O desafio da reintegração social do preso

Atualmente no mundo existem cerca de 10 milhões de prisioneiros. No Brasil, conforme dados do Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN), o número de pessoas que cumprem algum tipo de pena (ou medida de segurança) é cerca de 807 mil presos. Além disso, existem cerca de 4 mil cidadãos brasileiros presos no exterior (40% custodiados na Europa), e cerca de 2 mil estrangeiros presos no território brasileiro (80% deles de países latino-americanos). 

Constata-se que a maior parte dos indivíduos presos no sistema carcerário brasileiro continua sendo formado por jovens, negros e com baixo grau de escolaridade. Da mesma forma, os delitos contra o patrimônio, lei de drogas e crimes contra a pessoa são os de maior incidência. Quando é feita a análise do número de vagas nos estabelecimentos penais, percebe-se um déficit de quase 100 mil vagas. 

A legislação brasileira acredita na recuperação do condenado, primando pelo respeito à dignidade humana, fundamento do Estado Democrático de Direito. Por consequência, abomina tratamentos cruéis ou degradantes, como castigos físicos, e proíbe presídios insalubres. Dessa forma, há esperança de que a pena opere uma transformação no indivíduo para que possa levar uma vida útil e produtiva. O espírito da lei, portanto, é sempre no sentido de apostar na recuperação da pessoa, dar oportunidade ao preso de reintegração à sociedade. Como criar, porém, condições efetivas para que isso ocorra? 

A lei carrega em si um paradoxo: como esperar que indivíduos se adequem mais às regras sociais segregando-os completamente da sociedade e inserindo-os em um microcosmo prisional com suas próprias regras e cultura? Para este grande desafio não há respostas definitivas, mas serão destacados, a seguir, alguns pontos que precisam ser enfrentados para a construção de uma política de reintegração: 

1. Dificuldade de assegurar ao indivíduo, privado de liberdade, a condição de sujeito de direito; 

2. Ações, programas e projetos de caráter ressocializador

3. Falta de equidade no atendimento dos indivíduos privados de liberdade; 

4. Falta de critérios claros e procedimentos padronizados para os indivíduos integrarem aos programas de ressocialização; 

5. Ausência de uma política consistente de educação, trabalho, formação e capacitação profissional e geração de empregos no sistema penitenciário. A maior parte das ações é desenvolvida de forma precária, sem recursos materiais e em espaços improvisados. 

Neste sentido, cumpre ressaltar o importante trabalho da Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (APAC), uma entidade civil, que se dedica à recuperação e reintegração social dos condenados, bem como socorrer a vítima e proteger a sociedade. Opera, assim, como uma entidade auxiliar do Poder Judiciário e Executivo, respectivamente na execução penal e na administração do cumprimento das penas privativas de liberdade. Sua filosofia é “Matar o criminoso e Salvar o homem”, a partir de uma disciplina rígida, caracterizada por respeito, ordem, trabalho e o envolvimento da família do sentenciado.

A APAC é amparada pela Constituição Federal para atuar nos presídios, trabalhando com princípios fundamentais, tais como a valorização humana, com o objetivo de gerar a humanização das prisões, sem deixar de lado a finalidade punitiva da pena. Sua finalidade é evitar a reincidência no crime e proporcionar condições para que o condenado se recupere e consiga a reintegração social.

O método socializador da APAC espalhou-se por todo o território nacional (aproximadamente 70 unidades em todo o Brasil) e no exterior. Já foram implantadas APACs na Alemanha, Argentina, Bolívia, Bulgária, Chile, Cingapura, Costa Rica, El Salvador, Equador, Eslováquia, Estados Unidos, Inglaterra, Latvia, México, Nova Zelândia e Noruega. Este modelo foi reconhecido pelo Prison Fellowship International, organização não governamental que atua como órgão consultivo da ONU em assuntos penitenciários, como uma alternativa para humanizar a execução penal e o tratamento penitenciário.

O custo de cada preso para o Estado corresponde a quatro salários mínimos enquanto na APAC a um salário e meio. O índice nacional de pessoas que voltam a praticar crimes é, aproximadamente, de 80%, e na APAC corresponde a 9%. O método parte do pressuposto de que todo ser humano é recuperável, desde que haja um tratamento adequado. Para tanto, trabalha-se com diversos elementos fundamentais. Para o êxito no trabalho de recuperação do condenado, é imprescindível a adoção de todos eles, quais sejam: 1) Participação da comunidade; 2) Aprender um ofício, trabalho; 3) Religião; 4) Assistência jurídica; 5) Assistência à saúde; 6) Valorização humana; 7) A família; 8) Ovoluntário e sua formação; 9) Centro de Reintegração Social. 

Por fim, destaco a importância da manutenção dos vínculos familiares para a população privada de liberdade. Os estudos apontam que a família foi um tema sempre mencionado e que muito sensibilizava os entrevistados na prisão – a maioria se mostrava absolutamente apegada à família. Valorizavam-na, pois a família os apoiava e neles depositava crédito. Nas suas visões, isto era uma motivação que dava sentido às suas vidas e que colabora significativamente para a sua reabilitação. A família era uma ligação que mantinham com o mundo exterior. Prezavam a visita dos familiares como o momento mais importante de suas vidas – não deixando de comentar, em tom de revolta, as situações de humilhação pelas quais os familiares passavam no sistema carcerário. 

A este propósito, é importante a atividade que os capelães dos cárceres são chamados a desenvolver, não só sob o aspecto especificamente religioso, como também em defesa da dignidade das pessoas detidas. O ambiente das penitenciárias oferece um terreno privilegiado para testemunhar, uma vez mais, a solicitude cristã no campo social: “Estava na prisão e viestes ver-me” (Mt 25, 35-36).

Comentários

  1. Tema muito apropriado de ser abordado e tratado. Mas ações e programas educacionais devem ser priorizados e amplificados pelos governos para que, naturalmente, o indice de criminalidade seja reduzido e as prisões tenham vagas sobrando.

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  2. Tema muito amplo, pra ser abordado e, discutido! No Brasil, não se respeita as leias, nem a Constituição! As prisões são feitas, ao Bel prazer dos iluministros! Se for da esquerdalha, pode tudo! Soltam bandidos perigosos, com uma simples canetada, de um único ministro! Por puro prazer, em contribuir, a desconstruir as regras!
    Se for da direita, vai logo preso! Não tem acordo, nem apelação!
    Os presos de baixa renda, vão presos, mas logo em seguida, são soltos. Os estupradores, se tiverem prestígio, nem presos vão! E assim, a “lei” vai sendo aplicada, de acordo com quem é???
    ESSE É, O NOSSO ESTAGNADO, DILACERADO, E, ROUBADO BRASIL…

    Então, essa é a, do nosso dilacerado Brasil se destruído

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  3. Um retrato de um estado que não cumpre o seu papel é lamentável ver pseudos políticos que se intitulam em prol da causas de menos favorecidos, mas que não passam de falácias e hipocrisia, infelizmente os presídios no Brasil na sua grande maioria não reeducar, pelo contrário aparelha mais anida a violência, quando de fato o que deveriam fazer não o fazem… Que Deus tenha misericórdia do Brasil

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  4. A constatação feita pelo dr. Rodrigo é entristecedora, mas deve ser fonte de encorajamento para agirmos. Como apresentado, é um resultado promovido por nossa sociedade no estado em que ela se encontra. Não é só mais educação e oportunidades de sucesso profissional, mas sim uma volta ao relacionamento com Deus. A grande mazela humana é a distância de Deus e essa geração encarcerada precisa de ajuda para sair desta condição, estando ela atrás das grades, ou atrás das telas.

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