A família e os jovens egressos de acolhimento institucional

Ao completarem 18 anos, os jovens acolhidos nas instituições de acolhimento (conhecidas como abrigos) precisam ser desligados – e se não existir a possibilidade de reintegração à família e um acompanhamento após o desligamento institucional, o jovem pode acabar contando com a ajuda da instituição para moradia ou saindo para viver uma vida independente.

Alguns jovens encaminham-se de alguma forma em trabalhos de subsistência ou ficam à mercê da dependência de projetos sociais do Estado ou, ainda, terminam se envolvendo na criminalidade e dependência química. Não é por acaso o alto índice de jovens que, mesmo após o recebimento da medida de proteção e da qualificação profissional, acabam em meio às diversas situações de vulnerabilidade social e de violência.

Quando imaginamos um lar, projetamos um ideal de proteção, afeto, segurança, entre outros. Todavia, percebemos que muitas famílias estão longe de cumprir esse papel e, uma das principais causas desse fenômeno é o fato de que elas não possuem um amparo suficiente para que possam, pelo menos, guiar a vida de seus membros com dignidade. Essa condição socioeconômica precária colabora para que os vínculos familiares sejam cada dia mais fragilizados e acaba ocasionando o afastamento dos filhos do lar.

Ainda que, no país, o acolhimento institucional se constitua como medida excepcional e temporária (no máximo 18 meses), em 2021 observou-se uma realidade diferente: o tempo de acolhimento variou de 16 meses (no Norte do país) a 11 anos (no Sudeste) – e, lamentavelmente, somente cerca de 50% dos jovens nos acolhimentos mantinham vínculos com familiares.

A pobreza ocupa o primeiro lugar (com 37%) no ranking dos motivos de ingresso de crianças e adolescentes nos serviços de acolhimento institucional. Na sequência, aparecem “pais/ responsáveis dependentes químicos” (20%) e “abandono” (19%). Tal realidade reflete igualmente a presença de uma “cultura dos abrigos”, que faz parte de um modelo ultrapassado das políticas de assistência à infância.

Por outro lado, como boa notícia, foi justamente visando a romper com essa “cultura da institucionalização” que, nos últimos anos, o governo buscou alavancar o Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária. O Plano considera a família (biológica ou adotiva) como o lugar para onde idealmente retornam as crianças e os adolescentes desligados dos serviços de acolhimento.

Por fim, estudiosos destacam que existem ações que podem ser realizadas pelas instituições de acolhimento (e pela sociedade civil) enquanto as crianças e adolescentes ali permanecerem. Por exemplo, manter vivo o vínculo da criança acolhida com seu núcleo familiar de origem por meio da realização de ações que aproximem as famílias das crianças e vice-versa; apoio à restruturação familiar; incentivo à convivência com outras famílias; participação de crianças e adolescentes acolhidos na vida da comunidade local; cumprimento do princípio do não desmembramento de irmãos acolhidos; acompanhamento social das famílias e encaminhamento para programas (oficiais ou comunitários) de proteção à família; divulgação de programas de apadrinhamento afetivo.

Tais iniciativas podem ser um caminho eficaz e transformador que os impulsionará a melhores possibilidades no futuro, provavelmente contribuindo para a formação com responsabilidade de novas famílias.

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Pedro Guimarães
Pedro Guimarães
8 meses atrás

Sem dúvida, esses jovens acolhidos em abrigos são invisíveis até o momento que são adotados pelos tráfico de drogas.

Adriana de Almeida Modesto
Adriana de Almeida Modesto
8 meses atrás

Excelente iniciativa essa do apadrinhamento afetivo. Ao meu ver deveria ser incentivada!
Excelente Texto! Parabéns Dr. Rodrigo Gastalho.

Maria Cristina B. Gesualdo
Maria Cristina B. Gesualdo
8 meses atrás

Uma realidade triste e tão sofrida da infância no Brasil a solicitar nossa atenção, orações e cuidado, na medida que requer investimento de afeto e tempo, para evitar as consequências tão nefastas desse abandono e omissão pela sociedade brasileira.

Mônica Maroja
Mônica Maroja
8 meses atrás

Excelente reflexão sobre essa realidade que precisa de ações efetivas e com programação de continuidade, para trazer esperança, educação de qualidade e oportunidade às crianças e adolescentes vulneráveis de crescerem saudáveis e serem futuros protagonistas, vivendo em uma sociedade com justiça, ordem, progresso e prosperidade.

Rita Cardoso
Rita Cardoso
8 meses atrás

Parabéns! Excelente texto.
Ao meu ver é impossível construir e estabelecer uma sociedade justa e acolhedora sem olharmos para nossos jovens e crianças. É fundamental uma base sólida, pautada em dignidade, direito, proteção e oportunidades. Para tanto, precisamos olhar para além de nós mesmos.