A Teologia do corpo e o mistério da nossa condição corporal*

A proposta teológica de São João Paulo II, com a teologia do corpo, é acolher o mistério da nossa condição corporal. Com Cristo, a corporeidade humana é alvo de uma nova criação, pois a redenção foi realizada em todo o homem – alma e corpo. Na unidade do corpo e da alma, o homem, pela sua própria condição corporal, atinge, por meio dele, o seu ponto mais alto e louva livremente o Criador. Não é, portanto, lícito ao homem desprezar a vida corporal, mas, pelo contrário, é obrigado a considerar o seu corpo como bom e honroso, uma vez que foi criado por Deus e será ressuscitado no último dia.

A existência humana não poderia ser compreendida sem o imenso dom da liberdade. O drama do pecado original, aliado à origem do homem como criação de Deus, conduz-nos a uma ampla exposição do pensamento de São João Paulo II. O mistério de Cristo ilumina toda esta verdade sobre o corpo humano. Visto que o homem foi criado à imagem e semelhança de Deus, toda a sua pessoa revela algo sobre Deus. Assim, é necessária uma “visão integral do homem”, contra as visões superficiais do homem que o transportam para o nosso mundo.

Na sua catequese, São João Paulo II começa por abordar uma questão primordial da humanidade, nomeadamente a sua criação. Esta indicação do princípio é vista à luz do mistério de Cristo, o novo Adão. O método de São João Paulo II reside numa “leitura filosófica e teológica dos três primeiros capítulos do Gênesis, considerando o homem primeiro na sua condição de solidão original e depois na sua diferenciação sexual após a criação de Eva”.

São João Paulo II inicia a sua abordagem referindo-se ao texto evangélico segundo Mateus 19,3-9, no qual os fariseus confrontam Jesus com uma questão sobre a indissolubilidade do matrimônio. Jesus é claro quando fala do início, ao se referir ao livro do Gênesis. Nesta discussão com os fariseus, Jesus mostra o desígnio original da criação, em que a indissolubilidade da união de Adão e Eva era desejada por Deus. São João Paulo II chama os tempos primordiais anteriores ao homem histórico (o homem depois do Pecado Original) de “pré-história da humanidade”. É com o pecado que tudo começa.

A referência ao princípio feita por Jesus levanta, no entanto, uma questão: como compreender em profundidade a aliança entre Deus e os homens no plano original da criação? A passagem evangélica permite-nos ver que a finalidade da criação do homem e da mulher está na unidade de ambos, como forma de participação na obra criadora de Deus (“Abençoando-os, Deus lhes disse: enchei e governai a terra”) e serem sinais visíveis da predileção de Deus pela espécie humana, precisamente porque o homem e a mulher são a sua imagem e semelhança. “Não podemos separar a criação de Deus que Ele cria dos desígnios que tem para a Sua criatura desde a eternidade”.

São João Paulo II nos diz: […] A criação do homem consiste na criação da unidade de dois seres e denota sobretudo a identidade da natureza humana. A dualidade, por sua vez, manifesta o que, a partir de tal identidade, constitui a masculinidade e a feminilidade da humanidade criada. Esta dimensão ontológica de unidade e dualidade tem grande significado. A criação do homem e da mulher como seres um para o outro, na experiência da comunhão mútua, expressa a bondade do Criador e o seu propósito original para eles. A corporeidade do homem e da mulher é desde o início um apelo à comunhão. São João Paulo II viu precisamente neste ponto “o verdadeiro sinal da criação do homem à imagem de Deus”.

*Este texto dá continuidade à serie iniciada com o artigo A Teologia do Corpo de São João Paulo II: as origens

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Carlos Augusto Figueiredo
Carlos Augusto Figueiredo
1 mês atrás

Obrigado pela reflexão. São João Paulo II nos provoca a pensar na dimensão sobrenatural do corpo.