Contra o discurso de ódio, o verdadeiro amor

O “discurso de ódio” é um dos grandes temas do debate público atual – lemos nas manchetes que jogadores de futebol são chamados de “macacos” pela cor de sua pele, que youtubers são taxados de neonazistas por seus comentários sobre a liberdade de expressão, e que “comediantes” produzem esquetes satíricos de vilipêndio aberto à religião e seus símbolos, em nome dessa mesma liberdade de expressão… Como cristãos, de que maneira podemos nos posicionar perante a questão?

Por um lado, está fora de dúvida que existem sim discursos e mensagens que, ao diminuir o valor de outros seres humanos, e incentivar sua hostilização, não devem ser tolerados: não existe uma liberdade absoluta de dizer o que quer que seja. Basta lembrar que o nazismo, antes de instalar-se no poder e construir os campos de concentração, começou com a intolerância antissemita do Mein Kampf.

O problema, por outro lado, é que alguns setores da sociedade consideram hoje que qualquer divergência de opinião com relação às decisões e preferências de alguém poderia configurar uma “agressão” à sua pessoa. Se eu decido levar minha vida desse ou daquele jeito, ninguém mais teria o direito de me “julgar” – e a única atitude aceitável seria o apoio incondicional aos meus gostos e caprichos. Por essa lógica, por exemplo, um amigo não poderia persuadir o outro a evitar as más companhias e as drogas – pois afinal, cada louco com sua mania.

Pode parecer um exemplo extremo – mas ele nos mostra com clareza que a redução de todas as verdades ao nível de preferências subjetivas (“o que é verdade para você não é verdade para mim”), com a absolutização da “tolerância” acima da verdade, acaba por gerar justamente o sofrimento que se pretendia evitar. E a razão para isso é muito simples: se não existe mais nenhuma verdade universal e objetiva sobre o que constitui uma vida humana feliz e realizada, e se a vontade de cada indivíduo é soberana para determinar seu próprio bem e mal, então desaparece a possibilidade de um diálogo sincero e autêntico, a partir de uma realidade comum. Toda divergência não passa, então, de um conflito de liberdades opostas – e toda vez que alguém defende um modelo de vida diferente do meu, isso só pode ser interpretado como uma tentativa de me manipular: um jogo de poder.

Nós cristãos não somos partidários nem do discurso de ódio nem do ódio ao discurso: queremos o amor, tanto quanto a verdade. Isso porque o verdadeiro amor não é um mero sentimento gostoso: amar é querer o bem do outro, incondicionalmente – mesmo que isso nos custe perder seu afeto. Como dizia Padre Zósima, o ancião dos Irmãos Karamazov, “o amor na vida real é uma coisa dura e assustadora, quando comparado ao amor nos sonhos”.

Nosso dulcíssimo Senhor, que era a mansidão em pessoa, não hesitava em advertir seus irmãos transviados, sempre que necessário – inclusive com palavras exigentes. Aprendamos, então, deste Jesus, “manso e humilde de coração”, a querer o bem de nossos irmãos, dando-lhes amorosas verdades, e verdadeiro amor.

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