Cultivadores das sementes de esperança

As iniciativas do Ano Jubilar de 2025 começam a aparecer, sobretudo nas peregrinações que já vão acontecendo e nos programas e atividades do ano pastoral. Este ano é acompanhado pela temática da esperança, ocasião propícia para re­acender em nós a chama dessa virtude, recordar os motivos de nossa esperança e também para desfazer algum equívoco a respeito da esperança cristã.

Comecemos por desfazer um equí­voco. Há quem veja na esperança uma atitude passiva, de braços cruzados, “es­perando” que as coisas aconteçam. No entanto, não é assim a esperança cristã, que é uma virtude teologal, junto com a fé e a caridade. Essas três virtudes nos são dadas por graça no Batismo, como dons de Deus e capacidades próprias para expressar e desenvolver a vida cris­tã. As virtudes teologais qualificam a vida cristã e se implicam estreitamente (cf. 1Cor 13,13). A fé é a capacidade de ade­rir a Deus; ela possibilita a esperança e o amor, “como Jesus amou”. A esperança alimenta-se na fé e leva a amar. A carida­de e a esperança expressam a fé nas obras. A esperança cristã tem seu fundamen­to nas promessas de Deus, que é veraz e digno de fé e confiança. Não fosse digno de fé e confiança, não seria Deus, mas um mito criado pelo homem. Confia­mos em Deus e esperamos com firmeza no cumprimento de sua palavra e de suas promessas. “Passarão o céu e a terra, mas as minhas palavras não passarão” (Mc 13,31). Deus é fiel e Nele não há engano. A esperança cristã se traduz na aceitação das promessas claras e explícitas da Pala­vra de Deus, como a remissão dos pecados e a vida eterna; mas também é a atitude confiante diante das promessas menos ex­plícitas, como o fruto do bem praticado, a ação do Espírito Santo na história humana e o triunfo final do reino de Deus. A es­perança cristã decorre da certeza de que o Evangelho é Palavra de Deus, palavra de luz, verdade e vida e que, praticá-lo e viver em conformidade com ele, vale mais do que viver de forma contrária a ele.

Não é, por serem movidos por essa es­perança, que os pais educam os filhos no bem, em vez de os deixar sem orientação na vida? Fazem-no com a esperança de que os filhos serão pessoas boas, respei­tosas dos outros, pessoas de fé e de boas qualidades humanas. Não é por isso que se trabalha cada dia, mesmo entre muitas contradições, para promover uma convi­vência digna, respeitosa e justa entre os membros da comunidade humana? Não fosse assim, para que fazer leis e promover a sua observância? Certamente, é porque se espera colher o fruto bom da justiça, so­lidariedade, paz e do bem comum.

É por ser movida por uma esperança que vai além das capacidades humanas que a Igreja prega o Evangelho sem esmo­recer, apesar de não colher sempre frutos imediatos. A vida e a ação da Igreja são movidas essencialmente pela fé e pela es­perança em Deus. É por esperar na Palavra de Deus e no fruto de suas promessas que a Igreja anuncia o Evangelho, promove a formação cristã, batiza, celebra os demais Sacramentos, promove a caridade em to­das as suas dimensões, dedica-se aos po­bres e aos doentes, está do lado das “causas perdidas”, aceita sofrer perseguição, ser in­compreendida e caluniada, perder os seus bens e até ser martirizada. Não é porque es­pera com firme confiança que “é fiel aquele que chamou e prometeu”? (cf. Hb 10,23).

É também movidos pela esperança cris­tã que organizamos a vida pastoral para, de maneira melhor e humanamente respon­sável, desempenhar bem a missão que foi confiada à Igreja em cada tempo, lugar e circunstância? Organizamos, planejamos, traçamos metas, definimos métodos e pro­gramamos ações para fazer bem a nossa parte na evangelização, bem sabendo que, “se o Senhor não construir a casa, em vão trabalharão os construtores; se o Senhor não vigiar a cidade, em vão vigiarão as sentinelas” (cf. Sl 127,1). A esperança cris­tã nos leva a ser ativos e organizados, mas sem a pretensão de sermos nós que vamos “produzir e fazer acontecer” o reino de Deus. Fazemos a nossa parte, como “coo­peradores da verdade de Deus” (cf . 3 Jo 8).

Na oração do Jubileu de 2025, há uma expressão bonita, em que pedimos a ajuda de Deus para sermos “cultivadores dili­gentes, para que as sementes do Evangelho fermentem a humanidade e o cosmos, na espera confiante dos novos céus e da nova terra quando, vencidas as potências do Mal, se manifestar para sempre a Tua gló­ria”. Somos cultivadores das sementes do Evangelho do reino de Deus, que já estão presentes no mundo. Todo o bem procede de Deus e leva a Deus. A nós, cabe espa­lhar essas sementes, cultivar em toda parte as plantinhas nascidas dessa boa semente, dentro e fora da Igreja, na espera confian­te do fruto. O Espírito de Deus semeia de muitos modos a boa semente e a faz ger­minar e frutificar.

A esperança cristã olha para o mundo e a humanidade como o campo de Deus, já semeado e ainda por semear, onde te­mos muito para fazer, sem tempo para las­timar e desanimar. “A messe é grande, mas os operários são poucos. Pedi ao dono do campo que envie cultivadores para o seu campo!” (cf. Lc 10,2). Movidos pela es­perança, “que não decepciona” (Rm 5,5), iniciemos bem este ano pastoral em nossa Arquidiocese, como semeadores e cultiva­dores de esperança, peregrinos movidos pela esperança.

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