Família para todos? Como anda o processo de adoção no Brasil?

Sergio Ricciuto Conte

Se antigamente a finalidade da adoção era conferir filhos àqueles que estavam impossibilitados de tê-los por natureza, hoje, o interesse maior a ser resguardado é o da criança e do adolescente. A função da adoção, atualmente, não é a de dar uma criança a uma família, mas uma família a uma criança, assegurando-lhe saúde, educação, afeto, enfim, uma vida digna. 

A adoção se concretiza pela escolha consciente e clara, mediante uma decisão legal, a partir da qual uma criança ou adolescente não gerado biologicamente pelo adotante se torna irrevogavelmente filho (Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, Art. 48). 

A adoção atribui a condição de filho ao adotado, com os mesmos direitos e deveres, inclusive sucessórios, desligando-o de qualquer vínculo com pais e parentes, salvo os impedimentos matrimoniais (ECA, Art. 41). 

Entretanto, o Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento mostra uma realidade que precisa ser mudada. De um lado, mais de 35 mil pais pretendentes a adotar. Do outro, cerca de 5 mil filhos possíveis em busca de uma família, segundo o Diagnóstico sobre o Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento.

A conta não fecha. Por que será que ouvimos falar que a espera na fila de adoção é tão grande? Por que os abrigos seguem cheios quando há tantas pessoas dispostas a adotar? 

É verdade que todo o processo de adoção deve ser extremamente cuidadoso, com segurança jurídica e que requer tempo para ser concluído. Porém, o principal problema é que, ao se inscrever no Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento, a maioria das pessoas que deseja adotar indica um perfil muito restrito, deixando de fora as crianças reais que estão nos abrigos – maiores de 5 anos, pardas ou negras, com deficiência, doença crônica ou grupos de irmãos. Estas, na verdade, são as crianças que mais precisam de uma família carinhosa e cuidadosa. 

No entanto, elas estão crescendo em instituições quando há tanto amor na fila, esperando por um filho idealizado (cf. Observatório Nacional da Família, Cartilha de Adoção). 

É importante que a pessoa que deseja adotar conheça a realidade das crianças e adolescentes registrados no Sistema Nacional de Adoção, gerido pelo Conselho Nacional de Justiça: cerca de 73% são maiores de 5 anos, 65% são negras ou pardas, 58% possuem irmãos, 25% têm alguma doença ou deficiência.

Já entre os adotantes cadastrados, 77% só aceitam crianças até 5 anos, 17% querem apenas crianças brancas, 63% não optam por adotar aquelas que têm doenças ou deficiências e 64% não estão abertos a receber irmãos.

Embora muitas pessoas que desejem adotar fiquem inseguras com a hipótese de que o seu futuro filho pode vir a ser uma criança com alguma deficiência ou doença crônica, podemos dizer, com base em muitos testemunhos, que, com o tempo, ela será motivo de grande alegria para sua família. É preciso olhar a criança em sua integralidade, para além da condição atual de saúde ou deficiência.

Toda criança precisa de uma família – o lugar de excelência para promover o desenvolvimento integral de todo ser humano e de sua plena dignidade. 

Por fim, todos os esforços devem perseverar no objetivo de garantir que a adoção seja um encontro entre prioridades e desejos de quem é adotado e de quem adota. Neste contexto, adotar significa reconhecer também que as relações entre pais e filhos não se medem somente pelos parâmetros genéticos e legais. Pois, adotar, é ser adotado: não existe diferença entre filho adotivo e filho biológico, é tudo fruto do amor.

guest
2 Comentários
Inline Feedbacks
Veja todos os comentários
José de Ribamar martins
José de Ribamar martins
10 meses atrás

Eu quero adotar uma criança até 10 anos, e estou aberto até para um pouco mais velha.