saúde, em um momento da vida em que impera a fragilidade do corpo e no qual a expectativa de vida feminina é substancialmente maior do que a masculina. 

Esta semana de comemoração de conquistas femininas, portanto, deve passar com essas reflexões e lutas que coloquem a mulher no centro, na centralidade da pessoa humana posta pela Doutrina Social, e que tenham a coragem de tratar mulheres desiguais – em relação aos homens e dentro de seu próprio gênero – desigualmente, consolidando seus direitos, sem tratar as mulheres como se homens fossem. 

Crisleine Yamaji é advogada, doutora em Direito Civil e professora de Direito Privado. E-mail: direitosedeveresosaopaulo@gmail.com

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